Capítulo 3 - Limusine

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Eu já estava cansada de ser politicamente correta. Estava a um passo de mandar meu chefe para o inferno e enfiar o dedo na cara daquele senhor prepotente e gritar até que ele tivesse lágrimas nos olhos e arrependimento por toda uma vida. 

E não foi até sua mão esbarrar em um acaso forçado na minha bunda que eu decidi fazer exatamente isso.

Enchi o pulmão de ar na mesma hora que senti uma mão diferente perpassar minha cintura. Uma rápida olhada para trás para perceber ser Alexandre, e resolvi que lidaria com ele depois. 

- Eu não sei quem o senhor pensa que é, com suas roupas caras e seu bigode grosso e tingido, mas se me tocar mais uma vez sem a minha autorização eu vou processá-lo por assédio sexual. - Rosnei na cara do sujeito, que assumiu um tom estranhamente alaranjado de vergonha e tratou de se desculpar.

- Senhorita, eu não sei como pode pensar que eu... 

- Eu não penso, querido, eu sei. Sei que não tirou os olhos do meu decote e que guardou a aliança no bolso da calça discretamente assim que decidiu começar a flertar comigo. Sei que acha que eu poderia fazer uma boa acompanhante troféu pela quantidade de dinheiro certa e que talvez até aceitasse ir para a cama com você depois disso. Sei que é influente e se acha o dono do mundo por não ser mais do que deveria ser na sua idade avançada. Sei que me achou com cara de fácil, mas que já percebeu estar errado, e que vai se retirar da minha frente mudo e calado para que esse assunto nunca mais precise vir à tona. - Ele me olhava com os olhos arregalados e a boca seca agora. E eu já me sentia melhor depois de vomitar minhas verdades libertadoras. - Passar bem.

Dei as costas para o sujeito como indicação de que o assunto estava encerrado e logo topei com Alexandre que ainda segurava minha cintura quase sem encostar e tinha o olhar perdido. 

- E você, o que quer aqui? - Tratei de perguntar, querendo resolver tudo de uma vez. Estava naquela festa há mais de meia hora e ainda nem tinha conseguido pegar uma taça de champanhe caro.

- Eu tinha vindo ajudar. - Ele murmurou parecendo se lembrar do que o motivara a ir até mim. - Percebi que o cara estava sendo inconveniente e que você não estava conseguindo se livrar dele sozinha, e achei que um álibi como uma terceira pessoa inserida na equação pudesse resolver. 

- Eu não preciso da sua ajuda, sabichão.

- Você sabe, toda essa grosseria ainda vai te deixar de cabelos brancos antes dos trinta. Aliás, você sabia que é possível dizer a idade de uma mulher pela orelha dela? Anda, vamos ver quão próxima você está da meia idade. - Ele zombou, empurrando meu cabelo para o lado e eu juro que tive vontade de morder seus dedos até tirar um pedaço. 

- Seu insuportável! Saia de perto de mim! - Elevei a voz, irritada com sua presença insistente. 

- Tudo bem, Monique, pode admitir que prefere muito mais que eu esteja aqui do que seu companheiro anterior. - Disse com um sorriso falso rasgando a boca.

- Pelo menos com ele eu não era obrigada a olhar para esses sapatos fora de contexto. Você acha que está aonde, em uma conferência no interior? - Eu sabia que nada o deixava mais puto do que ouvir minhas críticas bem fundamentadas e não deixaria de usar esse artifício. 

- Quer saber? Você é amarga assim por falta de alguém que saiba lidar com seu humor infeliz!

E, fácil assim, estávamos imersos em uma discussão a plenos pulmões em pleno salão de festas.

No momento não me interessava o quão maravilhosa aquela mulher infernal estava, eu só queria pegá-la pelo pescoço e esganá-la até que ficasse roxa pedindo por misericórdia. Ela conseguia me tirar do sério com uma facilidade ímpar, com toda a sua arrogância e comentários ácidos. 

Muito entretidos em soltar os cachorros em cima do outro, não vimos a reação das pessoas ao nosso redor à nossa discussão acalorada. De fato, não podíamos ligar menos para o ambiente onde estávamos ou quem poderia testemunhar aquela baixaria.

Isto é, até nosso chefe aparecer. 

Sr. Abrahão segurou nós dois pelo braço e nos arrastou até a entrada do lugar sem dizer uma palavra. Interrompemos momentaneamente os xingamentos ao som de seus dentes rangendo, mas ambos sabíamos que estávamos longe de terminar.

- Chega! - Rosnou ao chegarmos ao lado de fora. - Eu não sei quantos anos vocês acham que vocês têm, mas essa palhaçada já deu pra mim. Vocês vão se resolver e vai ser agora. 

Ele abriu com alguma dose de violência a porta de uma limusine estacionada por ali. Fez um sinal para que um homem claramente vestido de chofer que fumava há alguns metros se aproximasse, e disse a ele: 

- Dê algumas voltas com esses dois por aí. Não os traga de volta até que os gritos cessem. - Monique revirou os olhos e eu estralei os dedos, impaciente.

- Sim, senhor. 

- Quanto a vocês. - Disse, chamando nossa atenção de volta para si. - Vocês vão se resolver e vai ser já. Não me interessa quem vai amaldiçoar a mãe de quem, quem é culpado e quem é inocente, eu só quero vocês dois de volta mansos e educados. Estamos entendidos? - Questionou apontando o dedo em nossas faces.

- Sim, senhor. - Ecoamos.

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