33 - SETEMBRO DE 1865 - parte 1

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Acordei suando, sentindo uma presença conhecida. Estava mudada, mas era a dele sem dúvidas. Ele sempre havia sido muito inteligente e por mais irracional que fosse, pensei que talvez ele pudesse me ajudar a amenizar a dor de Saito. O sol já estava começando a nascer e para ser sincera eu não sabia de quem era o turno daquela noite e nem me preocupei, apenas sai, com as mesmas roupas na qual dormi.

Saí pelas ruas correndo, procurando a todo custo de onde vinha a presença e parei na frente de uma casa. O quintal estava uma bagunça e parecia que ninguém pisava ali há anos. Não havia dúvidas, a presença vinha dali. Entrei devagar na casa e procurei no primeiro quarto e logo no segundo eu parei na porta. Prendi a respiração e tentei ver melhor.

– Quem está aí? – a voz grossa de homem retumbou pelo ambiente. De jeito nenhum que eu poderia confundir aquela voz.

– Pai, é você? – falei sentindo um aperto no peito, no fim, talvez ele não tivesse enlouquecido.

Ele se virou lentamente e caminhou em minha direção. Eu sabia da transformação, mas naquele momento, tudo o que eu via na minha frente era o meu pai se aproximando.

– Ambar, já faz muito tempo.

– Pai! – corri para ele e o abracei. Sua roupa cheirava a amaciante. Cheiro que eu havia sentido tantas vezes.

– Deixe-me ver seu rosto – ele olhou para mim sorrindo – Você sai de casa por um tempo e, de repente, você se transforma em uma linda mulher.

Meu coração estava acelerado e as lágrimas saltaram dos meus olhos. Ele acariciou meus cabelos suavemente. Parecia que todo o tempo que havíamos passado separado desapareceu, mas a dura realidade precisaria vir à tona.

– Pai – falei abraçando-o novamente – O que você está fazendo aqui?

Sua mão parou e me separou do corpo dele com suavidade e ele sorriu, um sorriso aconchegante e familiar.

– Eu estava com... – ele começou e pareceu mudar de ideia – Não importa. Me fale sobre você, o que tem feito?

– Eu... – senti que apesar da felicidade, algo ia mal – eu estou bem, estou apenas terminando minha prova. Conheci algumas pessoas e eles passaram a cuidar de mim.

– Entendo – ele seguia sorrindo e eu comecei sentir um mal-estar no estômago – Parece que você está me escondendo muita coisa, mas não tem problema, sei que você tem passado por muita coisa desde que chegou aqui.

– Oh... não... não foi tão ruim – menti me afastando um passo, como eu pude ser tão ingênua a ponto de pensar que meu pai seguia ali?

Eu queria perguntar, mas estava assustada. Ficamos ali em um silêncio constrangedor por vários minutos. Seu sorriso seguia intacto. Apesar da semelhança, do mesmo cheiro, o homem que eu chamava de pai já não existia.

– Mesmo não tendo o seu sangue – ele seguiu sorrindo – Eu sempre pensei em você como minha filha. Criei você com dedicação e muito amor.

O calor de sua voz havia desaparecido quase por completo. Senti sua mão ficando tensa ao redor do meu braço. Seu sorriso desapareceu e em seu semblante havia algo distinto.

– Você percebe? – sua voz ressoou, distorcida por uma maldade interna – Você é valiosa para mim, pois você concederá poder ao lorde Saikhan, nos permitindo restaurar a força dos nefilins.

– Pai... – tentei soltar minhas mãos das dele, mas ele segurava com força – Pai, por favor, você não é um nefilim. É uma divindade.

Mas ele não estava me ouvindo. Ele parecia um completo estranho. Meu pai já havia usado um sorriso tão horrível antes?

FendasWhere stories live. Discover now