PARTE DOIS

102 11 0
                                    

Capítulo Dezessete

Havia um deles na biblioteca — perto da primeira prateleira de madeira, a mais limpa, a que tinha mais opções. Ele não saia de lá, era uma estátua que observava, era um espião ao avesso: Da qual, todos sabiam da existência e mesmo assim sabiam que ele faria seu trabalho direitinho.

Havia dois que rodavam à noite. Corujas do Corredor é como os chamo. Dois homens no corredor dos meninos, duas mulheres no corredor das garotas.

Havia quatro nos jardins.

Mais outros espalhados por aí. Outros que não falavam, não paravam de andar. Eram robôs prontos para lidarem com qualquer coisa, e apesar de desprovidos de emoções, pareciam estar sempre pensando. Olhando para os lados, para todos. Fui encarado por uns quando ia ao meu quarto ontem à noite, às oito, o horário que era flexível e que agora não é mais. Estou sendo observado agora enquanto caminho até o quarto. Águias é o que eles são.

Minha boca secou a medida que me aproximei da porta do meu quarto. O olhar do cara que está aqui — olhos pequenos mas não menos intensos, castanhos, cílios grandes e pretos — faz parecer que estou carregando coisas proibidas. Armas de fogo, drogas, celulares. Mas estou limpo. Só que não parece, por que estou tenso como uma tábua. O olhar deles fazia isso. além de um comichão na nuca que descia como uma serpente gelada pela coluna e o arrepio ficava até você ter certeza que está longe dos olhares das Águias. Quando entrei no meu quarto o alivio que senti não pode ser descrito. Nunca pensei que ficar entre quatro paredes fosse bom.

Suspiro. Arthur está aqui.

Desde que descobri que somos colegas de quarto eu não me dei tempo para pensar no assunto mais a fundo. Por causa daquela carta que ainda está guardada. Por causa da minha insegurança em relação a ele. Por causa do olhar dele para mim.

Arthur é um fofo, sinceramente, a fofura dele me deixa um pouco incomodado. Acho que não estou acostumado a ter alguém que sempre pergunte o que aconteceu sempre que entro no cômodo, ou algo do tipo. O que quero dizer é que... Arthur não é Vinci, são opostos, únicos, e eu não sabia como agir com essa informação. E não posso mentir, não sei mentir. O que torna minha situação mais complicada. Eu sempre espero o momento em que meu novo colega de quarto vá chegar em mim de supetão e perguntar sobre a carta, ou sobre minha relação com Vinci, eu sempre espero que as pessoas saibam meus segredos, por isso acabo me afastando delas o mais rápido possível. Se eu precisasse ser grosseiro para manter meus segredos a salvo, então seria.

— Oi, biblioteca de novo? — Ele sorriu de onde estava. À mesa.

Tínhamos a mesma mesa de vidro para duas pessoas. O lado de Arthur estava cheio com um caderno, canetas, um grampeador e anotações em post-it na parede. Ele não era totalmente organizado, mas tentava ser.

O meu lado está vazio.

— Pois é — respondo. —Você está estudando perto das férias de carnaval?

Arthur ri.

— Estou. Fiquei por um fio no ano passado. Não quero repetir esse ano a mesma coisa. Não se eu ainda quiser fazer parte da banda.

Banda?

— Banda? — Questionei.

— É.

— Então... A Katharine é uma escola brasileira com tudo da americana?

— Não exatamente... Mas parece que Linda é uma grande fã de High School Musical.

Ri.

Arthur deixou seus papéis de lado e se levantou depressa. Fui até minha cama e larguei o livro que peguei lá. Quando me virei de novo, Arthur já estava na minha frente. Bem perto de mim — muito perto de mim.

Entrelinhas (Romance Gay)Where stories live. Discover now