2. Encontro

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NICHOLAS NELSON ODEIA BEN HOPE. Isso é um fato. Mas o garoto não simplesmente odeia o seu ex-colega, ele o odeia porque Ben sempre foi — e sempre será — um otário, especialmente com Charles Spring, o mais novo amigo de Nicholas; ele odeia odiar pessoas e sentir algo negativo sobre elas, mas abre facilmente uma exceção para Ben.

     Nas últimas semanas, Ben tem sido um cavalheiro, extremamente gentil com todos, mas tudo isso porque fora pego por Nicholas tentando pressionar Charlie acerca de um assunto particular; para Nicholas, o assunto não interessava, contanto que Ben mantivesse uma distância segura de aproximadamente dois metros — ou mais — de Charlie.

     O garoto sente náuseas todas as vezes em que lembra da sua antiga relação de coleguismo com Ben.

     Seus outros amigos também não foram muito gentis — com raras exceções, como o Sai, o Christian e o Otis, por exemplo — com o Charlie. Muitos deles não aceitaram muito bem o convite que Nicholas havia feito, para que o garoto participasse do time de Rúgbi.

     Alguns protestaram:

     — Você sabe que ele é gay, Nicholas...

     — É. Tipo, pouco me importa se ele quer nos observar no vestiário, sério. Mas eu não me sinto bem tentando forçá-lo a ser como nós, e jogar Rúgbi, porque ele não é!

     Portanto, sempre que podia, Nicholas os evitava.

     Não foi diferente de alguns dias atrás, quando trocava de roupa no vestiário masculino:

     — Acham mesmo que o Charlie nos observaria no vestiário? Por prazer? Ele não é assim. Digo, esse pensamento é repugnante — Nicholas estava revoltado.

     — Idiotas. Estão sempre se achando — respondia o Otis, bem baixinho, para apenas Nicholas ouvir, enquanto trocava de blusa — Anda, aguenta mais uma corrida? Vamos mostrar para eles como se faz!

     Nicholas tentava fugir da conversa com um leve aceno, distraído: — Aceito. Mas todos sabemos que o tempo recorde ainda é o do Charlie. Ele é o mais rápido.

     — Sim. Sabe, cara, eu não sinto inveja dele. Sinto raiva — admite o garoto, em tom sarcástico — Ele consegue ser inteligente, o mais rápido, e o mais popular, sem mesmo pedir!

     Nicholas dá um sorriso, concordando. Ele sabe que Charlie é uma pessoa especial e merece ser reconhecido pelo seu brilho próprio. Odiaria vê-lo magoado pelos comentários merdosos dos companheiros de time.

     — Não é exatamente o que ele quer, ser popular entre os garotos do time de Rúgbi. O Charlie é diferente.

     — Então — Otis observa o amigo terminar de vestir o seu uniforme, pensativo — O que está rolando entre Nick e Charlie?

     Nicholas responde, igualmente pensativo: — Amizade.

     — Amizade, amizade? Ou... amizade, amizade!

     — O quê?!

     — Cê entendeu, Nelson!

     — Ah, está bem! Amizade, amizade...?

     — OK. Sabe que pode contar comigo para qualquer coisa, não é?

     — Sim, senhor, capitão! Obrigado — Nicholas faz uma vênia.

     — Idiota... Ah, oi, Ben.

     Antes de conseguir escapar do infortúnio, Nicholas dá uma olhada na figura que se materializa ao seu lado, silenciosamente. É Ben, pelo visto, com o seu uniforme meticulosamente arrumado. O sorriso ácido insuportável. Quase faz o garoto revirar os olhos para sempre ali mesmo.

     — Olá, Ben.

     — Tarde para você também, Nicholas! — responde Ben.

     — O que quer?

     Otis observa o desdém do amigo, sem entender de onde veio a repulsa repentina de Nicholas.

     — Soube que o seu novo amigo quer encontrá-lo depois da aula. Eu só vim entregar o aviso.

     — E porque ele pediria para você, Ben, entregar esse aviso?

     Ben ergue as mãos, gabando-se: — Eu não faço as regras, Nicholas.

     Ele dá de ombros.

     — Campo. Depois da aula. Divirtam-se!

     Dito isso, Ben dá meia volta e vai embora, despreocupado. Aquilo pareceu afetar Nicholas de uma maneira surpreendente, tanto que Otis percebera. O garoto não se demorou no vestiário, enfiou tudo na mochila e a arrastou para fora daquele ambiente tóxico, erguendo o dedo do meio para os garotos que o incomodavam com piadinhas sobre Charlie e ele.

     Seu outro colega, o Harry Greene, um ruivinho insuportável, tentou impedi-lo de sair, mas não adiantou. Nicholas rumou até o campo e esperou, sozinho; esperaria por Charlie o tempo que fosse, mas preferia estar na presença dele do que na dos colegas de time. Infelizmente, ele sentia que não confiava em mais alguém além de Charlie no momento.

     Se pudessem, atacariam Nicholas na primeira oportunidade que arranjassem para apedrejá-lo com insultos em formato de piadas, justo quando ele mais precisava de companheirismo e compreensão. Não sabia o que sentir em relação ao seu novo amigo.

     Os pensamentossobre Ben Hope e todos os outros invadiam a sua cabeça como cacos de vidroafiados. Quase o fizeram esquecer que algo o observava, de dentro da floresta,espreitando silenciosamente e vindo na sua direção, sedento por uma vítima. Foiquando Nicholas percebeu que corria um grande perigo...

Unstoppable: A "Heartstopper" TaleWhere stories live. Discover now