Roberto Meirelles

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- Você responde as perguntas que te fiz quando nos conhecemos e eu respondo as suas, na sequência. Simples assim - nao me incomodo em responder diretamente. Tanto fazia se ele era culpado ou inocente. Eu não iria perder aquele caso! - Lembre-se: suas respostas não alteram minha decisão de defendê-lo, Sr. Meireles.

- Só me diga porque me defender e então pode começar seu interrogatório.

- Todo advogado precisa de um grande caso. O senhor é o meu - solto na lata - Respondi sua pergunta ou quer que eu detalhe? - sou irônica. Não gostava que me dessem cartas para jogar. No meu jogo, eu daria as cartas....e da minha maneira.

- A senhora está dizendo q vai me usar? É isso que entendi? Você quer aparecer na TV as minhas custas? Sua intenção não é me defender e sim se promover. Pouco importa o que vai acontecer comigo! - não seguro a grosseria - De todo jeito VOCÊ fica famosa. Não vou ser seu brinquedo! Volto pra cadeia, mas não vou ser marionete de ninguém. Obrigado por me soltar. Tchau.

Levanto e vou dando passos firmes em direção a porta. O olhar dela era de quem não esperava tal reação.

- Pode sair daqui batendo os pés, Sr. Meirelles, mas é uma questão de dias para te jogarem novamente naquele buraco imundo - me levanto e caminho até a porta, onde ele está plantado - Sejamos francos: precisa de mim tanto quanto preciso do senhor e sabe por que? Nenhum advogado num raio de cem quilômetros vai aceitar defender você! - manipulo o sujeito - Sabe o que acontece depois disso? Indicam um defensor público que acabou de sair das fraldas e você é massacrado pela promotoria e por um júri popular. Resultado: o resto da sua nobre vida atrás das grades. Se é essa a sua visão de futuro, até logo, foi um prazer conhecê-lo - jogo alto ao manipular o cara. Se tinha algo em que eu era boa, essa coisa era o meu trabalho. Se não é, podemos recomeçar essa conversa, tomar um café e discutir qual será a nossa estratégia de defesa. A escolha é sua!

*Eu sabia que precisava dela. Odiava ser usado, mas era minha chance de provar inocência. Além do mais, ela era encantadora e foi franca comigo*

- Acho que me precipitei, Doutora. Não soube agradecer o que a senhora já fez por mim. Pensando bem, de alguma forma tem que receber seus honorários e q eles sejam com sua fama provando minha inocência. Mais uma vez me desculpe pelo modo como agi, a senhora só foi franca comigo e eu me exaltei. Permita q eu pague o café.

Fomos até a cafeteria que ficava na esquina do meu escritório, sentamos e pedimos café...ambos.

- Espero que agora esteja disposto a responder minhas perguntas. Devo advertir que é fundamental que você seja totalmente honesto comigo - jogo a bomba - Você matou aquelas mulheres e bebes? - encaro o sujeito e minha expressão é impassível. Não muda....aguardo pacientemente a confissão ou sua história, sem mover um único músculo.

- Você está louca? - Pergunto com cara de espanto - Lógico que não matei essas mulheres e bebês! A senhora sabe da minha ONG, luto para defender mulheres que não podem ter filhos. Perdi minha mulher grávida e sei a dor que isso provoca...jamais desejaria isso para alguém. Como a senhora quer me defender se pensa que matei? O monstro que fez isso não merece defesa - Fico agitado mas mantendo a postura. Bebo meu café em um único gole e falo:
- Acho que  não temos mais nada para conversar, doutora!

Toco seu braço com firmeza, o cara me olha extremamente irritado.

- Faz parte do meu trabalho perguntar. Não vamos levar isso pro lado pessoal, ok?! - ele ainda bufa. Peço com os olhos para que se acalme e permaneça onde está - Me conte sua história....onde estava quando a polícia te encontrou? Preciso que me conte tudo nos mínimos detalhes para que compreenda a sua versão - ele se acalma.
- Já pedi vista dos autos....vamos ver o que acham que tem contra você...sou toda ouvidos, Sr. Meireles.

*Ainda estou irritado mas me sento. Eu sabia que ela era a minha única esperança. Peço uma água e começo a contar calmamente*

- Bem Dra Milena, minha história aconteceu há 2 anos quando perdi minha esposa grávida em um acidente. Estava no mesmo veículo e, por causa dos ferimentos, não posso mais ter filhos. Desde então resolvi, ao invés de lamentar, proporcionar algum conforto para as pessoas que passam pela dor de não poder ser....pai e mãe. Fundei minha ONG e desde então levamos vários casais a descobrir a adoção, a buscar opções para a paternidade ou a fazerem tratamento psicológico para conviverem com a ideia de não mais poderem ter filhos biológicos.

*Tomo fôlego e continuo:
- Apareceu esse maluco que começou a assassinar mulheres grávidas da forma brutal como a senhora acompanha. O último assassinato foi próximo a ONG. Eu estava indo para lá quando fui preso. Desde então aguardo minha excreção pela sociedade, pois não tive oportunidade nenhuma de me defender. E é isso. Mais alguma coisa que posso lhe falar?

Ouço a história mas algo nela não fecha.
- Em que condições a polícia te encontrou? Estava simplesmente na rua a caminho da sua organização? Ou estava de carro?

- Parei meu carro há 2 quadras, estava andando e não estava portando arma, aliás, nem sei usar uma arma.

- Quando falo de armas não me refiro somente a armas de fogo, Sr. Meireles. Faca, adaga, uma chave de fenda que fosse....qualquer coisa que pudesse ser vista pela polícia como arma - aguardo sua resposta, mas não posso deixar de notar a ruga q se forma na testa dele. Inclino a cabeça para o lado, disposta a ouvi-lo.

- Na ONG temos facas e ferramentas, Doutora, mas só uso para as finalidades que elas são destinadas. Acabo ajudando os frequentadoras num conserto aqui outro ali, ajuda a aliviar a tristeza. Só me preocupo em ajudar as pessoas....Infelizmente minha ONG fica próxima ao local do último assassinato, mas não sei porque me pegaram.

Solto um suspiro....
- Certo.... - fechei o caderno onde fazia anotações e bebi o último gole de café...quase frio a essa altura - Pegarei os autos amanhã. Acho que podemos fazer um agendamento na quarta pela manhã, o que acha? - era noite de segunda-feira e a terça seria suficiente para fazer todo o tipo de análise necessária e falar com as pessoas certas.

Advogado do DiaboWhere stories live. Discover now