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Giovanna Antonelli

O mundo inteiro é hipócrita, e claro que Alexandre Nero não seria diferente.

Sua cara de espanto me trouxe contentamento até perceber o quanto havia ficado chocado com o fato de eu possuir um escravo. Pensei que se admiraria, claro, achei inclusive que fosse dar mais uma de ciumento, mas o silêncio absoluto e as caretas de desaprovação que fez me deixaram puta da vida. Agiu como se fosse a coisa mais improvável do mundo.

Por quê?

Por que sou uma mulher? Por que sou mulher e tenho um escravo? Seria engraçado se não fosse trágico, não?

Enquanto a maioria das mulheres se fazem de coitadinhas, prefiro mostrar a minha capacidade e fazer os preconceituosos engolirem cada pedaço do próprio ego.

Quando retornei à CMG naquela tarde, sim, cheguei no meio da tarde por culpa de uma equipe de pedreiros sem noção, que construiu uma casa do jeito que quis, e o engenheiro responsável não teve a competência de compreender pontos decisivos do projeto que liberei pessoalmente, ou seja, tudo deu em merda e quem se ferrou fui eu, Rodrigo estava sentado à mesa grande na companhia do Alexandre Nero e do Eddy, o rapaz do departamento de desenvolvimento que foi mandado pelo Sr. Gandia para nos ajudar no projeto da presidência.

Já estava absolutamente cansada, mas o trabalho não podia ter fim. Tratei de pegar uma xícara generosa de café antes de começar a me concentrar. Estava disposta a ligar o meu lado extremamente profissional, portanto ignorei todas as olhadas de Alexandre e, com muito custo, iniciamos a base do projeto já utilizando o programa, que ia sendo adaptado pelo Eddy com bastante competência. Gostei dele, por sinal. Era jovem, magrinho, alto, usava óculos; típico nerd que passa todas as noites de sábado em frente ao computador. Se me dissesse que era virgem, eu acreditaria. Mas o cara era competente, inteligente e esperto. Só isso me basta.

Belinda entrou na sala umas duzentas vezes, entregando papéis e mais papéis pra Alexandre. Falava baixinho e recebia novas ordens dele que, por sua vez, tinha a grande capacidade de fingir que nada havia acontecido. Ela me ignorou totalmente, a vadia nem olhou para a minha cara. Ainda bem, pois sequer me dei o trabalho de levar sua presença em consideração.

Tivemos a visita ilustre da Ana Vitória. Veio com uma conversinha de que queria saber como estávamos indo com o projeto, porém senti que sua necessidade vital era de dar uma bela espiada em Alexandre, deixando claro como água que seu voto seria para ele. Eu tinha mais o que fazer além de fingir ser simpática e atrasar ainda mais o projeto só para recebê-la bem, então deixei Alexandre responsável por lhe contar como tinha sido a nossa primeira semana. Claro que ele escondeu noventa por cento do que nos aconteceu. Se tudo fosse narrado certamente daria um livro, e as coisas mal haviam começado.

Liberei os garotos às seis e meia, deixando muita tarefa de casa para eles. Eu também teria muito que fazer no fim de semana, embora minha vontade fosse de jogar tudo para o alto,para quê tanto trabalho se a desgraçada votaria no Alexandre? Nem preciso acrescentar o quanto aquilo me deixava possessa. Só me restava acreditar no bom senso do restante da presidência, o que não era tão reconfortante assim. Não acredito no bom senso de ninguém.

Nunca funciono direito nas sextas à noite, por isso fui guardando as minhas coisas, preparando-me para ir embora mais cedo. Liguei para o Jaime sob os olhares furtivos de Alexandre, mas ele ainda estava em casa. Prometeu que chegaria em alguns minutos, porém que podia se atrasar por causa do trânsito que sempre deixava a cidade parada àquela hora.

Desliguei o telefone, peguei uma pasta, a minha bolsa e murmurei um "boa noite" bem fraco para Alexandre. Nem parei para olhá-lo.

- É incrível como, sempre que damos um passo à frente, acabamos dando dois para trás - falou assim que alcancei a maçaneta.

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