Guardiãs

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VALERIE TINHA UNS 30 ANOS. Era alta, de pernas e braços compridos.

Parecia-se muito com Lisa, embora fosse loura. Ambas eram longilíneas,

esguias e flexíveis. Lisa sabia enroscar-se nas cadeiras e nos cantos – e Valerie

também. Quando alguma de nós ficava perturbada e ia se encolher entre um

aquecedor e uma parede, atrás de uma banheira ou em outro lugar pequeno e

seguro, Valerie se enroscava toda e ia se sentar a seu lado.

Embora tivesse lindos cabelos louros, ela os escondia em uma trança enrolada

na nuca. Esse misto de trança e coque nunca se desmanchava ou saía do lugar.

Raramente alguém conseguia convencer Valerie a desmanchar o coque e nos

mostrar a trança, que descia até a cintura. Só Lisa sabia direito como convencê-

la a fazer isso, mas a trança ela nunca soltava, por mais que implorássemos.

Valerie era severa e inflexível, e a única funcionária que nos inspirava

confiança. Confiávamos nela porque ela não tinha medo de nós. Nem dos

médicos. Não era de falar muito sobre o que quer que fosse, e também por isso

gostávamos dela.

Naquele lugar, éramos obrigadas a ouvir muito palavrório. Todo dia, cada uma

era entrevistada por três médicos: o médico do pavilhão, o residente e o seu

terapeuta. Quase sempre, tínhamos de nos escutar falando, embora eles também

falassem bastante.

Tinham uma linguagem própria: regressão, "atuação", hostilidade, abstinência,

comportamento autoindulgente. Esta última expressão podia vincular-se a

qualquer atividade, dando-lhe um ar suspeito: comportamento autoindulgente ao

comer, ao falar, ao escrever. No mundo exterior, as pessoas comiam, falavam e

escreviam – mas nada do que a gente fazia podia ser simples.

Diante disso tudo, Valerie representava um alívio. A única expressão que

costumava usar era "atuar", mas a usava corretamente, na acepção de "pegando

no meu pé e me deixando maluca". Dizia coisas como "Pare com isso" e "Você

é uma chata". Dizia o que queria dizer, igualzinho a nós.

Os médicos eram homens, as enfermeiras e atendentes eram mulheres. Havia

duas exceções: o atendente Jerry e a Dra. Wick. Jerry era esguio e ansioso. Uma

de suas tiradas era ótima. Volta e meia, alguma pessoa cheia de privilégios,

autorizada a deixar o hospital de táxi, pedia: "Jerry, me chama um táxi".

"Táááxi", chamava Jerry , sem sair do lugar. Nós adorávamos.

Já a Dra. Wick era outra história.

A Dra. Wick era a chefe do nosso pavilhão, o South Belknap Dois. Os pavilhões

tinham nomes que lembravam internatos, tipo East House e South Belknap, e a

Garota, interrompidaWhere stories live. Discover now