A cúpula sob a montanha

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Jasper viu as paredes do universo se erguerem ao seu redor quando deu o primeiro passo. Suas roupas, a camisa e calça social, se apertaram no seu corpo quando saiu da dobra e então um sobretudo de couro despencou das suas costas, os braços estavam cobertos pelas mangas grossas e na cintura um cinto com uma espada curta surgira. Suas calças lisas e cobertas com um saiote de lã trançada até o meio de sua coxa, o peitoral ostentava um colete de proteção com o símbolo dos Miswl. Ordem de magos a qual ele liderava com o título de Misewl.

Na sua frente à porta foi aberta pelo seu simples pensamento. Era uma pesada porta de ligas metálicas brilhantes, cravejada em pedras preciosas pelas bordas, mas o real valor daquilo tudo estava na impenetrabilidade oferecida, o coração da cidade branca era aquela cúpula no topo da montanha, onde descansavam eternamente os três anciões.

A porta dava espaço para um salão oval sem nada além de um púlpito em mármore no centro e cinco tronos dispostos ao redor do salão em meia-lua, como se fosse uma câmara de interrogatórios. Dos cinco tronos apenas três estavam ocupados, os outros dois mostravam sinais de abandono, empoeirados e despidos de toda glória, um deles estava trincado e lascado.

Jasper caminhou até o púlpito, olhando as paredes de mármore branco, tal qual os tronos. Exceto pelo chão, que era um círculo de vidro, revelando a bocarra da montanha, para seu interior aonde a luz sequer chegava. A luz jamais alcançara o final, pois lá há apenas treva e perdição. Pensou e sentiu um calafrio ao imaginar o que havia enterrado ali, então levantou a cabeça para os anciões.

— Jasper. — O ancião Zakyl disse erguendo sua cabeça e olhando para o Misewl. — Tão cedo sua visita, aconteceu algo... terrível.

Se for ler minha mente, faça-o de uma vez. Jasper pensou. Os anciões eram os primeiros seres a pisarem no mundo e, se as lendas fossem reais, seriam os últimos. Seus poderes eram imensuráveis e o que quisessem podiam fazer, do material ao imaterial podiam moldar a própria realidade e destruí-la. Contar novidades para seres como aqueles era a mesma cosia que um bardo ensinar um lenhador como usar um machado. Mesmo assim, ali estava Jasper, porque no fim os anciões podiam dispor de reservas praticamente infinitas de poder, mas evitavam interferir.

Então ele contou para os três anciões a história que aprendera. Explicou o que viu e a energia que sentiu. Aquela fração residual era muitas vezes o poder total de muitos habitantes de Ipeiros juntos.

— Se o garoto ainda está mergulhado na ignorância, assim continuará. Um supervisor deve bastar, para que ele não toque em mais nada inapropriado. Com o tempo a memória desse evento se tornará uma lembrança fraca e ele viverá e morrerá entre os humanos. — Hasgyz sugeriu. — E assim os problemas estão resolvidos.

— A simplicidade não é uma opção aqui, senhor. — Jasper completou. — A treva que os senhores rechaçaram ciclos atrás está se fortificando, sabemos disso por conta de um aumento nas movimentações de fronteira e crimes negros. Esse garoto é um caminho para essa guerra. A paz duradoura está por um fio e alguém com esse poder pode desequilibrar a balança contra nós.

— Um fio bem resistente. Tempo não nos falta, com toda certeza podemos esperar uma vida humana...

— Com respeito, mas falta! — Jasper disse por cima da voz de Tridall, o terceiro ancião. — Odeio a ideia, mas temos de agir. Peço a autorização...

— É o caminho da escuridão este que deseja? E se tivesse a autorização desta cúpula, que glória teria em matar uma criança? Mesmo certo se trouxer consciência para o garoto de suas habilidades e não o destruir, o que seria então? — Zakyl ponderou. — Esta cúpula não autorizará que nenhuma ação seja tomada além de observar e aprender.

— Mantenha o garoto sob vigia pelo resto de sua vida. Haverá de encontrar prova definitiva nos ciclos por vir. — Tridall disse olhando para os outros dois. — E se conseguir provar que o que diz é verdade, então essa cúpula reconsiderará a proposta, mas só então. Agora vá!

Jasper fez que sim com a cabeça com uma curta reverência. Então se virou e saiu deixando os anciões para trás.

Em sua mente deixou-se furioso com a resolução, esperava ter que discutir com Darttis sobre o desfecho que ela queria evitar, sobre a morte do garoto. Ela pensou que eles iriam querer executá-lo, mas eles querem poupá-lo. Os anciões não caminhavam mais entre luz e treva, eram apenas luz. Incapazes de tomar decisões cinzas, por vezes cabia a Jasper tomar as decisões por conta própria e torcer que em sua melhor capacidade fossem decisões corretas, mas mesmo com todo o poder que tinha era ainda falho, era tão mortal como os demais. E todas as escolhas tinham consequências, para o bem e para o mal.

O Herdeiro; A ascensão das trevasWhere stories live. Discover now