Bairro

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Vouge é a personificação da letra V. A primeira coisa que Jeongguk consegue decifrar é uma torre de pneus formando um triângulo com a flange e o anel de trava pintado grotescamente de vermelho. A base é composta por vários metais agrupados um nos outros com uma soldagem mal feita coberta por uma lona encerada de cor amarela, com fios retorcidos em algodão. É o painel de entrada da Vouge. Uma pirâmide. Uma das figuras mais fortes da ordem mundial. O símbolo representativo de Isósceles, a Capital. Chega a ser ironia. Jeongguk sente seu peito formigar.

Seu próprio irmão havia mencionado o ideal de Isósceles em ser uma pirâmide de segurança, exportação e centro econômico. A justificativa vem da própria base geométrica; como os triângulos em si são tipos de polígonos rígidos que não se deformam e possuem resistência devido aos seus vértices, que conectados, definem um único plano que fornece estabilidade nas três pontas, não importando o choque, tal união revela uma potência de equilíbrio e pressão, permanecendo firme e sólido. Isósceles se encare de frente como uma fortaleza de três gumes.

No momento em que Vouge utiliza este símbolo na sua entrada é estratégico e sarcástico. Um pouco cômico. Um tapete de boas vindas de uma briga de gigantes. Vouge é imensa. É claro. Jeongguk subestimou Vouge. E este é o ponto, o que infla sua magnitude. A surpresa do que a abriga é o que a torna capaz de lutar. Jeongguk está no lugar certo e fará o possível para permanecer. Pois, logo atrás, está o que poderia ser um estádio de futebol — se o esporte ainda fosse praticado no país. Revelando um horizonte — com os muros pintados de preto, graxa. Enorme, populosa e vitoriosa.

Vouge é o segundo round vitorioso contra a Capital. Jeongguk se questiona se este lugar já abrigou grandes seleções mundiais dos resquícios das nações que rondavam continentes, pela proporção e as marcas arredondadas nas longas extremidades, as longas vigas de metal seguras por fios que se interligam uns nos outros em pequenos jogos da velha. Uma cerca elétrica rústica e desproporcional. Algo que grita intencionalidade. Um reforço bruto ou apenas um apetrecho. É difícil dar forma, mas compreensível sua segurança.

— Gostou da nossa cerca elétrica? Chique, não é? Dá para jogar umas partidas de jogo da velha sentado no muro. É divertido até, tirando a parte do morrer eletrocutado, claro! Mas, e aí? Você tem um nome? — Ainda estagnado no mesmo lugar, na pequena rampa ligada a enorme passarela com os pneus amontoados por quase cinco metros, sentindo a vibração da arquibancada às suas costas, atrás do enorme portão de lata e o palanque onde Kim Taehyung com sua expressão apática, Jeongguk é recebido por alguém usando pijamas de cabras falantes e pantufas alaranjadas sujas de terra segurando um megafone azul e branco. Por algum motivo, a pessoa não consegue parar de sorrir.

Parece ter a mesma idade de Jeongguk ou o mesmo tamanho, ou algo entre essas duas coisas. É um pouco difícil dizer. Tem o cabelo prateado, o que destoa da paisagem concentrada em carros quebrados, chão de terra, metal retorcido e cheiro de óleo queimado. Usa um colar interessante: uma espécie de cordão de couro com fios de cobre retorcidos, a letra V está ao centro, dourada com as pontas prateadas. Não parece ser um acessório qualquer. Usa pontos no ouvido; pequenos fones sem fio de cor preta ligados na mesma corrente. É um indicativo, óbvio. Esta pessoa é importante aqui.

O megafone não é a única coisa que grita autoridade no visual, o olhar, mesmo que descontraído, mostra sua posição de destaque e até algo a mais que isso. Jeongguk não tem uma ideia sobre como deva funcionar o sistema hierárquico de Vouge, o famoso quem manda em quem, ou quem é o responsável pelo quê, mas sabe que deva ter seus superiores e os inferiores, sempre tem algo do tipo, é um padrão!

E é exatamente isso que almeja: uma posição que o coloque como um peão na disputa. Se Vouge quer acabar com Isósceles, Jeongguk fará de tudo e o impossível para estar na linha de frente, guiando por cada caminho naquele labirinto triangular.

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