27 - Bolha

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- Quem diria, parece que afinal o meu adorado irmão escolheu bem.

Mesmo através da luz cintilante da bolha elétrica, o Klaus emanava segurança e poder como se tivesse as rédeas da situação, era irritante e admirável em simultâneo. Duvidava que as paredes daquela cave isolassem completamente o som devido ao estado de decomposição da argamassa e à visibilidade dos tijolos, qualquer coisa por ele dita que pudesse ser mal interpretada destruiria certamente qualquer hipótese de aliança entre nós e sem a Alana não teríamos nenhum trunfo e consequentemente nenhuma vitória.

- O que é suposto isso significar? - Tentei soar o mais neutra e despreocupada possível.

- Oh minha querida Cassandra, significa que o Connor tinha razão e tens um potencial elevadíssimo. Estás destinada a grandes feitos, tens poder suficiente para aterrorizar os maiores anciãos. Claro que precisas de algum polimento.

Fiz um grande esforço para impedir o meu queixo de cair desamparado resultando numa risada tímida. Qual seria o objetivo dele? Onde queria ele chegar? A minha única hipótese passava por deixá-lo divagar para decifrar o propósito daquilo.

- Vindo de outro ser talvez o considerasse um elogio como veio de ti não passam de palavras ocas e desconexas.

O divertimento daquela pseudo conversa notava-se claramente no seu rosto, era como se estar ali não o incomodasse nem um bocadinho, não se sentia minimamente preocupado, aliás quem se sentia presa era eu. Presa a todo um passado conflituoso e a duas linhagens distintas que aprenderam a matar-se como cumprimento.

- Seria incorreto e rude da minha parte matar-te sem te dar hipótese de escolha, afinal de contas nunca te foi dada essa oportunidade, alguém a assumiu por ti. O que a meu ver é totalmente errado. - Quem o ouvisse falar, parecia extremamente preocupado com o bem-estar e sanidade dos demais. - Portanto querida Cassandra de que lado escolhes ficar? Comigo ou contra mim?

- Oh Klaus julguei-te com inteligência suficiente para não precisares de fazer tal pergunta. - Apesar dos meus esforços, a minha voz não soou tão firme e decidida como gostaria.

- Então não me deixas outra opção senão matar-te. - Esboçou um sorriso como se ceifar vidas não passasse de um jogo de computador.

- Assim sendo serei forçada a fazê-lo primeiro.

A minha energia para aquela conversa estava nas últimas, se tivesse poder suficiente acabava com aquilo no momento.

- A Alana acordou. - Ouvi a Diana a avisar do topo das escadas.

Levantei-me da cadeira de madeira sem dizer uma palavra nem olhar para ele. O que mais uma vez não pareceu incomodá-lo. Porque haveria? O Klaus tinha plena consciência do efeito que provocava nas pessoas. A Diana esperara por mim no andar de cima, encostada ao que fora outrora uma porta, com o olhar carregado e um aspeto cansado.

- Estavas à espera de quê Cassandra? - Disse olhando para os meus olhos confusos. - Ele é um vampiro, um bem real, daqueles a que o nome define e preenche por completo.

- O som chegou aqui? - Sibilei, a última coisa de que precisava era uma crise adolescente.

- Não. Apenas eu ouvi a conversa, não confio nele, por isso não te ia deixar absolutamente sozinha com ele.

- Só dispenso aturar criancices agora. - Resmunguei enquanto passava por ela.

A Alana parecia um animal assustado e defensivo, com as palmas das mãos erguidas contra eles, colada à parede e completamente alerta. O Martin continuava absorto, preso no seu próprio drama, sentado num dos três sofás daquela divisão. A Afrodite e a Hera imitaram-na, o cenário chegava a ser cômico como se elas tivessem armas de brincar num confronto de metralhadoras. O instinto de qualquer ser quando se vê ameaçado é defender-se por isso a atitude de ambas as partes era, de certo modo, compreensível. Porém, de nada serve defender-se não se conhece o ataque, e era nessa situação que nós estávamos, nenhuma de nós conhecia as extensões dos poderes dela por isso teríamos de avançar com extremo cuidado como se fosse um campo minado.

