Capítulo 21

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Uma rufada forte de vento veio ao rosto de Sáskia seus cabelos e abrindo os seus olhos. Mal podia ver a sombra gigante da harpia sobre a gaiola tapando o sol, as garras enormes se abaixando. Tateou em busca de alguém até encontrar um braço mais fino que o de Prometeu.

Sua mãe enrolou os braços ao seu redor, segurando sua face contra o seu peito.

— Mãe?! O que tá acontecendo?!

O homem montado na Harpia gigante assobiou e a ave desceu. Enrolou as garras envolta do suporte da gaiola e puxou, batendo as asas tão forte que mais parecia um helicóptero. Sáskia se agarrou as grades se desvencilhando do abraço de Helena, observando o chão ficar cada vez mais longe.

A cada batida de asas do monstro, a gaiola parecia balançar como uma gangorra e seu estômago já não estava mais suportando tanto.

Teve o vislumbre da outra gaiola com tia Saga e Prometeu se erguer, levantada por outra Harpia, seguindo elas. Nesse momento o acampamento já estava ficando pequeno, revelando as pequenas pessoinhas que viviam ali com suas cabanas e plantações.

O vento ainda soprava forte nos seus ouvidos quando uma outra Harpia pairou ao lado da gaiola, seguida por outra e outra. Carregavam sacos tão grandes quanto as próprias gaiolas, montadas por homens e mulheres como se fossem cavalos alados. Um deles se aproximou, as asas da ave gigante quase encostando nas barras da jaula.

O domador tirou o capacete de couro estranho que usava, mostrando os longos cabelos verdes e o sorriso de empolgação que Sáskia conhecia muito bem.

— Melhor se segurar aí — gritou Atalanta, entre um mascar de chiclete — Não vai querer cair da gaiola!

Um outro cavaleiro encostou ao lado dela, gritando, as mãos bem fechadas ao redor das rédeas que guiavam a harpia cinzenta.  Sáskia não pôde entender muito do Animalesca, mas podia apostar que aquilo era uma aposta de corrida. Atalanta colocou o capacete de volta, deitou junto ao pescoço da Harpia e gritou algo. No mesmo instante a ave bateu as asas numa única rufada balançando a gaiola e acelerando à frente do comboio. O adversário seguiu.

— O quê que tá acontecendo?! — Sáskia gritou esperando uma boa reposta da sua mãe.

Ela se segurava as barras como podia, com as duas mãos para a sua surpresa. O curativo na barriga limpo e seco. Até mesmo ela parecia estar menos suja de terra e folhas. Um tratamento que Sáskia também não recusaria.

— Aonde a gente tá indo?!

— Pra Poleiro!

Achou que ela tinha dito "Poleiro", mas só podia ser o vento. Sáskia se aproximou aos poucos tomando cuidado para não enfiar a perna entre um dos vãos da gaiola.

— Pra onde?!

— Poleiro da Harpia!

As palavras da mãe só iriam fazer sentido algumas horas depois. Quando já estava cansada de se segurar as barras, de cruzar meio oceano, Sáskia teve o vislumbre do que a mulher falava. As aves desaceleram ao se aproximar da ilha de rochas, permitindo a ela ver a estranha formação de pedras daquele "Poleiro".

Para uma ilha, faltavam praias, terra ou qualquer tipo de vegetação. Era uma rocha enorme que se erguia do fundo do mar aos céus com um estranho formato familiar, quase que reconhecível de uma ave com as asas fechadas, bico para cima. Uma Harpia de Rocha Negra.

Ao se aproximarem, pôde ver as pontes se madeira ao redor das rochas levando a cabanas onde pessoinhas apontavam para elas. Sáskia observou enquanto um par de garotos acenava para elas, e não pôde se conter ao devolver o mesmo aceno.

No mesmo instante eles pararam e deram as costas.

— Não foi pra gente. — disse Helena.

Uma estrutura de madeira se projetava para fora da parte mais alta da ilha, cercada por pessoas. As Harpias com os sacos enormes foram as primeiras a pousar, fazendo a multidão celebrar. O pouso das gaiolas poderia ter sido mais delicado do que Sáskia esperava.

Bateu com a cabeça no teto com o impacto. Doía, mas estava agradecida por não ver sangue. Sua mãe já estava analisando a sua cuca quando a gaiola se abriu.

Um dos guardas puxou ela pelo braço fanho a atirando no chão de madeira como se fosse um dos sacos de comida. Helena fez menção de dizer algo, apontando o dedo na cara dele, o afastando, mas ela também foi jogada ao seu lado.

A gaiola com os dois Deuses chegou de súbito, aterrissando ao seu lado. Sáskia esperaria uma maior dicotomia entre os dois, mas ambos tinham o mesmo sorriso e olhos curiosos ao pôr os pés para fora da gaiola.

Sáskia se ergueu de imediato, se pondo em pé, encarando a multidão à sua frente. Um dos cavaleiros alados descia da maior das harpias, a multidão ao seu encalço. Sáskia pôde ver os cabelos verdes de Atalanta conforme ela caminhava entre eles, Prometeu também.

— Atalanta! Ah, Atalanta! — gritou ele, avançando para a multidão.

Os guardas tentaram o parar, mas ele escapuliu antes que o pegassem e chegou no meio de todos. Atalanta parou, o encarou de cima a baixo e disse algo em Animalesca o qual ele apenas respondeu com:

— Você...

Prometeu parou, estático.

— Você não é ela. Você não é...

Os guardas já tinham tomado ambos os braços dele, o arrastando para longe da Senhora de Poleiro da Harpia quando ela proferiu em alto e bom som algo a mais em Animalesca.

— O quê ela disse? — perguntou Sáskia.

Sua mãe parou por um momento, boquiaberta.

— Que Ártemis tenha pena da sua alma.

Sáskia e os Caçadores de Deuses Where stories live. Discover now