Capítulo 53

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Aparentemente, Daniel não obteve sucesso nenhum em tirar nada de Rodrigo. Eu sei disso porque estou no outro lado do vidro de uma sala de interrogatórios, assistindo como um exaltado Dani tentava colocar algum senso no irmão.

Rodrigo não era muito diferente do Dani, pelo menos não fisicamente. Tinha o mesmo formato do rosto e o tom de pele mais bronzeado, mas o cabelo era castanho claro assim como os olhos. Mas as similitudes terminavam aí. Porque enquanto um irmão era claramente impulsivo e passional, o outro se mantinha calado e irredutível. Nenhuma das ameaças parecia funcionar.

- Por que deixou Daniel falar com ele? – eu perguntei ao Wagner ao meu lado. A cada palavra que Daniel proferia, ele parecia ficar ainda mais furioso. Só que eu sabia que, além da fúria, havia o desespero.

Ele se importava muito com essa família. Pelo que eu sei, policiais não podem deixar um suspeito ver a família assim do nada.

- Quem sabe assim ele fala alguma coisa.

- Mas ele não está conseguindo arrancar nada dele.

Wagner não me respondeu, e pela maneira em como ele apertava as mãos em punho... Eu não gostaria de ouvir sua resposta tão cedo.

Eu me perguntei também porque ele não chamava os pais do Rodrigo. Que no caso são os mesmos pais do Dani.

Que confusão esse garoto se meteu.

-... E o que conseguiu, hein?! Diga pra mim, Rodrigo! Por que fez isso? – Daniel gritava para o irmão, esmurrando a mesa. Ele tem certo potencial para ser o mau policial. – Como você pode ser tão estúpido?! Não se lembra de nada do que me aconteceu?!

Rodrigo mantinha os olhos na mesa, onde seus pulsos estavam algemados. Nada cruzava seu rosto: nem raiva, tristeza, desafio, frustração... Absolutamente nada.

- Vocês tem tido bastantes problemas com o tráfico? – eu perguntei ao Wagner. – Eu pensei que os traficantes fugiram uma vez que a milícia tomou conta da cidade.

- Que nada. Eu diria que até piorou a situação. Para disfarçarem a identidade, eles têm usado até adolescentes com nenhum histórico criminal, e até com condições boas de vida. Como aquele retardado ali. – ele apontou para Rodrigo.

Que estranho. Eu achei que eles teriam o bom senso de fugir. Mas imagino que a ganância é bem mais poderosa que o bom senso para eles.

Mas por que pegar adolescentes como o Rodrigo? O que ele tem de tão especial?

- Isso já deu. – Wagner disse, descruzando os braços e dirigindo-se até a sala. – Se o guri não vai dizer nada agora, ele que aprenda a aguentar as consequências como homem em silêncio.

Eu o segui, mesmo sem ter sido convidada, para dentro da sala. Wagner já ia dizer alguma coisa sobre mim, mas mudou de idéia. Ele se virou para Rodrigo e começou a esbravejar:

- Sabe, pirralho? Os internatos de hoje em dia não são tão diferentes da Febem de antes. Sabe o que fazem lá com os novatos? Eles...

À medida que Wagner começava a ameaçar Rodrigo, eu me aproximei dele. Houve um momento em que o policial parou de falar, mas eu estava alheia a ele. Parei ao lado do algemado, quem me encarava com certo espanto.

É claro, ele não me conhece. Eu também não o conheço. Mas eu consigo reconhecer alguns sinais de abstinência: o movimento ritmado dos dedos, as olheiras gigantescas debaixo dos olhos, e os ligeiros tremores que percorriam seu corpo.

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