#2. Precisamos falar sobre a Eleanor.

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Por Sofia Belle.

Por Sofia Belle

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Chata. Burra. Estúpida. Egoísta. Ridícula. Irritante.

Passando os olhos pelos comentários de Como Conquistar Esse Garoto esse foi alguns dos adjetivos que encontrei sobre a Eleanor dentro de 15 capítulos, fora alguns que acabei retirando do documento porque o word já tinha sublinhado em vermelho e interpretei como um sinal para não acrescentar.

Olhando assim, por alto, acho que de todas as protagonistas que já escrevi, nenhuma foi tão odiada quanto a Eleanor. A pobre menina Greene nunca fez nada de absurdamente errado para merecer tantos adjetivos cruéis, nada além de más escolhas que só afetariam sua própria vida, mas sempre fiquei me questionando sobre as motivações e a fonte desse ódio que me pareceu injustificado.

Ok, vamos lá.

Já aviso que isso não é uma desculpa para aliviar a barra de um personagem, é só uma reflexão, juro.

De cara, Eleanor nos mostra que é uma garota apaixonada por alguém que nunca, de fato, a percebeu. Ela nutre esse amor platônico por um carinha de personalidade meia-boca, sobre a qual ela não sabe muito a respeito, além do que fato universalmente conhecido: ele é lindo, atlético e está na boca de uma faculdade inteira. Toda essa curiosidade só faz com que essa vontade de ser escolhida por alguém que é, majoritariamente, desejado seja alimentada cada vez mais dentro dela.

Lembrando que Eleanor vive em um país muito distante do seu lugar de origem, onde as pessoas são, fenotipicamente, muito diferentes dela. Durante todo seu processo de amadurecimento, ela esteve sob o crivo de padrões nos quais ela jamais se encaixaria e talvez eu não tenha lugar de fala para identificar questões psicológicas aqui, mas sei que viver sob as comparações de padrões inalcançáveis só nos torna inseguros. Não deve ter sido fácil ser uma criança e uma adolescente tão diferente dos demais.

Cada vez que a Eleanor projeta essa aceitação que ela tanto deseja justamente no Taehyung, ela sente que talvez, só talvez, ser amada por alguém que é amado e adorado por todos a sua volta faça com que ela se sinta parte do grupo, que ela finalmente seja aceita. É meio bizarro olhar por esse lado, não é?

Então, por mais que ela goste do Taehyung, ela também busca gostar de si mesma. Ela quer essa validação externa que buscou a vida inteira: estou aqui e existo.

Como boa sagitariana com lua em escorpião, é impulsiva e intensa, mas o mercúrio em Capricórnio pode torná-la extremamente calculista, ou é do meu jeito ou não será de nenhum.

Quem leu CCEG pode confirmar que a ideia da Trine surge meio que em forma de brincadeira, é só uma tentativa de aliviar o coração da amiga depois de uma noite difícil, mas a Eleanor, cheia de vontade de fazer aquele romancezinho acontecer, investe tudo na ideia péssima, que é justamente conseguir as informações que ela tanto deseja sobre o Taehyung com alguém que um dia foi próximo dele, ou seja, Jeon Jungkook.

Jungkook parece ser só um carinha fechado, com pinta de vilão, poucos amigos e que só quer o básico: cumprir suas responsabilidades e viver sua vida longe de qualquer interação humana mais profunda. Ele é muito mais do que isso, a gente sabe (ou pelo menos eu espero). Mas o que existe de mais interessante sobre os dois, é que ambos, de alguma forma, se refletem. Eleanor quer amor e o Jungkook quer ser amado. Ele, que é feito de duas metades: coreano e maori e ela que cresceu sendo americana demais para ser coreana e coreana demais para ser americana (cafoooona!), são feitos na mesma base. De alguma forma, os dois estão ali, alinhados com as projeções um do outro e, é claro, é incômodo ver refletido em alguém aquilo tudo que odiamos sobre nós mesmos.

Mas a questão é que a Eleanor insiste nesse pseudo-amor que ela sente pelo Taehyung e o Jungkook se torna o namorado de mentirinha porque também está na busca de ser aceito socialmente, e os dois estão ali, com a mesma finalidade. Até o ponto de perceberem o quanto estão envolvidos, atraídos um pelo outro (aquele momento que todo clichê tem e que, sinceramente, eu adoro).

Até mesmo a primeira transa deles acontece de uma forma totalmente inesperada, porque os dois estão tão cheios de vontade um do outro que não conseguem mais controlar os impulsos quase magnéticos que os empurram um para o outro. A liberdade sexual da Eleanor também foi o tipo de assunto que quis explorar em CCEG, porque pela primeira vez, em meio a tantas autonegações, ela se permitiu fazer algo além do planejado, saiu completamente da rota premeditada da ideia de amor que ela tanto queria, fora da cabeça dela, do ideal que sempre pensou ser o certo. E isso foi extraordinário.

E claro, gerou um pouco de confusão, culpa, afinal, seus olhos estavam focados em quem ela pensou amar esse tempo todo e ela estava ali, sentindo, tocando, beijando, absorvendo e gostando de uma outra pessoa. Isso faz da Eleanor uma garota burra? Ou estúpida? Ou ela é só humana e está tentando descobrir a si mesma nesse processo? É confuso quando sua mente segue um fio e seu coração segue outro. Todo mundo já deve ter vivido uma experiência parecida e nem falo só sobre relacionamentos amorosos, mas sobre a vida como um todo.

Nem sempre é tão fácil assim.

E do nada o Jungkook chega com esse amor e atenção que ela nunca teve, e ele quer ficar ali, no entorno, caso ela precise, nunca longe demais para não deixá-la tão solta, mas não tão perto para não sufocá-la, porque consegue ver que as barreiras são difíceis de atravessar e todo mundo tem seu próprio tempo para baixar a guarda. Pera, alguém querendo amar sem pedir nada em troca? Sem querer mudá-la de alguma forma? Aceitando quem ela é e como ela é? Ok, onde estão as câmeras escondidas?!

Acho que nada faz tanto sentido nesse caso quanto aquela frase do Stephen Chbosky: "Nós aceitamos o amor que achamos merecer", Eleanor é a prova viva do amor que ela sempre buscou, cheio de idealizações e sempre distante demais, porque a vida inteira ele só se apresentou assim para ela: inalcançável.

Deve ser chocante vê-lo chegar tão manso, com tanto cuidado, parecendo bom demais para ser verdade.

O medo de se machucar sempre vai falar mais alto. Tudo que é bom e fácil parece perigoso ao ponto de fazer sangrar, melhor manter uma distância segura.

E ao passo que os dois estão ali, se refletindo, eles vão descobrindo como é aceitar a si mesmo enquanto aceitam um ao outro. E nunca é um processo simples.

Mas embora tantas pessoas odeiem a Eleanor, talvez por ela não ser feminista o suficiente ou não estar dentro de um padrão que protagonistas deveriam ter, passei a vê-la como um espelho. Acho que muitas vezes podemos ser bem cruéis com outras mulheres, fictícias ou não, que só estão em busca de algo e que só estão tentando se encontrar, aprender, tentar. Tipo eu, aqui, lendo comentários que às vezes doem muito. Claro, isso envolve uma série de reproduções infinitas de machismo velado e mais uma série de coisas que podemos discutir em uma outra edição do Crisálida, mas com a Eleanor eu vejo que talvez seja isso que incomode tanto, o espelho:

Ela está refletindo tudo aquilo que está ali e nós não gostamos de ver.

Ouvindo: Kiss Me More da Doja Cat feat. SZA

Lendo: Malibu Renasce da Taylor Jenkins Reid.

A CRISÁLIDA • JornalWhere stories live. Discover now