Capítulo 56 :

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Toda aquela rotina de manter uma vida dupla de inquilino era cansativa, minha rotina era basicamente acordar cedo, antes mesmo até de Kauane. Sair do seu lado e deixar o calor do seu corpo pela manhã era um sacrifício e uma batalha diária, tomar um banho que me despertasse e resistir contra a tentação de me aconchegar novamente na cama. Na surdina ia na cozinha pegar algo que pelo menos enganava meu estômago e dava o fora dali, na maioria das vezes ficava sentado na calçada esperando dar a hora de ir bater em sua porta com minha melhor cara de sínico, sua mãe sempre me recebia com um sorriso empolgado e simpático, me obrigava a tomar café da manhã com ela e me tratava tão bem que na maioria das vezes pesava minha consciência de estar mentindo para uma pessoa tão boa como ela. Dei minha última mordida no meu sanduíche de geleia e me levantei da calçada

- o que eu falaria pra ela? - bati minha calça a fim de me limpar, a calçada estava imunda - Olá, durmo com sua filha toda noite e venho mentindo para você esse tempo todo, eu sou um sínico mesmo né?

Enquanto andava em direção à porta de Kauane, a cidade parecia despertar aos poucos. As luzes dos postes ainda estavam acesas, as ruas vazias e silenciosas, apenas alguns pássaros começavam a cantar. A amanhã trazia consigo uma sensação de calma e serenidade

respirei fundo e bati de leve, esperando que sua mãe logo aparecesse. Ela abriu a porta com um sorriso gentil, seus olhos brilhando de alegria por me ver. Parte de mim adorava receber seu carinho e atenção, mas a outra parte se aprisionava no fato de toda manhã mentir para ela e para seu sorriso dócil e olhos tão facilmente amáveis

- Bom dia, Lucas - sorri amigavelmente - Entre, daqui a pouco Kauane tá descendo

Adentrei a casa que conhecia de olhos fechados e calmamente me sentei a mesa a espera de Kauane

- Kauane te falou da festa desse final de semana? - ela deu um gole em seu café, suas sobrancelhas se levantaram em choque

- fico surpresa por ela querer ir em uma, você vai?

- Sim, mas só porque ela tá me obrigando - sua risada saiu abafada pela caneca

- típico dela, fico feliz por ela ter alguém como você por perto - sorri diante de seu comentário, ter sua aprovação era bom demais de ser ouvido

- Eu não tenho tanta certeza - ela se levantou e foi em direção a pia mas antes parou do meu lado

- Mas eu tenho, por isso que ela gosta tanto de você - por fim bagunçou meu cabelo e se afastou. Enquanto a esperava, o tempo passava rápido. Não demorou muito para ouvir Kauane descer as escadas cantarolando empolgada, provavelmente sua empolgação se devia pelo final de semana

- Tava te procurando - Ela abriu um enorme sorriso, daqueles que lhe daria câimbra se o mantivesse mais tempo no rosto e eu morreria só para vê lá sorrir assim para mim pelo resto da vida

- aqui estou eu, vamos? - me levantei da cadeira nem um pouco animado para ir a escola, estar lá fisicamente era entediante antes pelo menos eu perambulava pela escola e espionava as pessoas, o que tornava minha estadia lá tolerável e minha vida mais empolgante era uma ótima distração para fugir da minha vida real. Passei o braço pelo ombros de Kauane, nós despedimos de sua mãe e saímos rumo a escola

Andamos em silêncio apenas desfrutando da companhia um do outro, então sua voz quebrou o silêncio determinada

- foda-se, vamos matar aula - não pude não conter um sorriso, a maneira como era estranhamente espontâneo era encantadora

- Quer mesmo fazer isso? - tão pouco estava me lixando, ela parecia ter lido meus pensamentos nesse exato momento. Se ela falasse "vamos se jogar de uma ponte" eu provavelmente iria atrás, sem relutância ou resistência. Sorri para a fofa criatura em meu braço, contente pelo seu espírito de rebeldia de hoje

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