42- Fim ou recomeço?

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A mãe gritava, até mesmo o pai parou por alguns segundos surpreso com aquela situação.

-Você vai matá-lo, chega, chega...

A mãe ainda gritava, mas a voz estava distante, quando caiu, Kanya tentou proteger o rosto com o braço e agora sentia que o braço estava todo cortado e sangrando muito.

"Princesa" ...

A última voz que ouviu antes de perder os sentidos, foi a voz de Bean. Será que ia morrer? Não, não era pelas mãos do pai que devia morrer, nunca fez mal algum ao pai, a família. Era pelas mãos de outra pessoa que devia morrer. Alguém pra quem ela fez mal de verdade...

*************

O olhar de Kanya mudou, Yiwaa pode ver isso claramente. E está com medo.

A alguns dias ela está no hospital. Os pais que a levaram, contaram aos médicos que ela tinha caído sobre mesinha da sala. Com apenas alguns exames os médicos sabiam que não foi bem assim. Tinha hematomas pelo corpo inteiro. Tiveram que dar pontos no braço e imobiliza-lo. Seu rosto delicado e feminino fora as marcas de que foi espancada, tinham olheiras profundas.

Uma das médicas ofereceu chamar as autoridades, ajudá-la a denunciar.  Mas Kanya não queria denunciar ninguém. Sua própria vida ja não valia nada. Então resolveu não complicar a vida de outras pessoas.

-Podemos falar com seu chefe, Fort é boa gente.  Se todos ajudarem você pode ir para fora do país. Começar uma vida nova.

- Não existe isso de nova vida...

A voz dela estava extremamente rouca, o olhar distante.

-Está pensando em alguma besteira? Não né? - Yiwaa faz carinho na mão que está livre de Kanya.

" E tudo que pensei até agora não foi uma grande besteira?"

Um amor, um emprego,  uma carreira,  uma família, uma transformação.
Será que sonhou alto de mais? Será que foi tudo uma grande besteira? Não queria acreditar nisso, mas quando viu já estava crendo que todas as escolhas que fez do momento em que deixou Prem para trás até agora. Tinham sido más escolhas. Era a primeira vez na vida que duvidava de si mesma.

Não foi só pelo que o pai disse ou fez, não foi só pela experiência com Bean, foi porque se deu conta, um pouquinho tarde, de que cair e levantar todo santo dia, não estava mais dando conta.

Pensou na ideia de Yiwaa,  mas logo descartou, por que para viajar precisava de muito mais que vontade, precisava de um bom plano, dinheiro, destino certo, trabalho em vista. Sem falar que estaria sozinha em um lugar estranho, não sabia oque ou quem podia encontrar.

"Pra que sofrer em um lugar estranho, se posso sofrer em um lugar conhecido?"

Kanya suspira profundamente.

-Quando vou receber alta?

Ainda não olha nos olhos da amiga, não tem coragem de encarar ninguém na verdade.

- Essa tarde mesmo, ficou aqui por tantos dias, dormia e acordava, me deixou com medo amiga.

- Seria bom dormir e não acordar mais.

- Não fale besteira - Yiwaa sentia o próprio rosto molhado- Você nunca foi assim... olhe vamos pensar com calma. Eu vou voltar no fim da tarde para te buscar, meu namorado vem comigo e te levaremos para casa. Tudo que você precisa pra colocar a mente em ordem é alguns dias, tenho certeza. Te conheço bem.

Provavelmente sim, depois de alguns dias de reflexão ela cairia em si, levantaria novamente a cabeça, e seguiria em frente. Mas tinha algo lhe incomodando de mais. Tinha que resolver um problema antes de seguir em frente. Mas resolver isso, talvez lhe custasse a vida.

***********

-Como assim já saiu? Pra onde ela foi?
-Calma meu amor.
O namorado de Yiwaa a amparava. Ela estava desesperada ao saber que Kanya saiu do hospital sozinha.
-Ela vai fazer uma besteira, a mente dela não está bem, ela vai fazer uma besteira.
Yiwaa chorava em desespero pela amiga enquanto o namorado a abraçava e tentava ligar para os conhecidos pra ver se alguém tinha visto Kanya.