Mal me viu, a Alana virou uma das mãos na minha direção e atacou inesperadamente, a surpresa impediu-me de reagir completamente pelo que caí com o joelho esquerdo no chão face à lancinante dor de cabeça que se formou, as minhas têmporas estavam a arder incapacitado as minhas habilidades de defesa e de ataque no imediato. Tal como começara parou, a minha vontade, o meu instinto era retaliar, afundar as minhas presas naquele pescoço branco e cheio. Honestamente tê-lo-ia feito se não fosse a voz imperativa da Diana na minha cabeça - "Controla-te ou deitas tudo pelo cano".

- Muito bem Alana. Se a ideia era marcar posição, tens a minha atenção. - Declarei ao alisar a blusa esverdeada.

- Onde está o Klaus? - Gritou.

- Não precisas de te preocupar com ele agora, estás a salvo. - Entrou a Afrodite na tentativa ingênua de acalmar a vítima e protegê-la do agressor.

- Ainda estou a decidir qual de vós devo temer mais. - Qualquer passo em falso e a bomba era ativada.

- O que é suposto isso significar? - Questionei.

- Sei o que vocês estão a aprontar e nunca vos ajudarei. - Declarou num tom grosseiro.

- Sabes? Muito bem então. - Comecei.

- Alana o que julgas saber? - Inquiriu a Diana interrompendo-me.

- Vocês querem matar a Raven! - Gritou. - Última notícia, fui eu quem a tirou de Merwin, para que ela cumprisse finalmente o seu destino. E recuso-me a deixar que vocês se atravessem no caminho dela.

Ia refutar, argumentar, mandar vir com ela como se não houvesse amanhã, planeava abrir-lhe a cabeça e obrigá-la a perceber o nosso lado, a ver o melhor para todos e não seguir cegamente uma vingança determinada por outros. Quando um grito ecoou pela divisão, olhei em redor contando os presentes, o Martin continuava noutro mundo, a Hera estava à minha esquerda, aterrada com o teor da conversa e a Diana do lado direito com os braços cruzados tentando decifrar a situação. Onde estava a Afrodite? Bolas, o Klaus. Desci a escadaria a correr. A Afrodite gritava e esperneava tentando que o Klaus lhe soltasse o pescoço. Apertei a bola elétrica com a mão esquerda e com a direita resgatei-a para fora do alcance dele. Recebi, uma vez mais, uma risada triunfante. Não o podemos matar já? De que me servia ser dotada de dois dons se não servia para fazer frente aos meus obstáculos!

- O que te passou pela cabeça Afrodite? - Gritei severamente ao empurrá-la pelas escadas.

- Ele matou a Brianna! Ele matou os meus pais, o meu irmão, o meu namorado... - A voz irada da Afrodite desvaneceu.

- Julgas que não o quero matar neste preciso momento? - Gritei. - Sozinhas não o conseguimos fazer, o único resultado que poderás ter ao agir sozinha é facilitar a tua morte.

- Nunca pensei dizer isto loirinha mas a sanguessuga tem razão.

Todas olhamos para a Alana que continuava no seu belo canto. Porque não fugiu novamente? Não estava presa ou semelhante. Precisaria ela tanto de nós como nós dela?

- Porque não o fez?

A pergunta de Hera apanhou-me despercebida. Parecia de tal forma descabida e inteligente em simultâneo que me aumentou a raiva sobremaneira e uma vez mais o meu temperamento natural sobressaiu. Cada partícula do meu frio corpo entrou em combustão.

- Porque não quis, sei lá, queres ir lá perguntar-lhe? - Apontei na direção da escadaria.

Senti o sangue de Hera gelar com o tom da minha voz e o choque estampado na Afrodite e Alana quando a ardente bola laranja quente se despedaçou na parede escurecida e enfraquecida. Começava a ressentir-me pela abstinência constante, precisava de uma pausa daquele conventículo, precisava de alguém fresquinho e suculento onde cravar os dentes. Se não fosse eu uma criatura das trevas, exatamente o oposto a Deus, naquele momento teria acreditado nele e num dos seus famosos milagres.

- Podes beber.

A voz assertiva e coesa de Martin calou todo e qualquer murmúrio e interrompeu os mais profundos pensamentos. 

A Prisioneira LivreDonde viven las historias. Descúbrelo ahora