Capítulo 7

23 6 67
                                    

Pub de Rooster. Whitechapel, Londres, Inglaterra. Outubro de 2018

Lestrade não acreditava no que via. Algo digno dos filmes de ação que assistiu como passatempo em seu quarto aconchegante no último andar do prédio de Rudolf. Dessa vez não tinha pipoca, muito menos refrigerante.

Também não ficava apenas olhando a formação de um impasse mexicano.

No ambiente puído e maldito do velho pub, ninguém escondeu suas armas. De um lado, os recém-chegados. Uma dupla dinâmica com mais adrenalina e testosterona do que ele poderia contar. Os olhos e nariz vermelhos, pupilas dilatadas e cabelos bagunçados diziam-lhe muita coisa.

Nervosos, os dedos deles volta e meia tocavam o gatilho. Noor, Raheem, Cicatriz e o restante do grupo se entreolharam. Conhecia bem os sinais, passou muito tempo no submundo para entender a formação de uma aliança temporária em breves e míseros gestos.

— Rooster não está aqui, Karl... — Raheem manteve o tom de voz sério e tranquilo.

— Ele me vendeu passaportes inúteis!

Karl, o líder e mais ativo da dupla, jogou alguns documentos no chão. A poeira subiu e causou mais crises em Lestrade. Se continuasse daquela maneira, teria um ataque de espirros. Qualquer movimento em falso seria motivo para um banho de sangue.

Não queria isso. Já haviam derramado bastante sangue por uma única noite. Logo, aos pouquinhos, foi se esgueirando para os flancos do estabelecimento. Serpenteava as mesas, as cadeiras, escondendo-se por trás da estatura alta e as costas largas dos homens.

Tinha certeza que Noor usou sua visão periférica para observá-lo caminhar até uma porta-escotilha, localizada atrás do balcão. Porém, ela não fez nada.

— Um passaporte limpo serve para você ter uma nova vida. — Raheem pendeu a cabeça para o lado, perscrutando Karl da cabeça aos pés, desdém e desprezo gotejando em suas palavras. — Se você utiliza os mesmos canais e possuí o mesmo padrão de vida, a culpa não é dos documentos.

Karl grunhiu. Seu colega alargou um sorrisinho de canto de boca.

— Do que me adianta uma nova identidade se não posso fazer o que quero? — Ele gritou e gesticulou, sacudindo a arma que estava em sua mão na direção de todos. Foi engraçado ver marmanjos e uma dama agachando-se sutilmente, evitando a mira da arma. — Hein? Respondam!

Rindo por dentro, Lestrade teve muita força de vontade para não gargalhar no meio do impasse mexicano enquanto se esgueirava por trás do balcão. Segurou um pouco o nariz, para evitar fungar, e seguiu na ponta dos pés até a porta. Mochila na frente, completamente em silêncio.

Novamente sentiu um olhar de relance sob suas ações, desta vez de Raheem, mas o barman também não fez nada para o parar. Não duvidava que sua preocupação maior era Karl e seu amigo.

— Uma nova identidade é justamente isso, Karl. — Noor tomou as rédeas. — Um novo começo, uma nova vida. É abandonar o que deixou para trás e criar algo novo, do zero. — Por que parecia que ela falava por experiência? — Muitos matariam para ter essa oportunidade.

— Não conseguir fazer uma coisa que desejo não é vida...

— Diga isso para as centenas de trabalhadores que se lançam diariamente para sobreviver e que não possuem condições de fazer o que realmente desejam. — Noor o interrompeu e apontou para todos no salão. — Por que você acha que Raheem e eu trabalhamos nesse ramo?

Karl ponderou e até abaixou a arma por um breve instante.

— Para ser livre?

— Para que possamos viver em um local de forma livre, sem que nossos inimigos nos descubram, sem esperar que um dia o passado venha nos pegar. — Noor guardou sua arma no coldre de ombro e pegou o passaporte e outros documentos. — Você tem uma oportunidade, pegue-a.

O ChacalWhere stories live. Discover now