Viva o Rei | livro

PELA CABEÇA DO REI

ℱlores começam a desabrochar em árvores que antes se seguravam com galhos retorcidos e se encolhiam com medo do frio do deserto e exposição completa de seu corpo, agora elas podem se sentir seguras novamente com suas companheiras que a cobriam e sempre traziam atenção com suas cores e cheiros. O mesmo acontece no rio que divide nosso mundo, que depois de tanto tempo parado, começa a navegar por caminhos sem rumo, levando consigo às tão famosas ninféias amarelas, o símbolo de Clastia e o maior ponto de apreciação de Bjertan.

A primavera deixa claro sua chegada no reino. O povo acorda e abre a janela  percebendo que o ciclo passado os deixou, dando lugar a novos ares e cores que animam os indispostos a iniciar sua rotina de trabalho com mais tranquilidade. Algumas crianças saem correndo para lugares diferentes, provavelmente umas para brincar e outras para trabalhar. Keki saiam de suas casas para assim ganhar sua renda única que sustente sua matilha por um bom tempo. É perceptível que alguns homens e mulheres robustos andam com equipamentos pesados, provavelmente atrás do ganha-pão do dia bancar a si e sua matilha por bons meses. Enquanto do outro lado, ômegas começam a levantar panos tirando todos os cobertores, preparando para lavá-los e guardar até o próximo inverno, ao mesmo tempo que apagam as lareiras e se dobram para alimentar seus filhos

Vago em meus pensamentos ao notar que mesmo de longe, conseguia saber exatamente a rotina de cada um. Todos podem ter uma forma única de fazer seus deveres, mas é uma rotina mundial todos seguirem o mesmo modelo. Não tem como fugir, é como todos devem ser, é quase impossível sair desse círculo. Estamos presos em uma bolha.

Apesar de tudo exibo um sorriso contente. Eu amava aquele lugar, por simplesmente poder ser eu mesmo, sem ter que fingir ser quem eu não sou para que as pessoas não possam escorar e abusar de mim. Eu poderia relaxar e botar as coisas em ordem na minha cabeça. Aqui, eu sentia ser um Élio o qual eu podia amar.

Um híbrido descendente direto do fim, Daras, nunca foi fácil ser um. No mundo, o início se torna prioridade e o desejo de muitos, é exaltado, idolatrado e empurrado ao glamour. Kokus sempre foram um belo começo, enquanto Daras eternamente se tornaram um amargo fim. A simbologia por trás dos daras criou uma armadura defensiva em todo continente dos híbridos, ao ponto que de simples aliados do mesmo convívio, um campo de guerra para injustiças e desigualdades foi fundado e apoiado por todas divisões da pirâmide social.

Ser primogênito e rei de um povoado que nasce com a idealização de que o perfeito salvador só pode ser um Keki ou um Koku, se torna uma tarefa extremamente desesperadora no primórdio de sua ideia, contudo minha situação se multiplica ao ser um Dara na realidade criada para um Keki. Assim, as pessoas acabam cobrando mais de você, cobram algo que nem mesmo elas possam fazer, cobram contra argumentos melhores, e quando você não consegue aquilo, elas simplesmente jogam tudo em seu rosto mostrando a verdade, mostrando seu verdadeiro destino.

É impossível querer a vida quando se opõe a esperança e qualquer desejo que costumam ter. Uma hora o antagonismo da esperança, um fervor diferente vai acender no seu peito, mas será diferente dos demais. A vontade não te impulsiona para frente por mais que lute contra ela, mas sim te empurra há uma explosão que vai começar a surgir em seu peito, uma chama queimando cada centro de seu coração até não restar nada, somente um corpo vazio enterrado a sete palmos do chão. Contudo, apesar do cisma em seu sonho estranho, ele nunca poderá ser cumprido, senão tudo se destruirá, todo o jogo. Você é o rei, é o controle de tudo, e é quem domina a jogada, se você explode, todos perdem seu rumo.

Já é um costume vir aqui quando me sentia um pouco aflito ou simplesmente com uma agonia no peito e uma vontade de chorar, e inesperadamente, eu conseguia me acalmar aqui. Os sentimentos podem ser sempre similares, mas os motivos nunca são os mesmos. Dessa vez, no entanto, é sobre um momento único nunca antes sentido por mim nessa vida.