Rabbit Run

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Cícero Gilmar Lopes

  Nordeste do Brasil, 1990.

 Um garoto está caído no chão de terra vermelha e fofa. Ele se levanta, limpa suas roupas da poeira e observa outros meninos se afastarem correndo. Do seu nariz ainda escorre um pouco de sangue. O nome dele é Jonas, é o que os adultos chamam de um garoto problema. Ele tem 14 anos, não está integrado na escola, tampouco em sua própria casa; é um menino em crise. Têm grande dificuldade em se comunicar com a maioria das pessoas, entre elas, seus pais. Não consegue fazer amigos, os professores o rejeitam e os garotos maiores, por uma razão incompreensível, o detestam e o perseguem. Hoje aconteceu de alguns garotos o emboscarem e lhe aplicarem uma tremenda surra. O pior é que ninguém o defendeu, não conseguiu cativar um só momento de preocupação entre os que assistiram ao massacre. Mas, Jonas é forte e não se abate. Não na presença dos outros.

Ele caminha na estrada de terra até chegar a sua casa perdida no meio da estrada e afastada da cidade. Na varanda ele vê seu pai, como sempre sentado em sua cadeira de balanço. Parece um velho cansado e triste, o garoto o considera um inútil. Nunca viu o pai numa atitude ativa, prática ou produtiva. Apesar de jovem, não tem nenhuma ocupação, parece um aposentado. Jonas passa por ele sem um cumprimento um sequer. Jonas detesta ser filho de quem é! Entra e a mãe vem ao seu encontro. A mãe vive angustiada, assustada com o coração saindo pela boca.

– Voce demorou – ela começa dizendo e percebe que o garoto está com hematomas.

– O que foi isso? Quem fez isso com você?

Jonas passa direto por ela sem lhe dar atenção. Abre a geladeira serve-se de um copo-d'água e em seguida entra em seu quarto. A mãe o segue e tenta obter alguma explicação do que aconteceu, mas, só o que consegue é ter a porta fechada em sua cara. De fora ela ainda insiste em dialogar ou mais correto afirmar segue em seu monólogo.

– Jonas, fico tão preocupada, filho! Não seria melhor que você deixasse a escola. Não seria melhor que não nos misturássemos com esse povo?

Jonas abre a porta e deixa escapar toda a sua revolta.

– Não! Não seria! Já não basta a gente viver escondido, nesse pântano! Não basta vocês nunca saírem para mostrar o nariz ao sol? Acham que isso que voces vivem é normal? Sabem por que eu apanho? Porque todos acham que pertenço a família monstro! Eu passo por esquisito, porque vocês são esquisitos!

Jonas pára seu protesto, quando percebe que lágrimas escorrem do rosto de sua assustada mãe, ele não suporta vê-la assim! Não outra alternativa senão fugir dalí! Nesses momentos em que o céu parece querer desabar em sua própria cabeça e um nó se forma em sua garganta, parecendo querer estrangulá-lo, ele se refugia em frente ao lago. Aqui se esquece de tudo, até de si próprio.

Jonas se sente um estrangeiro em sua comunidade, um estranho no ninho, um alienígena na terra. Hoje, Jonas irá descobrir que não é o único a se sentir assim.

Na outra margem ele avista a casa do estranho Sr. Harry, um americano que se mudou para a pacata Serra Grande, faz bem uns três anos. Três anos e até hoje o sujeito, também, não conseguiu se integrar à comunidade. Vive isolado como um ermitão. Na esperança de ter achado um igual, Jonas decide se aproximar da casa do Sr. Harry. Ele circunda o lago e com muito cuidado, espreitando-se nas sombras, rastejando e tomando todos os cuidados para não ser visto, ele se aproxima da janela do Sr. Harry. A casa é muito escura e ele não consegue ver nada do seu interior. E se ele entrasse?

Segundos separam a idéia do ato. Jonas continua se esgueirando pelas paredes até alcançar a porta de entrada, quando toca a maçaneta recebe um choque e tudo fica escuro.

Rabbit RunWhere stories live. Discover now