Néfi LIVRO UM IrmÃ

Capítulo Primeiro

Pensando bem, até que foi diferente meu pai ter posto o nome dele em mim. Quero dizer, não o dele, meu pai, tipo júnior ou filho, não, mas o do cara de quem acabei de ler: Néfi. Cheguei a pesquisar mais sobre esse assunto, em Hebreu significa Profeta. Já encontrei alguém no telejornal chamado da mesma forma. Mas enfim, não vamos ter toda uma história sobre meu nome, não é?

Eu sou Néfi, tenho 16 anos e uma irmã chata pra caramba. Mas não vamos falar dela nem de seu namorado galã agora.

A primeira coisa que vejo quando baixo o sacks é meu marinextractor em cima de minha escrivaninha. Quase todo mundo encurta de marinextractor para marine, por dois motivos: A) A palavra marine já dá a entender do que se trata (mar, água salgada); B) Nós já estamos numa época onde quanto mais rápido o receptor captar a informação, melhor. Meu avô ainda costuma fazer piada com nossa maneira de comunicação evoluída.

Vamos embora > Simbora > Bora > Bó > USANDO OS OLHOS

Não quero > Qué não > Ah neim > Numq > BALANÇANDO A CABEÇA FRENETICAMENTE

Amo-te > Te amo > I love you > Luv u > DAR UM ABRAÇO DE 3 SEGUNDOS

O marine lembra meu inalador, só que um pouco maior. É composto por um copo cilíndrico, com um compartimento mínimo dum lado (para guardar o sal) e de um bico de onde sai água refrescante e doce. Adoraria dizer que foi um brasileiro quem o inventou, mas estaria mentindo se o fizesse. Lucas Featherstone, norte-americano, teve o privilégio de descobrir quais elementos que, combinados com a água salgada, forçariam o sal a separar-se dela e ainda fariam com que tivesse gosto de água natural. Não que vivêssemos sempre enfiando nossos marines no mar de Recife, mas era algo útil para quando você andasse de jet ski ou até mesmo tivesse racionamento de água.

Minha mãe me chama da cozinha, largo meu sacks em cima da cama, com a tela ainda ligada e mostrando o livro que paro de ler, e saio do quarto. Talvez eu não devesse ser tão obediente assim do tipo instantâneo, como se eu fosse mimado ou bebezinho da mamãe, mas você agiria parecido se tivesse a mãe que tenho. Seu nome é Rebeca e meu pai costuma descrevê-la como elegante, bem humorada e amor de sua vida.

Entro na cozinha e ela está lá, fritando ovos.

– Sim?

– Filho, preciso que você vá lá ao Volte Logo.

– Compre Mais, mãe – corrijo, pela centésima vez. A luz fluorescente da cozinha reflete o vestido azulado dela, deixando tudo bem visível no aposento. É uma cozinha pequena, como o resto do apartamento.

– Tanto faz. Vá lá e traga mais passas, ah e também chocolate para os cookies, não tenho o suficiente. – Ela fala num tom de urgência, como se sua vida dependesse disso.

– Mãe, você sabe que eu te amo, não é? Mas acho que você está se aproveitando. Estou gastando dinheiro demais de minhas digitais. Ontem foi pizza, era pra senhora ter pagado pra nós, mas não estava aqui na hora que o entregador veio, nem a Brijda, nem o papai, e semana passada...

– Prometo que será somente dessa vez filho. Vá lá, por favor. Ponho mais dinheiro em suas digitais depois.

– Tá bom.

Após tomar água, saio um pouco contrariado.

É meio injusto quando os gastos não são divididos igualmente. Tudo bem que meus pais que me arranjam dinheiro e tal, mas isso dá o direito a eles de usarem o dinheiro que me dão? Não responda.

Ah, esqueci de dizer, nós vivemos no ano de 2126. E esse estilo de depósito bancário foi imposto e lançado no mercado dia 06 de Junho de 2060. É um pequeno chip que é encravado no corpo, para ser mais exato na mão (direita se você é destro e esquerda se você é canhoto). É chamado de digitais. Não dá para vê-lo, nem senti-lo. Às vezes fico encarando a palma de minha mão, pondo-a contra a luz forte e nada. Desisto e logo me encontro outra vez procurando o chip na mão. E ainda pessoas sinistras atribuem isso ao sinal da besta do Apocalipse, usando a tese da data de quando foi implantado o programa: 06.06.60. Mas creio que é tolice, porque o chip tem outro uso muito útil: Saber a localização das pessoas. Isso pode ser bom se você é tranquilo e legal assim como eu. Mas pode ser ruim para jovens custosos que querem fazer suas traquinagens às escuras. Basta apertar um botão do localizador e olhar em seu visor. Você pode ampliar sua capacidade para o mundo inteiro. É parceria com uma empresa desenvolvedora de serviços online, sabe...