Luz

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Arma secreta do Rei, guerreira, curandeira, alquimista. Qualquer um dos substantivos que usavam para se referir a mim sempre deveria ser acompanhado de A Melhor, afinal de contas Hybern fez questão de que eu fosse treinada por ele e de perto, e no caso do fracasso minha pele e mente sofreriam as terríveis consequências.

Dada a ele como presente por uma de seus Generais, fui a única sobrevivente porque o Rei gostou de como meus olhos cinzas e o cabelo branco me faziam lembrar seu Castelo de Ossos e por isso me tornou sua emissária pessoal da Morte. Ainda criança já possuía tanto poder que fui isolada em uma pequena ilha onde apenas o Rei e seus serviçais poderiam estar, nunca estava sem fazer nada cada segundo do meu tempo Hybern fez com que estivesse ocupada, fosse lutando com soldados armados e com dobro do meu tamanho, estudando antigos livros com uma velha rabugenta que me chicoteava a cada erro, ou então praticando com meu poder que era matar.

Aos 15 anos era letal como um guerreiro centenário, fosse em uma batalha corpo a corpo ou com uso de poder, dominava a alquimia e havia conquistado o acesso a livros de história, livros que me contavam um mundo diferente do cinza no qual Hybern me mantinha presa. E eu sonhava com esses mundos, com suas cores, cheiros e diferenças. E sem os tutores que um a um eu assustei com as demonstrações absurdas do meu poder, vez ou outra ameaçava quebrar seus dedos, ou o pescoço. Fui levada ao continente, não sabia o que me aguardava então como tola inocente que era, achei que poderia ter ganho um pouco mais de liberdade. Até porque o Rei deixará claro que era SUA, sua propriedade para fazer o que quisesse de mim e sua vontade foi explicita naquele dia. Não fui levada ao castelo por seus soldados, fui para as masmorras e antes que pudesse lutar fui atada a parede pelos pulsos, nem mesmo meus poderes responderam, enclausurados pelas correntes. Hybern desceu os degraus com lentidão uma mesa foi arrastada para uma luz a frente, diversas armas expostas, facas, lanças, chicote.
O chicote, seria ele o meu castigo, Hybern sempre o usava em mim, não me encolhi, ergui o queixo quando ele se aproximou sabia o que viria a seguir e não imploraria, nunca mais imploraria. Sua voz era calma quando fez o anúncio de que me tornaria sua escrava até o fim dos meus imortais dias.
– Então, agora que já tem atenção que gostaria. Lhe farei entender por que ninguém ousa se levantar contra mim.
Olhei para seu rosto escondendo qualquer temor, ou raiva que sentia naquele momento.
– A partir de hoje até que haja um homem Hyberiano de pé, você será minha e se tentar, se ousar, se ao menos sonhar em fugir, meus homens a caçarão e não importa sob qual circunstâncias você será entregue a mim para uma punição ainda maior do que anterior.
Sua ameaça ecoou em meu corpo quando ele segurou meu queixo e uma queimadura começou a circular meu pescoço, mordi o lábio contendo a dor, não daria a ele a satisfação de saber que estava sofrendo.
– Agora tem uma cicatriz da qual não poderá se livrar.
Hybern não escondeu a satisfação ao virar meu rosto e ver meu pescoço marcado, sem meus poderes eu só conseguia imaginar o ferimento. O Rei gostava demais de ouvir a própria voz, enquanto falava com os soldados sobre lealdade, ele pegou o chicote da mesa.

Fui virada para parede ao menos encararia a pedra desacelerei meu coração mandei minha mente para outro lugar, para aquele mundo que lia, para onde fugiria. Quando a primeira chicotada rasgou minha túnica e me fez torcer os punhos nas correntes, não gritei era isso que encorajava ele, sofrimento, então não demonstrei, a segunda chicotada acertou meu ombro e parte do meu colo, a terceira desceu, tomando costas e nuca, a quarta tirou sangue da fina pele dos meus seios, me contorci, mas aguentei. Parei de contar depois da décima, só me forcei a ir para longe, onde meu jardim estava florido e eu bebia chá numa linda tarde de primavera.
Ainda sentia o cheiro das flores quando acordei esfarrapada e dolorida em uma cela escura e fedorenta, parte dos cortes feitos pelas chicotadas estavam em processo de cicatrização e logo não passariam de mais uma lembrança do quão monstro o Rei poderia ser.

A Corte de Sombra e LuzWhere stories live. Discover now