capítulo 8

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Tessa, aos dezenove anos
Quinta-Feira.

Hoje era o dia de voltar ao trabalho. Faltavam poucos minutos para que o amigo de Jeremy abrisse o restaurante e toda bagunça começasse. Não podia ser ingrata, o patrão pagava bem e todas minhas contas estavam em dia graças a correria que havia por aqui, sem o trabalho minha vida estaria na lama.
Assim que ele abriu a grande porta e notou minha presença a poucos metros de distâncias, escorada em um poste de luz elétrica, o homem sorriu largo me comprimentando. Ele era um doce quando estava afim, mas em seus dias de mau humor nem seu santo aguentava ficar por perto.

Seu nome era Bred, não falava tanto de sua vida pessoal, deixava-me curiosa para descobrir mais sobre o que estava por trás de todo aquele homem cheio de personalidades fortes e diferentes. Ele tratava bem todas as pessoas, mesmo em seus dias tristes não ousava descontar em seus clientes, mas para quem trabalhava tão perto do rapaz já não se falava o mesmo.

- Tessa, atende os clientes da mesa quinze, por favor - Bred indagava enquanto ajeitava a touca em sua cabeça.

Com um pequeno caderno e caneta preta em minhas mãos obedeci o pedido do homem para quem trabalhava, muitas das vezes revezavamos.

As mesas estavam cheias, a mesa número quinze ficava no começo do restaurante encostada na parede, dois homens de ternos com aparência de trinta anos que se pareciam dois amigos estavam sentados sobre as cadeiras com os braços apoiados a mesa enquanto conversavam abertamente sobre algo que não dava para escutar.

- Boa tarde, posso ajudar? - Minha presença fez com que os homens parassem o assunto repentimente

- Nós vamos querer o prato principal, por fora traga um copo d'água. - Disse o homem de terno cinza, seus olhos entregavam suas noites mal dormidas

- Qual seu nome? - A voz do outro homem de terno preto ecoou por meus ouvidos - Você se parece com alguém que conhecemos.

- Tessa, me chamo Tessa

- Ela se parece com Lucy - Confirmou o que estava de terno cinza - Na verdade, se parece com Josh.

Não fazia idéia do que eles estavam falando, nem sequer conhecia aqueles nomes. Eles encaravam tanto minha face que pareciam querer descobrir qualquer segredo obscuro guardado dentro de mim. Movi meus passos de volta para a cozinha. Era normal clientes nos acharem parecidos com parentes que já estavam mortos ou sumidos.

- Homens estranhos - Coloquei o bloco sobre o balcão enquanto olhava para Bred que cozinhava - Me acharam parecida com uma Lucy, depois com um tal de Josh.

- Não seja inconveniente, querida. Aqueles são os irmãos Steny e Bredy. Ficaram ricos a alguns anos quando encontraram o pai que estavam prestes a morrer - Bred era ágil dentro da cozinha, poucos segundos estava cozinhando, agora já estava colocando a comida no prato - Não é todo dia que o pai rico morre.

Aquela frase me fez rir. E Bred ria junto enquanto saia com o prato pelo restaurante. Ele sabia o que estava fazendo.

O fim do dia chegou rápido e todo meu corpo sentia o cansaço causado pela correria. Jeremy me esperava no carro do lado de fora do restaurante como prometido, ele havia dito que iria me buscar para jantarmos juntos e passarmos a noite conversando como antes fazíamos.
Jeff estava no banco de trás dormindo como um anjinho, papai disse que ele acabou se cansando em me esperar e caiu no sono no banco de trás, pelo menos ele veio. O trajeto todo Jemy dizia sobre como meu irmão estava sendo mais maduro e organizado em casa, agradeceu muito por o mocinho ter mudado tanto seus hábitos em tão poucos dias.

- Ele tem medo de perder você - Suas mãos apertavam o volante, estavam suadas e trêmulas - É a única pessoa que ele confia tanto.

