Golpe de sorte

Dois

Charlie era um homem perturbado. Não bastasse ter sido abandonado por sua mulher e ficado sozinho na casa que herdou de seus pais, a sua mente vivia pregando-lhe peças.

Desde que era muito jovem, via e ouvia coisas que não podia explicar, como no dia que tocou o senhor Walter e viu um acidente de barco, horas depois soube da notícia, o homem havia falecido enquanto pescava. Ele tinha medo dessa habilidade e por isso jamais falou com seus pais sobre isso, mesmo que soubesse que eles comemorariam.

A família Swan tinha um grande segredo, eles acreditavam ser bruxos. Charlie ainda lembrava da primeira vez que ouviu isso de sua mãe, como riu até ver que falavam sério. Claro que ele nunca acreditou, ele sempre foi um homem cético e realista. Mesmo que tenha passado por algo estranho no dia da morte de seus pais, um peso havia sido colocado em seus ombros e seu corpo ficou energizado o dia inteiro. Como sempre fazia, ele apenas ignorou.

Isso até que os Cullens chegaram, quando apertou a mão de Carlisle, foi capaz de ver o homem e sua família com roupas de época cobertos de sangue. Eles pareciam demônios. O chefe de polícia não podia negar que era real, mas com o tempo, viu o quão bom o médico era para o povo e ignorou a natureza do homem.

Ele até permitiu sua filha envolver-se com um deles, mas toda a simpatia que sentia pela família morreu no dia que Edward Cullen destruiu sua menininha, agradecia aos céus por eles terem partido.

O toque estridente de seu celular soou por toda a floresta , com rapidez o policial agarrou o aparelho e aceitou a ligação. Harry Clearwater, seu melhor amigo de infância, o encarou segurando a grande arma em suas mãos cansadas, seu coração acelerado dando algumas pontadas se acalmou um pouco com a curta pausa.

— Charlie Swan falando — ele saudou encarando a floresta ao seu redor. Fazia dias que caçavam os lobos e nada. Ele ainda sentia aquele formigamento em sua nuca e sabia que havia algo mais naquela floresta.

— Chefe, temos uma emergência na delegacia que envolve o senhor — a voz do outro lado disse sem rodeios.

Ele franziu o cenho.

— Como estou envolvido policial Frey? — questionou e sua mente viajou para Bella. Sua filha estava em um estado de pura depressão desde a partida daquele garoto e ele já não sabia o que fazer.

— Confie em mim chefe, o senhor precisa vir — algo na voz do policial fez com que Charlie concordasse, ficou olhando para o celular em sua mão após desligar e suspirou.

— O que está acontecendo Charlie ? — Harry perguntou um pouco ofegante, ele ainda estava um pouco tonto, mas sentia seu coração ficar mais calmo. Precisava marcar uma consulta com o doutor Stafer, o cardiologista da reserva.

— Eu não sei meu amigo, mas realmente preciso estar na delegacia. Continuamos depois rapazes? — perguntou recebendo confirmação de todos e foi para seu carro.

Durante todo o trajeto, milhares de cenários surgiram em sua cabeça, um pior que o outro, mas é claro que nada o preparou para o que de fato estava acontecendo.

Davina esmagou nervosamente o biscoito em suas mãos, fazia quase uma hora que estava sentada no banco da delegacia sob o olhar curioso daquele policial simpático que a fazia lembrar o Garfield, gordinho, fofo e comedor de lasanha. Faziam uns três dias desde que havia fugido de casa e não havia comido muita coisa, precisava poupar dinheiro para caso seu plano acabasse mal, por isso esteve absurdamente enjoada nesses dias de fuga. A adrenalina junto com o gosto amargo da traição, a fizeram ficar doente.

Seu olhar foi atraído para a entrada do lugar assim que a porta abriu, por ela passou um homem de meia idade, ela simples sabia que aquele era seu pai.
— Chefe — o policial saudou o mais velho e indicou com a cabeça na direção da menina.
Charlie olhou confuso para a jovem que parecia mais nova do que sua filha, mas seu olhar de policial não pôde deixar de ver pequenos detalhes. Ela estava fugindo, o olhar apavorado em seu rosto dizia isso, com todas as letras possíveis. Sua postura mudou para algo profissional e indicou que a jovem o seguisse. Davina não perdeu tempo e logo estava dentro da sala do homem.
Era um escritório pequeno e simples, olhou curiosa para a foto de uma jovem com cabelos castanhos, ela sorria suavemente ao lado do homem mais velho.
— Essa é minha filha, Bella — Charlie falou ao notar o olhar da jovem. Os olhos verdes da jovem focaram em seus castanhos e ela respirou fundo.
Como diria que ele não era pai apenas de uma jovem? E se ele lhe rejeitasse?
— Ela é linda — Davina comentou apertando a mão nervosamente e recebeu um aceno do mais velho.
— Então vamos lá mocinha, qual o seu nome? — o chefe de polícia perguntou começando a digitar no computador, mas estancou ao ouvir as palavras que saíram da boca da menina.
— Davina Claire Swan.
  — Perdão? Acho que não entendi — Charlie falou surpreso. Aquele formigamento dentro de si começou a agitar, aquela sensação que sempre o fazia tomar as decisões certas estava inquieta.
  — Sei que essa não é a melhor forma de descobrir que se é pai, mas minha mãe escondeu tudo de mim e quando ela morreu, a pessoa que tomou conta de mim falou que não sabia de outro parente. Eu descobri tudo e se você quiser um teste de DNA, eu aceito... — a menina falava tudo de uma vez, Charlie apenas a encarava quase em choque. Jamais imaginou que algo assim aconteceria com ele.
  Uma filha? Como?
  Novamente aquela inquietação. Ele entendeu, o que quer que fosse aquela intuição que ele tinha, ou poder, chame como quiser, queria que ele confiasse nela. E como sempre, ele seguiu aquela sensação.
  — Calma. Eu acredito em você — falou agarrando a mão dela.
  Um choque passou por ambos com o toque. A mesma sensação que sentiu no dia da morte de seus pais veio muito mais forte e ele arfou, Davina arregalou os olhos ao sentir a poderosa magia envolta de seu pai, chegava a ser incrível.
  Poder irradiava de ambos, como se finalmente algo que estava faltando estivesse finalmente em ordem.
  — O que foi isso? — Charlie questionou assim que tudo passou e viu a jovem suspirar.
  — Bem, você acredita em magia?