Capítulo 33

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Fabiana.

Nós nascemos sabendo que temos ali nossos pais e que um dia eles se vão. Por mais que isso nos traga profunda tristeza, é assim que tem que acontecer. Filhos devem enterrar seus pais, é como funciona a vida.

Quando o ciclo se faz contrário, é muito triste de se ver. A dor de uma mãe que enterra um filho é esmagadora.

A mãe de Bruna estava sentada em uma cadeira de frente para o caixão. Ela estava calada, com o olhar parado como se não precisasse nem piscar.

As pessoas chegavam para prestar condolências e ela nem sequer movia o olhar. Ela estava estática, incrédula.

Fechei os meus olhos e orei pela alma de Bruna, orei para que Deus trouxesse um pouco de conforto para o coração daquela mãe. E quando eu me dei por mim, as lágrimas já escorriam no meu rosto.

Bruna cresceu na comunidade, ela sabia as consequências daquilo que ela estava fazendo. Mesmo que ele também traisse, que também tivesse outra pessoa. Ele jamais aceitaria que fosse com ele.

De onde eu venho, milhares de Brunas morrem todos os dias.

A hora mais triste é  quando tem que descer o caixão. Se a ficha não caiu, ela cai nessa hora.

A mãe de Bruna se levantou e gritou, puxando os cabelos. Uma outra mulher segurou o rosto dela e tentou abraçar.

-É a minha filha, minha menininha-gritou e bateu no peito, ela abraçou o caixão e eu virei o rosto. Era uma situação tão forte, que eu estava ficando sem ar de ver aquilo tudo.

Deixei a rosa encima de um banco e virei as costas. Pedi um uber na saída do cemitério e entrei.

Tirei as roupas que eu estava ainda no terreiro de casa, deixei elas para o lado de fora e fui direto para o banheiro. Tomei um banho e lavei meu cabelo.

Fiz comida e minha mente foi em Ícaro, tem dias que eu não vejo. A comunidade está cheia de polícia, a maioria dos envolvidos estão entocados.

A polícia quer Fulano de qualquer jeito, nessas batidas eles já pegaram muitas drogas e armas. Muito prejuízo.

Eduarda gritou no portão e eu mandei entrar. Ela entrou com a cara inchada e me abraçou.

-Ele matou ela Fabi, ele matou Bruna-chorou-Ele matou a mulher que deitava todos os dias do lado dele, amiga. Ele tirou a vida dela, ele tirou.

Eduarda estava em prantos, e eu tentando acalmá-la.

-Bruna merecia viver muito ainda Fabi, mas por culpa dele ela não está mais aqui. Eu também tenho culpa nisso-soluçou-Eu já pedi tanto perdão a Deus, tanto...

-Eduarda, você não matou a Bruna. Ele matou! Ele sempre traiu, com você e com muitas outras. Eu imagino oque tu está sentindo, cara-abracei ela

Eu via o olhar de arrependimento em Eduarda, a culpa que ela estava colocando em si mesma. Eduarda tem um coração muito bom, mas ela tem os erros dela, todos nós temos.

Mas para ela, qualquer possibilidade de ter alguma parcela de culpa na morte de Bruna. Estava rasgando o peito dela, Eduarda estava sofrendo com a morte de Bruna.

Escutei o portão fazendo barulho e fui olhar, Larissa estava encostada nele.

-Oque tu está fazendo aqui ?-perguntei

-Eu preciso sair daqui Biana, eles estão atrás de mim-falou segurando meu braço-entraram na minha casa procurando Fulano, mandaram eu dar um jeito de trazer ele pra cá se não vão arrancar minha cabeça.

-E tu sabe aonde ele está ?-perguntei olhando para ela

-Eu achei que sabia, Fulano pegou tudo de valor que tinha em casa. Tudo. Disse que iria me mandar um endereço pra onde ir, mas não mandou. Ele também não atende o celular.

-E sobre a morte de Bruna, Larissa ? Como tu espera algo de um homem que fez uma coisa dessas-balancei a cabeça negativamente. Sabe aquele arrependimento ? Aquele sentindo de tristeza que sentimos pela morte de alguém ? Não tinha ali.

Larissa estava dura, preocupada apenas com ela.

-Eu devia estar chorando ?-perguntou

-Talvez não por Bruna, mas pela mãe dela. Porque tu não se tocou, mas tem uma vida aí-olhei para a barriga dela-Eu juro que se não fosse por essa criança que está aí, eu te deixaria sentir pelo menos uma vez as consequências das coisas que você faz. Mas eu não vou precisar, não vai ser pelas minhas mãos que tu vai sentir isso.

Liguei para tia Juliana e ela veio pra cá na hora, ficou louca quando viu Larissa. Falando que estava imensamente preocupada.

-Larissa tem que ir embora daqui-falei

-Eu vou olhar com Ícaro uma casa fora daqui, depois eu levo as minhas coisas. Vamos eu, ela e Natália.

-Não. Nem você e nem Natália, Larissa vai sozinha.-falei olhando dentro dos olhos dela.

-Minha mãe tem algumas casas de aluguel, eu vou conseguir pra ela- Eduarda falou

-Fabiana, Larissa é uma menina e está grávida, e sem um emprego.

-Larissa vai sozinha, ponto final. Larissa não foi uma menina quando saiu de casa e foi se tornar esposa, Larissa sabe ser dona de casa. E agora ela vai aprender a ser mãe e ter um emprego.

-Larissa ganhou minha indiferença, mas o meu sobrinho não. Larissa vai sozinha, mas não vou deixar faltar nada para o bebê, que não tem culpa. Mas tu-olhei pra ela-vai trabalhar e se sustentar, a minha única ajuda vai ser para oque o meu sobrinho precisar.-continuei

Foi como arrancar meu coração com a mão, lembrei de quando eu tinha que trabalhar no sinal. Lembrei daquela Larissa, pequena e com fome. Lembrei da fome que eu sentia por dias, abdicando de comer para que ela pudesse.

Eu faria tudo novamente! Tudo. Larissa tem o meu perdão para tudo que ela fez, eu não amo ela nem um grão a menos.

Mas eu paguei o preço das minhas escolhas, paguei por eles a minha vida inteira. Sentir as consequências das próprias escolhas não vai matá-la. Não me matou.

Fabiana.Where stories live. Discover now