- Jeff bobo, ele nunca vai me perder - O vento da janela aberta bate em meu rosto cansado fazendo meus olhos se fecharem - Mas nós precisamos crescer e ser responsáveis.

Jeremy estacionou o carro na garagem enquanto abria a porta para sair e acordar Jeff no banco de trás, seu sono estava pesado, como quem não houvesse dormido a noite passada.

Quando entrei pela porta da casa de papai notei que todos os objetos estavam em seus devidos lugares, o cômodo estava brilhando e não tinha nenhum som espalhado pelos cantos. Tinham sido apenas três dias fora.

- Se você quiser eu posso sujar tudo de novo pra você limpar - Jeff se jogou no sofá com um sorriso sacana no rosto - Senti sua falta, Tess.

- Bobo. Também senti a sua falta Jef

Ele ainda estava com sono, se virou para o lado e mais uma vez dormiu. Jeremy e eu comemos camarão e depois como sobremesa ingerimos sorvete, um pote para cada. Jemy parecia cada vez mais cansado, sua face já parecia enrugada mesmo sendo tão jovem e suas olheiras eram notáveis. As vezes sentia que papai se culpava pela morte de Sophia, talvez se ele tivesse sido mais presente as coisas fossem diferentes agora.
Quando papai e mamãe brigava diziam sobre traições e até mesmo sobre Sophia não suportar ver minha cara por eu me parecer tanto com Papa, isso fazia eu me sentir culpada também. Certas lembranças estão atrapalhando minha vida depois de dezenove anos, toda a vida fodida que tivemos.

Jeff estava sentado sobre a ponta da cama quando abri os olhos sonolenta pela madrugada, acabei me assustando mas não deixei que o garoto percebesse

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Jeff estava sentado sobre a ponta da cama quando abri os olhos sonolenta pela madrugada, acabei me assustando mas não deixei que o garoto percebesse. Quando ajeitei meu corpo sobre a cama sua cabeça se levantou e virou-se em minha direção

- Eu lembro de tudo - Ele ria, mas não parecia gargalhadas de alegria, o nervosismo percorria por suas veias - Lembro de mamãe dizendo que eu era seu preferido, que iríamos ir embora e Tessa ficaria bem - Seus olhos estavam cheios de lágrimas, medo e caos - Por quê, Tess? Por quê ela sempre te tratou tão mal?

- Eu.. Eu não sei, Jef - O puxei para mais perto, aflita e chorosa - Mamãe sempre guardou segredos, medos.. Mas nunca a culpei, ela tinha seus motivos. Não foi fácil pra uma garotinha que só queria colo da mãe, mas foi preciso aprender a viver sem.

- Quando estouraram a cabeça dela com aquela arma grande e forte, eu agradeci, agradeci por que você não iria mais sofrer, eu odiava te ver sendo rejeitada, queria te proteger - Sua voz estava embargada, cheia de dor e sofrimento, ver Jeff assim era lastimável.

- Não guarde ódio, por favor. Isso vai apenas te fazer mal. - Beijo o topo de sua cabeça - Nós estamos aqui juntinhos, e vai ficar tudo bem.

- Eu estou aqui pra te proteger, Tess

Jeff acabou caindo no sono em meus braços. Fiquei acordada pelo resto da noite com medo que ele acordasse mais uma vez tão pensativo e cheio de medos. Por quanto tempo ele havia guardado essas lembranças, todo esse caos dentro de si, usando entorpecentes apenas para sair da realidade.

De manhã o café já estava na mesa, os dois homens da casa apareceram na cozinha sonolentos. Jeremy havia dormido em seu escritório como todas as vezes, já Jeff dormiu como um anjo em minha cama. Todos tomaram café em silêncio, papai tossia a todo momento.

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⏰ Last updated: May 03, 2023 ⏰

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abyss of your eyes {em andamento}Where stories live. Discover now