capítulo 05

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Os olhos verdes de Alfonso se estreitaram ao encontrar os olhos azuis dela.

— Você não gosta nada de mim, não é? — perguntou sem rodeios, como se só então tivesse percebido aquilo.

Ela riu bem-humorada.

— Essa não é a minha fala? — Virou-se sem fitá-lo e voltou ao trabalho, aparentemente ignorando-o.

ELE SAIU da ala, mas remoía algo no fundo de sua mente, algo que não conseguia decifrar. Estava inquieto e desconhecia o motivo. Férias, pensou, deveriam deixar as pessoas relaxadas. As dele pareciam ter tido o efeito contrário.

Atrás dele, Anahí tentava acalmar seu traidor batimento cardíaco, forçando-se a não olhar o homem alto e moreno a quem secretamente entregara seu coração há muito tempo. Ele nunca soubera e jamais saberia. Diana levara aquele homem alto para casa e despedaçara o coração de Anahí. Os olhos verdes afetuosos, os sorrisos sensuais não eram para ela. Diana! a bonita, a namoradeira, casou-se com o homem por cujo beijo Anahí daria a vida. Mantivera esse doloroso segredo durante seis longos anos, durante os quatro anos do casamento de Alfonso e os últimos dois penosos anos de acusação e perseguição. O coração devia ter desistido, mas continuava batendo, apesar da doença que se agravava a cada dia.

Chegaria uma hora em que não teria tempo de procurar um médico. Não que isso importasse. Levava uma vida de sacrifícios e obrigações. Não recebia amor desde a morte dos pais. Vira-se perdida mudando-se para a casa grande e solitária, os donos a haviam aceitado com relutância. Era a empregada particular de Diana, a secretária da tia, o Office boy do tio. Passara sozinha e solitária praticamente toda a vida adulta, permanentemente apaixonada pelo marido da prima e orgulhosa demais para demonstrá-lo.

Agora, ele a odiava, culpava-a por algo injustamente. Ele ainda pertencia à linda Diana. Anahí concentrou-se em seus afazeres, esquecendo Alfonso, o passado e a dor. Aceitava sua derrota, como sempre, e voltou ao trabalho.

Anahí foi para seu solitário apartamento e desejou, não pela primeira vez, ter um gato ou um cachorro; qualquer coisa que lhe fizesse companhia. Mas era terminantemente proibida a entrada de animais no prédio, uma adorável construção antiga de dois andares, com encanamento precisando de reparos e a pintura das paredes descascando. Mas seus quatro moradores o consideravam um lar e mantinham uma pequena garagem nos fundos para os moradores que possuíam carro.

Felizmente, Anahí e um estudante de Medicina pareciam ser os únicos proprietários de carro no prédio. Havia um ponto de ônibus na esquina, e ali, no centro da cidade, tudo era acessível. Entretanto, Anahí gostava da liberdade proporcionada por um carro. Era pequeno e velho, mas andava, graças a um mecânico do quarteirão, que cobrava uma taxa mínima para consertá-lo quando necessário. O salário do hospital não era suficiente para pagar as contas; precisava cortar gastos.

Nunca lhe faltaram bens materiais enquanto morava com os tios e a prima, mas a vida era emocionalmente vazia. Ali, apesar das poucas posses, pelo menos era independente. E se lhe faltavam amor e companhia, isso não era novidade. De vez em quando, pensava se a tia se importara em ter de contratar uma governanta e uma secretária depois de Anahí ter sido expulsa da casa. Nunca precisara pagar a sobrinha pelos serviços. Isso nunca lhe ocorreria.

Alfonso mudara de apartamento depois da trágica morte da mulher. Não conseguira voltar para a casa onde a amada passara as últimas horas, e ainda culpava Anahí. Ela tentara repetidas vezes contar-lhe a verdade, logo depois do ocorrido, entretanto, enlouquecido de sofrimento e dor, ele se recusara a deixá-la falar. Talvez preferisse a imagem de mulher desalmada que nela projetara desde que se conheceram. Afinal, ele nunca prestara mesmo atenção nela.

Lembrou-se com sofrimento da primeira vez em que o vira, saltando do imponente Jaguar, diante da enorme mansão dos tios. Os cabelos negros brilhavam ao sol. Um discreto terno cinza deixava o corpo atlético mais magro, mais imponente. Ao entrar na casa, o impacto dos olhos verdes como carvão no rosto moreno e bonito fez o coração de Anahí parar por um instante. Nunca experimentara aquelas sensações na vida. Corara e gaguejara, e Alfonso dera um sorriso quase debochado diante de sua momentânea fraqueza. Tinha sido doloroso, como se ele soubesse que os joelhos dela fraquejavam naquele instante. Ele era um homem experiente, então talvez estivesse habituado à sua reação. Mas só Deus sabe que ele apenas demonstrara divertimento. Ele lhe dera as costas após a rápida e indiferente apresentação e se voltara para a linda Diana.

— Não pense que ele notou você — disse Diana, debochada, aquela noite —, apesar de seus olhares de cachorro carente. Imagine se um homem daqueles vai olhar duas vezes para você! — concluiu às gargalhadas.

Anahí não fora capaz de encarar aqueles aviltantes olhos azuis.

— Sei que ele é seu — disse baixinho, arrumando as coisas.

— Não se esqueça — retrucou Diana, ríspida. — Vou me casar com ele.

— Ele sabe? — não resistiu à pergunta seca.

— Claro que não — murmurou a prima, indiferente. — Mas pode escrever o que digo. — E casou-se dois meses depois, com a mãe como madrinha e uma das amigas como dama.

A paciente (Adaptada) ayaOnde histórias criam vida. Descubra agora