CAPÍTULO 2

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"O que eu tenho feito da vida?"

Ye Bai Yi olhou alguns rosto na multidão ávida que espeava por suas palavras com os cadernos abertos e as canetas prontas pra anotar. Não conseguiu encontrar nem mesmo um aluno cochilando no fundo da sala, ou ao menos parecendo devanear durante a aula.

Com a certeza de que essa turma não daria nenhum trabalho, começou a explicar o conteúdo da aula. Como um professor de literatura chinesa com quase quinze anos de experiência, Bai Yi tinha domínio total do que havia preparado, e tudo corria bem.

Até que começou a escutar um som agudo nos ouvidos, e viu os alunos se assustarem e correrem pra frente como um todo. De repente, perdeu a noção de equilíbrio e sentiu uma dor absurda nos joelhos e no rosto, depois de perceber que o chão agora estava muito perto. E então tudo se apagou.

Acordou três dias depois em um hospital, onde explicaram que ele foi mais uma vítima do estresse e da fadiga. O médico recomendou um período de descanso.

Ao ser questionado sobre a família, ele não soube o que responder. Todos haviam o afastado quando ele resolveu se casar com outro rapaz, quase dezoito anos atrás. E mesmo quando o marido morreu depois de apenas dez anos de casados, a família não o aceitou de volta.

O pouco contato que tinha com alguns primos era limitado aos que morreram e nasceram desde a última vez que se falaram. Já era viúvo há sete anos, e mesmo assim não sentia vontade de buscar multidões.

O médico insistiu no afastamento temporário de suas funções, e o próprio Bai Yi estava cansado da rotina certinha. Depois de pensar um pouco, ligou pro filho de seu amigo de infância e pediu pra fazer reserva de hospedagem, um carro e alimentação na pequena cidade turística que ele morava.

Seria uma boa idéia voltar pra cidade onde havia crescido, mas da qual já não se lembrava de quase nada? Não sabia, mas era o lugar mais calmo que podia se lembrar, então seguiu em frente com o plano.

O Vale das Quatro Estações continuava tão belo quanto se lembrava. A cidade arborizada era fresca no verão, e belíssima no inverno. O clima ameno permitia a floração das árvores durante todo o ano, resultando em um espetáculo em cada lugar que olhava. Desembarcar nesse lugar depois de mais de trinta anos provocou alguns sentimentos ambíguos. Tinha oito anos quando os negócios do pai prosperaram e eles se mudaram pra uma cidade industrial. Desde então, nunca havia voltado.

No aeroporto, encontrou o jovem policial e seu marido segurando um cartaz com o nome dele. Não que precisasse, eles haviam se visto há pouco mais de quatro anos, quando o médico perseguia descaradamente o jovem que havia se perdido com a bebida. Dois anos atrás se casaram, mas Ye Bai Yi não pode vir ao casamento.

Não tinha nada contra o Wen KeXin, mas o descaramento dele provocava uma certa inveja. E a implicância entre ambos era extremamente divertida, lembrando o que era ter um irmão. Então declaravam guerra sempre que se viam, e isso quase enlouquecia Zhou ZiShu, que já chegou ao extremo de se esconder em um parque durante a noite, apenas pra dormir no banco.

Quando perguntou sobre o hotel onde ficaria hospedado, a-Xu respondeu que iria ficar em casa com eles. Afinal, era amigo de seu pai e merecia respeito. Ficou constrangido no início, mas depois de alguma implicância com o Wen, acabou aceitando e pra implicar, disse que seria bom ter um médico a disposição o tempo todo. Zhou ZiShu sorriu ao lembrar que o marido e o amigo se comportavam como criança sempre que estavam juntos.

Chegando na casa, foi apresentado aos filhos, genro e neto do casal. Admitindo pra si mesmo uma certa inveja da bela família, foram preparar o jantar. Apesar de discutirem o tempo inteiro, no final a refeição estava deliciosa, e Ye Bai Yi parabenizou a boa culinária do Wen, mas fez isso de forma tortuosa, fingindo estar envenenado e fazendo toda a mesa rir da péssima imitação.

Depois de devorarem a comida, o "Monstro Velho" (apelido que o Wen carinhosamente lembrou enquanto faziam a comida) saiu pra dar uma volta e relaxar até ficar mais perto da hora de dormir. Quando pensou que já era o suficiente, resolveu voltar pra casa calmamente. Pra sua surpresa, acabou colidindo com um jovem estabanado que carregava uma caixa de guitarra.

Como não esperava o impacto, Ye Bai Yi acabou caindo sentado dolorosamente na calçada. O rapaz ficou assustado, e quando o ajudou a levantar, mostrou um rosto com feridas quase curadas, olho levemente arroxeado e labio cortado. Mesmo com o rosto em péssimo estado, roupas surradas e o estilo "rebelde vestido de preto", era uma pessoa bonita. As tranças nos cabelos e is piercings pareciam criar uma imagem harmoniosa com restante do conjunto.

Após confirmar que o outro estava bem, o jovem fez uma reverência rápida e saiu conferindo o relógio. Sem conseguir controlar a irritação (intensificada pela dor no traseiro) bufou e voltou pra casa murmurando.

Passou direto pro quarto designado como seu, deixando pra trás o resmungo ininteligível, algumas partes soando como: "Esses delinquentes (...) A pressa é pra ir pro inferno? (...) Depois fica velho..." Os comentários fizeram Wen KeXin rir, sussurrando no ouvido do marido que dessa vez o Monstro Velho tinha dispirocado de vez.

Dentro do quarto, Ye Bai Yi tirou as roupas, vestiu o pijama e deitou por cima da coberta. A irritação fazendo o sangue correr mais depresa. Enquanto lembrava do olhar no rosto machucado do "delinquente", sentiu um movimento dentro da calça.

Como não iria ver o rapaz nunca mais mesmo, não precisava sentir o peso na consciência por fantasiar coisas que não aconteceriam. Colocou a mão dentro da calça, imaginando o lábio ferido. Imaginou levando o jovem até uma das árvores do pátio. A cintura delgada e as pernas longas vestidas naquele jeans pretos Os cabelos escuros passando dos ombros, com tranças delicadas. A sombrancelha arqueada, a pele pálida parecendo macia. Sem conseguir controlar mais, gozou como um adolescente, sujando o pijama. Levantou ainda mais irritado, trocou o pijama e deitou de lado.

Com os pensamentos sombrios e se sentindo culpado pelo jovem inocente, acabou adormecendo. Sonhou com o som de liuqin, mas acordou no meio da noite e realmente tinha alguém tocando o instrumento. O som parecia vir da casa ao lado, e a música melancólica o fez relaxar e acabou dormindo novamente. Suas férias tinham tudo pra serem agradáveis. Quando amanhecesse, iria levar algum presente aos vizinhos, pra agradecer por embalar seus sonhos.

O "Monstro Velho" e o "Escorpião"Where stories live. Discover now