2.6. o pior dia desde ontem

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I heard you settled down and that you married happily 
oh, do you remember when I told you 
that I loved you to the bottom of the sea? 
Yeah I know, I know it's over 
but I guess that's just the way it has to be
Kodaline 
Moving On

***

Georgia passou o domingo inteiro trancada no quarto. Macarena havia passado no hotel rapidamente para conversar sobre as obras que estavam interditadas, além de outras questões relacionadas ao trabalho delas na construtora. Falaram também de assuntos triviais, do clima árido da cidade, da comida brasileira e dos costumes das pessoas em São Paulo. Ela foi embora e Georgia se sentiu aliviada quando se deu conta de que ela não havia tocado no nome de Helena.

Quando começou a anoitecer, Georgia teve o sossego interrompido por duas batidas na porta do quarto. Deixando de lado os projetos que analisava, levantou-se do sofá para ver quem era e se deparou com sua mãe do outro lado, vestindo um macacão bege da Stella McCartney sob o sobretudo preto.

— Georgia, minha filha — Eugênia passou por ela sem cerimônias, tirando os óculos de sol que cobriam os olhos ferrenhos para fitá-la —, até quando vai morar em quarto de hotel? Meu amor, eu estou muito preocupada com você, e o seu pai também.

— É temporário — Georgia fechou a porta e voltou a se sentar no sofá, servindo-se de mais vinho tinto. — Logo eu arrumo algum outro lugar para ficar.

— Georgia, você construiu uma vida tão maravilhosa na Espanha — ela começou a dizer, andando pelo quarto em busca de uma taça para ocupar a mente e as mãos. — Por que você insiste em voltar para o Brasil? Aqui não tem nada para você, meu bem.

— Graças a você, não mais — Georgia balbuciou de modo insosso, observando as ondas do vinho em sua própria taça enquanto sua mãe se sentava de frente para ela.

— Eu não tenho vergonha das coisas que faço para proteger os meus filhos, Georgia — ela disse com firmeza, encarando a filha sem vacilar. — Sou capaz de qualquer coisa para proteger a nossa família.

— A imagem da nossa família, você quer dizer — Georgia a corrigiu automaticamente. — Você não se importa com a nossa felicidade, com o que a gente quer.

— Eu quis proteger a sua imagem — ela retrucou com veemência, apontando o dedo na direção de Georgia —, a imagem do seu pai, da nossa família — ela aumentou o tom de voz gradativamente conforme a raiva tomava forma nas palavras que saíam da boca dela. — Eu quis proteger o seu pai do vexame nacional, do circo midiático, da vergonha que é a filha preferida dele, e eu quis proteger você de você mesma, do perigo que representava a si mesma. O que você esperava que eu fizesse, Georgia? Que eu permitisse que estragasse a sua vida? Eu fiz o que eu tinha que fazer. Eu cumpri com o meu dever, com a minha obrigação e eu não me arrependo.

— Você estragou a minha vida, Eugênia! — Georgia apontou o dedo para ela, perdendo o autocontrole como havia perdido tantas outras coisas no percurso labiríntico que era a sua vida. — Eu não preciso da sua proteção, eu não quero a sua preocupação, porque tudo o que você fez foi arruinar a minha vida. Você me transformou numa covarde. A sua interferência me custou a minha felicidade, a minha autoestima, a minha identidade.

— Georgia, minha filha, você se engana se pensa que fiz alguma coisa — ela deu uma risada debochada, bebericando o vinho pela primeira vez para se defender das acusações. — Você foi para a Europa, fez boas amizades, estudou numa das melhores universidades do mundo. Eu deixei você livre em outro país. Em outro continente, por Deus! Mas não. Você prefere me pintar como uma megera, um monstro que enviou você a um sanatório por todos esses anos.

As Curvas do TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora