30 - O mundo é escuridão, não você!

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— Ainda não tô acreditando, Max. Você faz faculdade no cefet! Cara, que legal! Você é muito inteligente, Max, o que você come pra ser assim? Brócolis? Jiló? Uva passa? Quando eu crescer eu quero ser igual a você.

Eu já estava quase abrindo o cardápio e mostrando bilhões de pessoas mais interessantes pra ele querer imitar.

— Ah, você também estuda lá, cara. — eu minimizei. — Você também é nerd pra caramba.

— Cara, ainda não caiu a ficha. — Davi gesticulava como se fosse surdo e falasse com as mãos. — Que medo bobo, né? A gente escondendo as coisas um do outro sem motivo. Só achei uma pena que você não é da Nasa. Essa foi uma pequena decepção. 

— Quem dera se eu fosse um agente secreto, kkk.

E, foi assim, querido amigo, que eu contei tintim por tintim de toda a minha estrada até aqui, como eu fui parar no Cefet, como eu caí de paraquedas no curso de engenharia, como eu me sentia triste, como minha mãe era doida e como eu comecei a escrever cartas pro exército anônimo.

A gente tinha saído do templo feito de estrelas e tava caminhando de volta pra casa, com as luzes dos postes iluminando nosso caminho. O medo de passar dois cara numa moto dizendo ¨passa o celular¨ era forte e real, por isso, em dias normais, eu nunca levava o moleque na casa dele. Ele morava no polo norte e eu, no polo sul só pra tu ter uma ideia de como era longe. Mas aquele dia não era um dia normal.

Antes da gente ir embora, Laion também queria ir comigo e escutar a fofoca que eu ia contar, mas infelizmente precisou urgente trocar as fraldas em casa e ficou choramingando.

— Mas é legal também ser um quase-engenheiro. — Davi coçou a cabeça. — Max, só fiquei em dúvida de uma coisa: essa semana eu fiquei no colégio até mais tarde montando as coisas pra feira e não te vi.

— É porque essa semana eu não fui. Eu fiquei escrevendo aquelas cartas, sabe. Contando pro exército anônimo todas as coisas que me deixam triste pra ver se elas saem da minha mente. Isso era tudo que eu conseguia pensar. Tô sem cabeça pra me concentrar em outra coisa. Só tô no cefet por enquanto. Eu decidi sair de lá. Sabe, eu vou dar um tempo pra resolver umas coisas aqui dentro.

— Mas como é que você pretende sair de lá, cara? Seus pais são meio brabos, pelo que você disse.

— Eu vou falar com a minha mãe, mas... — só a ideia de fazer isso me dava arrepios e minhas pernas tremiam que nem varetas.

— Mas o quê?

— Eu tenho medo. Ela vai pisar em mim. Ela é capaz até de chorar, fazer um drama pra me convencer a ficar naquele lugar, E eu sei que eu sou fraco e vou cair. Se isso não der certo ela vai pisar em mim. Sabe, Davi, era por isso que eu não queria contar a você tudo isso. É muito coisa pra você processar. Eu guardo muito escuridão aqui dentro. Às vezes, eu me sinto o pior ser humano do mundo e eu acho que são as outras pessoas que sempre sabem o que é melhor pra mim. Às vezes, eu acho que eu tenho que me submeter a vontade delas e continuar assim.

— Submeter, que palavra chique.

Eu confesso que no momento estava esperando uma resposta mais consoladora. Acho que Davi percebeu isso, porque olhou pro lado, pensando em algo menos inútil pra dizer.

— Max, sabe de uma coisa? Você tomou uma decisão. Isso é ótimo. Meu pai um dia me disse que crescer é saber decidir por si mesmo e aceitar as consequências das nossas ações.

— Eu não sei se eu tô preparado pra crescer. — eu desabafei. — É muita escuridão, Davi.

— Ah, vem cá, cara — Davi desistiu de falar e me abraçou. Às vezes, é tanta coisa pra dizer que só um abraço diz. O menino me embalou num abraço e, naquele momento, eu podia jurar que nossos corações eram dois sóis amarelos oferecendo brasas um pro outro para que nunca mais sentíssemos medo do escuro. — Fica assim, não, você não é o pior ser humano do mundo. Acredita em mim, o mundo é escuridão, não você.

Com carinho,

Max 

Eu não sei o nome do meu melhor amigoNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