12 - Declínio

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— Pra onde você vai querer ir hoje? — Devon pergunta.

Estamos andando correndo pelo hospital. Devon insistiu em vir comigo hoje para conhecer o meu pai. Foi uma manhã um tanto estressante com a mãe dele, que não parou de encher a minha paciência. E sim, eu adoraria ir para outro lugar que não fosse um hospital, me lembrando todo santo dia que o meu pai ainda não acordou. Mesmo estando no melhor hospital do país, não houve nenhuma melhora significativa. Ele não responde a nada e, sinceramente, estou começando a perder as esperanças de que um dia ele acorde. Seria burrice jogar todos os meus sonhos e desejos na esperança de que um dia ele acorde? Será que eu só sou sonhadora demais? Acho que só sou uma filha que ama o pai e que faria qualquer coisa e se apegaría a qualquer coisa pela esperança. Mas esperança gera expectativa, e expectativa gera frustração, e isso gera tristeza, um ciclo vicioso do qual já estou muito bem acostumada, mas eu não queria estar.

— Não tenho muitos lugares onde eu possa ir para dizer a verdade. Eu costumava ir a um orfanato.  Eu era voluntária, mas faz tanto tempo isso. As crianças eram divertidas — dou de ombro.  

— Então, por que a gente não vai pra lá? — diz. Encaro seu rosto buscando zombaria, mas não encontro nada, parece estar falando sério.  

— Você não tem algo mais importante pra fazer do que ficar acompanhando, não? — zombo.  

— Eu tô falando sério, Nicole — seus olhos me olham com expectativa e eu tento não deixar minhas entranhas se revirarem como o meu nome sai dos seus lábios.  

— Ok, então. — Ele assente e então para de caminhar, mexendo no seu casaco como se estivesse procurando algo, e puxa de lá um envelope, colocando-o nas minhas mãos.  

— Tenho algo pra você, é um adiantamento do mês pelo seu ótimo trabalho — fico surpresa. Ele continua — As coisas com o meu avô estão indo bem. Hoje você mandou bem.

Acho que nunca fui tão elogiada em toda a minha vida por um trabalho, e olha que não preciso fazer esforço nenhum. O único que me tratou bem na família de Devon foi o avô, que hoje disse que adorou a minha torta, que fiz de manhã com a ajuda de Greta. A mãe dele, por outro lado, colocou defeito em tudo, mas enfim, eu não deveria ligar pra isso. É tudo uma farsa o que há entre mim e Devon, por mais que às vezes, quando estamos sozinhos, pareça que o mundo encolhe e só nós estamos aqui. Se torna difícil não me importar com sua presença.  

— Quem diria que estaria sendo paga para ser esposa de um herdeiro? — brinco, guardando o envelope de dinheiro na minha bolsa.  

— Só você mesmo.  

— Então a gente tem que ir logo e comprar algo para as crianças — comunico. Devon assente.

                               ◇

Depois que passamos em uma loja de brinquedos e eu gastei boa parte do dinheiro, porque não pude aceitar que Devon pagasse as coisas, aquilo já era demais. Ele só está sendo gentil, até demais. Não entendo o porquê dele querer vir visitar essas crianças. Talvez eu o tenha julgado mal e esteja apenas tentando enxergar o lado ruim dele por causa do jeito que o conhecemos. Talvez seja tudo mentira o que falam sobre ele, porque de jeito nenhum um cara mau vai deixar um bando de crianças pintar o seu rosto.

As crianças adoram os brinquedos e, como agradecimento, estão pintando os nossos rostos. Não sei como isso pode ser um agradecimento, mas só são crianças de 4 a 7 anos.

Acordo PerigosoWhere stories live. Discover now