***********

Kanya procurou Bean no restaurante, não achou, lhe deram o endereço do bar.

Ficou parada na entrada por um tempo, não que estivesse com medo. Queria viver, queria muito viver. Mas depois de todos os acontecimentos, preferia arriscar a ser morta, por que precisava começar do zero novamente sem nenhum peso na consciência, e seu maior arrependimento era ter enganado o dono daquele bar.

Antes de dar qualquer passo para dentro do ambiente seus olhar  encontrou os de alguém que provavelmente lhe odeia.

A forma como o peito de Bean subia e descia demonstrava o quanto ele estava irado.
Mesmo assim ela entrou. Passou direto por ele, sem nem falar nada. Não queria uma cena no estabelecimento dele. Bean parece ter entendido o recado e a seguiu. Ele podia ter mandado ela embora imediatamente, mas não foi o que fez. Quando Kanya não sabia pra onde prosseguir, parou, e ele entrou na frente dela a guiando até seu escritório. Entrou e trancou a porta...

Kanya se assustou um pouco com o estado da sala totalmente destruída, mas parece um cenário perfeito, um escritório que é igual ao exterior e interior dela naquele momento, caos e destruição.

Bean caminha até a própria mesa, parece que não quer olhar para ela. Seus punhos estão fechados. As veias do pescoço saltadas.
Kanya tem certeza de que ele está totalmente fora de controle agora.

Ela se ajoelha, na verdade veio por que precisava pedir perdão aquele homem,  sem isso não podia seguir em paz. Não queria pedir perdão por não ser uma mulher. Por que ela era sim uma mulher, mas queria pedir por não ser quem ele pensava que ela era. Por ter deixado ele acreditar naquilo tudo. Sabia que corria riscos indo ali. Mas agora não tinha absolutamente nada a perder.

Viu que Bean abriu a gaveta e pegou alguma coisa, quando ele se virou ela viu a arma na mão dele. Bean caminhou na sua direção e a segurou pelo pescoço, levantando seu rosto e apontando a arma diretamente para a cabeça dela.

Mas os olhos dele piscavam sem parar, e dançavam por cada hematomas em seu rosto, seu braço enfaixado e em uma tipoia, Bean parecia enlouquecer mais a cada novo machucado que identificava no corpo frágil dela.

Kanya fechou os olhos devagar.

Queria poder explicar que se sentia uma mulher, mesmo sem ter feito a cirurgia ainda. Explicar que tentou resistir a ele, mas acabou perdidamente apaixonada. Explicar que não contou a verdade por medo de se expor e não imaginava que as coisas entre eles chegariam naquele nível.
Queria pedir perdão. Não pra ter uma nova chance com ele. Des do primeiro dia sempre soube que nunca teve chance.

Mas parece que nenhuma dessas palavras e palavra nenhuma, nunca mais sairiam dos seus lábios.
As mãos de Bean tremiam enquanto apertavam seu pescoço, mas ela estava em paz, no caminho até o bar, pensou nos pais, em Yiwaa, nos amigos e inimigos que fez ao longo da vida. E realmente se sentia em paz.

Alguns minutos se passaram
Kanya ainda de olhos fechados
Bean já devia ter metido uma bala na cabeça dela a algum tempo. Isso fez kanya pensar se isso era mesmo o fim ou um recomeço?

Podia se apresentar de forma correta? Podiam se conhecer novamente? Se aceitar aos poucos?
Esses pensamentos sumiram quando sentiu o aperto no pescoço ficar mais forte.

Preferia a bala a asfixia. Mas devia algo aquele homem e deixaria ele cobrar...

Bean nunca voltava atrás em sua palavra, tinha jurado que mataria ela se ela entrasse em contato novamente, mas suas mãos tremiam.

Nos pertencemos ( NUMBER 2 )Where stories live. Discover now