Capítulo cinco

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Estaciona o carro e desliga-o. Bate com as mãos nas suas pernas e vira-se para encarar-me. Não quero deixá-lo ir embora, não agora. Antes que pudesse dizer alguma coisa, falo por impulso.

— Podes ficar? — Mexe a cabeça, num ato de tentar perceber se de facto ouviu bem. Comprimo os lábios, receando a sua resposta.

— Posso ficar? — Aceno que sim, repetidamente, com a cabeça. — Queres ficar aqui? — Nego e sorrio.

— Anda, vamos entrar. — Saio do carro, sem deixar que me responda e ele sai rápido. Tranca o Ford e segue-me até à entrada do prédio. Abro a porta e primo o botão do elevador. As pernas de Harry não param de batucar no chão e sinto-me diferente ao tê-lo ao meu lado. A porta do elevador abre-se e entramos. Primo o terceiro andar e esperamos, em silêncio.

— Está à vontade. — Digo, assim que entramos no meu apartamento e deixo cair a bolsa no aparador da sala, ligando a luz da divisão. Atiro as sandálias para um canto. Harry olha em redor, sem vergonha e admiro-lhe a audácia. — Tens fome? — Olha-me, como se desse conta de que ainda ali estava e coça a nuca. — Sede?

— Tens café? — Encaminho-me para a cozinha e sinto os seus passos atrás de mim. Ligo a máquina e preparo dois cafés expressos para ambos. Entrego-lhe a chávena e ficamos, em lados opostos, a olhar-nos. — Já alguma vez entrou aqui alguém?

— És o primeiro homem que deixo entrar na minha casa. — Arregala os olhos e assente, satisfeito com a resposta. — Acho que a nossa casa é um refúgio, como tal há que evitar memórias que um dia podem atraiçoar-nos. Se a tua casa deixar de ser o teu porto seguro pelas lembranças que te podem assombrar, então perdes a tua paz.

— Tens toda a razão. — Pousa a chávena vazia, ao meu lado, no lava louças. Antes que pudesse abrir a torneira, pouso a minha mão na sua e impeço-o.

— Depois coloco na máquina. — Cruza os nossos dedos, não quebrando a ligação que comecei. Coloca-se à minha frente e pouso a minha chávena ao lado da sua. A sua mão esquerda massaja-me a nuca e arfo. Os seus olhos tornam-se mais profundos e por momentos, consigo ver para além dele. Ainda tem receios e dores que o acompanham, embora não o demonstre. Coloco a mão disponível na sua bochecha esquerda e puxo-o para mim, fazendo os nossos corpos colidir. Beijo-o e durante o tempo em que somos um só, esqueço o lugar onde estou ou o que já fui. Quero que o tempo pare e nos dê mais tempo para apreciarmos as nossas bocas, com mais afinidade e emoção.

Assim que descolo a minha boca da sua, encosta a sua testa na minha e sinto a sua respiração nos meus lábios. Sinto-lhe o batimento cardíaco acelerado e puxo-o pela mão que continua na sua, até ao meu quarto. Não acendo a luz e ele não a procura. O luar percorre os cantos do quarto iluminando, em especial, a cama. Descalça as suas botas e deixa-as no canto esquerdo do quarto, decidindo assim o seu lado da cama. Sento-me, perto da cabeceira da cama e ele faz o mesmo. Entrelaça os nossos dedos e deixo a minha cabeça cair no seu ombro.

Por minutos, a única coisa que ouço é a sua respiração descompassada. Faz-me carinho na mão com o polegar, sempre no mesmo ritmo e sinto-me a levitar. É irónico estarmos aqui, os dois. Não o procurei. Não o esperei. Evitei-o enquanto consegui, mesmo quando a minha mente fazia-me relembrá-lo e em menos de vinte e quatro horas tenho-o na minha cama. A vida sempre toma as suas próprias direções.

— Nunca concluíste que quando deixas de pensar tudo fica mais claro? — A sua voz faz-se ouvir, mais rouca do que nunca, em todo o quarto. Retiro a minha cabeça do seu ombro e encaro-o. — Quando deixas de pensar, o teu coração age por ti dando-te impulsos. Se continuasses a pensar demais sobre nós, jamais estaríamos aqui e agora. A mente cria muitas dúvidas, muitas suposições e probabilidades, que não passam de possibilidades. Ser ou não ser. Acontecer ou não. Se não viveres, não sabes. E se deixares de viver por não saber, então estás, irremediavelmente, perdida. — Sorrio e vejo como me retribui o gesto.

Can I Stay? | Harry StylesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora