Era Real Pra Mim

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Alguns sentimentos acabam rápido demais, enquanto alguns demoram muito tempo para acabar ou até mesmo acostumar. Sinceramente, não sei qual é pior.

Depois de um banho quente e pouco demorado, Yok saiu do banheiro e para sua surpresa encontrou Ayan que já estava dormindo aconchegado no canto da cama, deixando assim o espaço para o moreno deitar-se ao seu lado, mas ele não deitou de imediato.
O menor havia vestido roupas que escondiam suas marcas espalhadas pelo corpo. Não importa o quão quente elas sejam, ele teria que usá-las.

Yok estava pensativo demais aquela madrugada e se não adormecesse logo, em apenas algumas horas veria o dia amanhecer pela varanda do quarto de Aye, que foi para onde caminhou depois que saiu do banho. A madrugada foi recebida com chuvas fracas e ventos calmos, e Yok foi recebido com pensamentos confusos, lembranças ruins e momentos que queria ter o poder de apagá-los.

— No final disso tudo, você vai embora como o Dan foi, e isso vai doer, assim como doeu. Por isso você tem que entender que a gente não pode passar disso, baixinho. — ele olhava Ayan dormir profundamente enquanto suas palavras saiam num tom de voz audível apenas para si. Seus pensamentos sobre o garoto o matavam por dentro, consumindo cada célula de seu corpo, tirando sua paz e seu fôlego, o ar de seus pulmões, esmagando seu peito, o dilacerando por dentro, era torturante. — Espero mesmo que você entenda o porquê de eu não falar sobre o que sinto. Pessoas como eu não ficam com quem querem. Tem uma música que se parece um pouco com isso que está acontecendo agora. Anjos como você não podem voar ao inferno comigo... e mesmo que pudessem, eu não deixaria, seria egoísmo da minha parte...

Os ventos que estavam calmos lá fora começavam a ficar mais fortes e furiosos, também começavam a agitar as árvores de forma impiedosa, balançando-as de um lado para o outro, parecendo que a qualquer momento elas seriam facilmente arrancadas do chão por suas raizes e a chuva se intensificava mais com o passar dos minutos. Uma tempestade maior estava se formando e prestes a cair aquela hora da madrugada. O moreno estava vidrado no céu, mas sem prestar muita atenção no que estava à sua frente até o barulho alto do trovão ecoar pelo quarto e a luz do relâmpago o iluminar, fazendo Yok voltar para o mundo real onde virou-se para voltar para a cama e viu Ayan tremendo, aparentemente com frio.

— Não tem mesmo nada que eu possa fazer pra ficar longe de você? Por que toda vez que eu tento você parece me chamar de novo e eu sempre acabo voltando...?

O mais velho voltou para a cama e se pôs abaixo da coberta, assim chegando mais perto do menor e podendo perceber uma lágrima que escorria lentamente e de forma discreta pelo canto de seu olho. Ayan também segurava forte o lençol que cobria seu peito. Ele não estava com frio, algo em sua mente estava o destruindo, o matando naquela madrugada, mas o quê? Yok enxugou a gota de água do rosto do mais baixo e o puxou gentilmente para um abraço quente e, sem muita dificuldade, o corpo do garoto estava junto ao seu, de novo.

— O que está acontecendo com você, baixinho? Pesadelo?

Ayan estava deitado com a cabeça no ombro de Yok, que tinha a sua encostada na do mesmo. Ele também estava segurando a sua mão que antes apertava a coberta.

— Seu cheiro é bom — disse o moreno depois de sentir o cheiro dos cabelos de Ayan. — Seu gosto. Seu beijo, tudo é tão bom. Seu sorriso é bonito. Seus olhos puxados. Seus cabelos... Você... Por que você apareceu agora? Queria ter te conhecido antes, queria que tivesse sido você antes dele. Queria que tivesse visto como eu era. E além de tudo, queria que tivesse visto que seria muito mais fácil pra você se relacionar com alguém como eu.

É doloroso quando paramos para pensar como éramos uma pessoa totalmente diferente antes dos traumas causados por alguém. Quem mais falava sobre seus sentimentos, uma hora cansou de falar. Quem tinha estrelas no olhar, uma hora as perdeu e nunca mais encontrou. A pessoa do sorriso mais radiante, aos poucos parou de sorrir. Os olhares risinhos, os sorrisos canteiros, uma hora pararam de aparecer. O amor tem a capacidade de apagar seu brilho, porém, em outros casos, o amor pode reacendê-lo, mas esteja sempre ciente, só o amor não é suficiente.

Yok fechou seus olhos para dormir e enquanto uma tempestade começava com força total lá fora, outra chegava ao fim dentro do peito do rapaz. Tudo que ele precisava para ficar bem era apenas fechar os olhos perto de Ayan para tudo simplesmente parar, não importa o quão turbulento esteja lá dentro. A música daquela madrugada foi o som da chuva forte e dos trovões estrondosos. Não era nada calma, mas ajudou o moreno a pegar no sono mais rápido do que normalmente aconteceria. Ambos ali não tiveram muitas horas de sono, mas o tempo de Yok foi muito mais curto, pois começou a dormir já era quase de manhã

Quando os primeiros clarões do dia atravessaram as cortinas do quarto de Ayan, os pingos de chuva ainda caiam lá fora e o céu estava cinzento. Para a sorte do menor, ele não teria que explicar o porquê de suas roupas quentes, estava frio suficiente para ser necessário usá-las. Aye estava enrolado e com o braço envolvido na cintura de Yok, que também o abraçava. À noite e a madrugada passada foram marcadas por loucuras e surpresas. No início, tristeza e conflitos, mas tudo acabou bem e o dia frio amanheceu com dois garotos aconchegados um ao outro, esquecendo o caos que ambos ali estavam.

Ayan começará a acordar quando notou a pessoa que dormia ao seu lado e um sorriso ladino surgiu despercebido em seus lábios. Aquele rapaz estava tão lindo enquanto dormia, realmente muito bonito. Isso era cor para os olhos tristonhos de Ayan numa manhã tão cinzenta e sem brilho.

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