Capítulo Quarenta e Sete

15 3 0
                                    

Não sabia o que iria acontecer. Estava pensando que aquela voz hipnotizante não teria efeito sobre si, porém, sentiu sua própria vontade o abandonando e algo maior, mais pesado e denso ser colocado no lugar. Parecia-se com óleo derramado na água, forçando um espaço. Até que só havia esta vontade e a voz gritante em sua cabeça: Use-a, use-a, use-a!

E a faca já estava na sua mão, seus dedos obedeceram ao comando antes que pudesse pensar um protesto, sua mente não tinha mais o controle necessário.

Apontou a adaga para seu coração e a enfiou no peito.

Sentiu sua pele rasgar, mas depois disso... Nada.

Não houve sangue, nem dor. Apenas a faca em seu peito.

Todos olhavam para a cena abismados. O garoto-sereia ao seu lado estava ficando com as orelhas vermelhas de raiva. E ele abriu a boca para falar. Joaquim teve certeza de que ele gritaria e não usaria a voz sedutora de novo. Ele esperava diversão, mas Joaquim estava atrapalhando isto por ser quem era, por ter o impasse entre a vida e a morte.

Antes que pudesse, de fato, expressar sua raiva, o pirata tossiu e cuspiu para o lado uma vez, duas, três vezes antes de se agachar e ter espasmos enquanto vomitava. Livre, Joaquim se afastou dele para que seu vomito não o tocasse. Os espasmos pioraram, parecia que havia um ser dentro dele que queria se libertar e precisava rasgar seu corpo, que era sua jaula. A água formava uma gigantesca e escura e fétida poça ao seu redor, encharcado suas roupas e suas botas. O sangue e a água se misturavam até Joaquim perceber que havia um cheiro a mais: Sal.

Era água do mar que saia de dentro do pirata, e parecia não ter fim. Até que ele finalmente entendeu: o mestiço estava se afogando em terra.

— O que está acontecendo? — Gritaram os piratas, divididos entre manter os prisioneiros ou ajudar seu comandante.

Seus pensamentos, entretanto, estavam distantes daquilo, ele pensava em como era possível que a lâmina estava enterrada completamente em seu peito neste momento e não estava morrendo. Quem estava morrendo era o homem que sequer estava ferido. Imediatamente, se lembrou da casa na floresta, da bruxa querendo matá-lo e de como saiu ileso.

Os olhos de Érico cresceram e ele estava com a boca aberta. Seria uma cena hilária se ele não se mostrasse completamente assustado. Foi isso e a expressão confusa de Lipe que o fez murchar por dentro. Saberia que haveria um momento que haveria de contar o que aconteceu, de tentar explicar mesmo sem saber como, quem ele era. O momento chegara, mas sua coragem sumira.

Não conseguia encarar seus companheiros. Era um dos motivos pela qual escolheu manter segredo: O medo deles.

Medo deles para com ele.

Como poderia deixar que Érico o olhasse daquela forma quando, há segundos, ele olhava para ele enquanto chorava de pavor, amedrontado com a ideia de que ele morreria. Sem som, sua boca se moveu de novo.

Desculpe.

Achou que eram estas as palavras que devia a Lipe e a Érico. A pressão em seu peito aumentou quando Érico desviou o olhar. Lipe, entretanto, ainda o olhava.

— Joaquim...

E então ele gritou. Um grito que cortou o ar e atravessou as ondas, deixando com que todos ficassem aturdidos. O homem que o segurava havia atirado em suas costas. Um golpe por trás.

A raiva o preencheu por completo e ele pegou a faca que estava em seu peito, sua mão que ainda estava boa esticou para trás e então, a lançou, acertando no olho do homem, que caiu de joelho e depois tombou para o lado. Sem apoio, Lipe caiu, e dessa vez, estava quieto. A mulher que segurava Tayson saiu do chão de repente, com um grito agudo e foi lançada de costas no patilhão, a fazendo desmaiar.

Coroa, Flechas e Correntes (Romance Gay)Where stories live. Discover now