Apenas um cochilo da tarde

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Arturo saiu da escola depois do meio-dia. No portão da saída os alunos se juntavam nos seus grupinhos, um em cada canto. Ele, porém, não fazia parte de grupinho nenhum, deu tchau para as poucas pessoas com quem conversava e foi atravessar a rua enquanto esperava os carros darem a oportunidade.

— Oi. — Alice parou do seu lado.

— Oi. — Ele respondeu, olhando para ela e cruzando os braços.

— Você é bom em química né? — Ela perguntou com um meio-sorriso. — Poderia me ensinar algum dia desses, eu posso pagar. Tipo uma recuperação... preciso melhorar minhas notas.

— Não só para química né. — Arturo respondeu com uma expressão brincalhona, mas não foi o que Alice interpretou.

— Não sou burra também...

— Não quis dizer que é! — Ele emendou no mesmo instante. — Só que... Química é o menor dos problemas, eu posso te ajudar, mas se você não se esforçar não vai adiantar muito. No fim do semestre a prova quem faz não sou eu, entende?

— Mas os trabalhos e atividades poderiam ser? — Ela perguntou segurando no braço de Arturo, o sorriso malicioso no rosto, então se inclinou para frente e lhe deu um beijo na bochecha. — Pensa nisso. — Disse, deslizando os dedos acima no braço de Arturo até a ponta dos indicadores chegarem por baixo da camisa, nas axilas dele.

Arturo então ficou travado feito uma rocha. Alice o soltou e sorrindo foi embora para o grupo de meninas do qual fazia parte. Ele finalmente atravessou a rua, sem jeito, com a mochila na frente do corpo, tentando esconder a maturidade a flor da pele.

***

Arturo foi até o ponto de ônibus, pela calçada como as pessoas sempre faziam. Mas chegando lá, enquanto esperava o ônibus, pensou em ir à lojinha da Dona Dida.

Teve que retornar, mas optou por cortar caminho por uma viela em um quarteirão, por onde os estudantes subiam até o ponto de ônibus, para poder fumar escondidos das viaturas escolares. Como era de esperar, ali estavam os fumantes e o cheiro de maconha e cigarros.

Foi na metade do caminho, passando rápido e sem encarar ninguém, que alguém encarou ele.

Eae mané. — A voz era familiar. Arturo pensou em continuar andando, pensou em correr. Invés disto ele parou. — Tu mesmo otário, chega aí.

Virou-se olhando o grupinho de maloqueiros, e entre eles estava Caiam.

— Deixa eu te passar umas ideia, brother. — Caiam era o valentão da escola, cheio de marra, com mais músculos que cérebro, estava usando uma camiseta com os heróis na usina nuclear de Angra que ele havia transformado em regata, mas os cortes eram tortos. — A Alice não é pro teu bico de passarinho não.

— Tá bom. — Arturo respondeu sem querer caçar encrenca. Ele era sozinho ali, mas nem sempre fora assim. O seu melhor (e único) amigo havia sido transferido no ano anterior. O motivo era Caiam, a família de Jean não queria correr riscos e Caiam era um risco muito grande.

— Então dá próxima vez que ela vier atrás de você, fala pra ela vir pedir as coisas pra mim, eu sei do que ela precisa! — Caiam disse segurando o que tinha no meio das pernas, olhando para os amigos do grupinho. Todos pareceram gostar da brincadeira, riram alto.

— Só que não sabe. — Arturo disparou sem se conter ou pensar no que estava fazendo, apenar viu uma oportunidade. — Ela precisa de notas boas. E as suas são uma merda!

O grupinho fez um som de zombaria com Caiam, que enrubesceu. Com isso Arturo se virou e voltou a andar. Caiam não aceitou o desaforo. No mesmo instante partiu para cima de Arturo que, de costas, nada viu.

O Herdeiro; A ascensão das trevasWhere stories live. Discover now