I | Michael

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"Eu te contarei
A historia desse rei
Morto por não poder
Lhe reencontrar"

- Ne me quite pas

.

Eu vou te contar como acontece. E você não vai gostar.

Os vinte e três anos são o auge da fertilidade omega. O perfeito equilíbrio hormonal para a dosagem genética que costuma dar à luz a bebês fortes. Quando você chega ao estágio derradeiro do desenvolvimento e está perfeito para a procriação – não tão novo que possa gerar complicações pós-nascimento, não tão velho que dificulte a gestação. Menores de vinte anos costumam carecer dos hormônios certos. Maiores que vinte e cinco desenvolvem hipertensão.

Este é o prólogo, a escassez de gestações saudáveis, as alterações hormonais, os óbitos, abortos, os cistos, a taxa de aumento em diagnósticos de câncer de útero, a infertilidade generalizada. Mortes, mortes. Omegas morrem nas maternidades com seus bebês presos dentro deles. Bebês nascem chorando e morrem gritando de dor antes de chegarem às incubadoras. Ninguém sabe o porquê. O coração deles não aguenta. Todos nós rezamos por nossas almas e fugimos da gravidez, ter um filho se torna o pior pesadelo possível.

Deus nos abandona, e por isso outros assumem o domínio sobre nós.

É claro que existe um Deus, porque a nossa saúde não poderia ser tão fodida por uma coisa pura como a natureza: não, sem dúvida alguma isso deve ser a maldição de um homem. Dessa forma sabemos que o mundo só está nos punindo por existir. Ninguém questiona se os de falo é quem têm problemas, se o sêmen deles está vindo defeituoso, se o pau deles de repente desenvolveu uma espécie de veneno que nos adoece. Não, é claro que não. O útero é o centro da questão.

Manifestações. Debates infinitos. O discurso deles chegando no parlamento.

De repente nós somos o problema e a solução. Precisamos ser testados, estudados. Sem filhos, o mundo adoece. Sem nossos úteros, não haverá mundo. Um omega de vinte e três anos infértil? Leve-o para exames. Então, nos furam. Nos abrem. Nos cortam. Nos castram. A raiz deve ser o cio – nos drogam para controlar os hormônios. A raiz deve ser a genética – enfiam nossas mães na menopausa em laboratórios para estudar uma possível hereditariedade infértil. Nisso eles nos engolem. Eles nos mastigam. Eles nos subjugam.

Todo omega macho deve parar de tomar hormônios para a transição de gênero. Toda omega fêmea deve desfazer procedimentos cirúrgicos e retirar silicone, assumindo o papel masculino negado ao transicionar.

Deixamos de ser pessoas. A culpa é da natureza, dizem. É a mão divina de Deus, alegam. Somos postos nisso porque corrompemos o mundo. Devemos ser empurrados de volta aonde pertencemos. Devemos ser reajustados. Devemos ajudar a repovoar o planeta, garantir as próximas gerações.

"Por que normalizaram homens darem à luz? Por que deram direitos a nós? Por que as mulheres omegas tinham poder de decisão sobre o próprio corpo, logo este corpo que é tão necessário para salvar o mundo? Ora, tirem a vontade deles, todos eles!"

Eles tiram. Nossos direitos. Nossas vozes. Nossas histórias.

Então, somos o problema. Mas também a solução.

Nos tiram de casa. Nos laçam feito bois. Nos prendem em campos vermelhos de treinamento. Mastigam doutrinas estranhas e nos fazem engolir. Nos dão correntes que não são feitas de ferro. Nos dão um mundo onde não cabemos mais. Nos dizem que pertencemos ao Estado. Nos dizem que é o querer de Deus. Cortam nossos cabelos. Tiram nossa identidade. Cobrem nosso corpo de vermelho.

Assim nos tornamos aias e lacaios.

Assim, tudo começa.


the omega's tale [destiel fanfic]Donde viven las historias. Descúbrelo ahora