Sufoco

2.3K 134 18
                                    

Amanheci com uma baita sensação estranha, de ter feito algo que não faria caso estivesse sóbria. Eu costumava fazer muitas coisas sem pensar nas consequências, não que eu deixasse de me importar e tudo o mais, é só que eu nunca consigo fazer escolhas sem acabar me prejudicando de alguma forma.
Enquanto minha cabeça girava e eu ainda tentava me levantar, senti alguém abraçar-me pela cintura, de um jeito muito gostoso, admito. Fazia tempo que eu não acordava com alguém na minha cama sem ser um de meus amigos e por um segundo eu pensei em sair daquele abraço, mas a verdade é que eu não lembrava como reagir a isso, até porque a garota era totalmente desconhecida! E a única coisa que eu sabia sobre ela era seu nome...
Com muito cuidado pra não acabar acordando ela, me virei e fiquei olhando para o teto. A luz fraca do amanhecer entrava pela janela e a brisa gostosa da alvorada enchia meus pulmões já estragados pelo cigarro, comecei a respirar cada vez mais fundo e o ar começou a ficar pesado trazendo uma coceira irritante em minha garganta, comecei a tossir muito... Muito mesmo. Não conseguia controlar e aquela tosse foi aumentando até me deixar quase sem ar, levantei rápido da cama um pouco tonta e sai correndo. Flavia acordou assustada quando eu passei por cima dela e seguiu-me rápido até o banheiro.
Senti uma agonia muito grande em meu peito e aquilo não passava nem diminuía só me deixava mais aflita, tentava conter a tosse com a mão, quando olhei para a garota que estava com uma expressão super preocupada ao meu lado percebi que tinha algo errado. Olhei de volta para a mão que havia tentado conter a tosse e ela estava coberta de respingos de sangue. Eu nunca tive uma tosse assim! Flavia puxou-me tentando me acalmar com um abraço e aos poucos aquilo foi funcionando, eu escutava a respiração dela e tentava acompanhar... Por fim eu sentia meu corpo gelado e mole, como se eu tivesse sido agredida durante uma chuva muito forte e acabasse de ter chegado em casa. Levantei me apoiando em Flavia e lavei o rosto, estava só de samba canção e pedi para ela buscar uma camisa pra eu poder vestir.
Ficamos sentadas na cama por um bom tempo sem falar, o episódio que acabara de acontecer fez com que todas as palavras que talvez pudéssemos trocar nessa manhã nos escapassem e não sobrasse uma sequer para podermos quebrar o iceberg que preenchia todo o meu quarto.
- Bem, Cris... Eu tenho que ir... - disse ela olhando para as próprias mãos.
- Tudo bem, se quiser alguma roupa emprestada, pode pegar naquela gaveta. - apontei para o guarda-roupa.
- Uma camisa só... A minha está com manchas de bebida.
- Pode escolher, ai tem as que não me servem mais, muito curtas... - eu ainda guardava certas blusas que não cabiam mais em mim para ocasiões como esta.
Ela escolheu uma branca com estampa do BMO, aquele game super fofo e assexuado do meu desenho preferido. Ficou linda... Nessa hora eu fiquei me perguntando como uma garota tão maravilhosa como ela criou interesse por mim.
Eu observava ela se arrumar em frente ao espelho, amarrando o cabelo castanho, limpando o rosto e dobrando as beirinhas da manga da camisa. Cada coisa que ela fazia parecia ser delicado demais.
- Você pode me levar até o ponto de ônibus, por favor ? - disse ela se virando pra mim.
- Levo sim. - respondi procurando os chinelos.
Abri a porta da frente e esperei ela passar e ali eu senti algo muito diferente... Nada. Simplesmente não sentia vontade de fazê-la ficar, não queria pedir seu número e nem de conhecê-la melhor.
Dei o braço pra ela segurar e fomos andando até o ponto... Sem dizer nada durante o caminho todo. Minha cabeça estava completamente vazia e atordoada pelo o que tinha acontecido, não sabia como lidar nessa situação e nem procurava por uma solução, apenas deixei acontecer e não me importava caso não fosse vê-la nunca mais.
O ônibus vinha se aproximando e ela levantou para fazer sinal...
- Bem, acho que é isso... Tchau. - eu falei estendendo os braços.
Senti um encontrão quando me abraçou de tanta força que ela se jogou sobre mim. E por fim, o último beijo, apenas encostamos os lábios por um longo momento ou até o ônibus chegar, o que pareceu uma eternidade pra mim. Nos separamos e ela subiu no coletivo.
Sai andando e não olhei pra trás nem pra dar um tchauzinho.
Entrei em casa e fui direto pro meu quarto, deitei e senti um aperto tão grande no meu corpo que eu me encolhi segurando as pernas. Fechei os olhos e reconheci aquela escuridão que já fazia parte de mim há muito tempo...
Que me deixava incapacitada de fazer qualquer coisa e mesmo quando conseguia executar uma mínima tarefa diária ainda o fazia meio que inconscientemente, como se não tivesse motivo para estar fazendo aquilo, mas mesmo assim eu continuava, só porque era parte da minha rotina.
Minhas mãos suavam e tremiam, eu sabia o que meu corpo queria, sabia que tragar um cigarro aliviaria meus pensamentos e adormeceria a sensação de ansiedade. Foi o que fiz. Acendi um cigarro e puxei a fumaça bem devagar... Meus lábios tremiam quando eu finalmente soltei a fumaça. Já sentia toda aquela agonia diminuir e fui ficando menos apavorada.
Peguei meu celular e fui dar uma olhada em minhas redes sociais... Posso dizer que era bem conhecida em algumas delas como Instagram e Facebook, usava o segundo mais como um lugar para me comunicar com os amigos de minha antiga cidade. Havia um comentário em minha foto de perfil que achei ser de uma colega de colégio, mas fazia tempo que ela não falava comigo, muito menos comentava minhas coisas.
"Que linda hein ?!"
Um comentário bem estranho ao tratar-se de uma pessoa que eu não tinha muita intimidade... Respondi com um "Obrigada Aline, estou com saudades." e fiquei olhando a foto de perfil. Ela estava diferente... Achei bonita.
Logo o som de notificação tocou e era comentário na minha foto...
"Você me conhece de onde ?" Foi a contra-resposta dela.
Achei melhor chamá-la no bate-papo.
- Oi, você não é a Aline Monteiro que estudou comigo no CSRN ? - perguntei.
A resposta foi de imediato.
- Não haha. Eu ainda estou estudando. E não lhe conheço.
- Ah sim, me desculpe, achei que era uma conhecida. Vocês tem o mesmo nome e são muito parecidas... - me sentia envergonhada pelo equívoco.
- Relaxa. Queria te dizer que você é muito linda! Te observo por aqui faz um tempo já... Se quiser falar comigo pelo WhatsApp eu dou meu número e tals hehe.
Trocamos os números de celular e a conversa terminou por ai... Decidi dormir um pouco mais pra poder sair à noite.

Mais Que Um RomanceOnde histórias criam vida. Descubra agora