Capítulo 52: Natanael

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TEMPOS VOLÁTEIS


Depois de uma semana regada a hecatombes internas, decisões difíceis e a um corpo que não era de meu marido, vê-lo na minha frente, em carne e osso, é o estalo de emoção do qual não poderia ter agora — mas que muito necessitava.

Corremos em direção um do outro assim que nossos olhos se encontram. Ao alcançá-lo, não me nego em juntar nossos lábios. Sentir seu sabor é o que preciso para arrancar de mim o gosto de Thiago. E não preciso tentar esconder o que fiz para permanecer livre e vivo nesta semana. Nada seria possível de esconder do meu ruivo assim que nossas mentes se conectam. Mesmo eu tendo entregado meu corpo ao inimigo, minha mente continuou a pensar em Carlo, ainda que meu coração se recusasse a pulsar pelo seu. Eu não poderia me entregar dessa forma.

Ao menos até agora.

Engulo em seco, assim que nossos lábios se afastam o suficiente para tomarmos ar antes de mais um beijo cálido, que me consome. Uma escola de samba parece fazer morada no meu peito, retumbando um ritmo tão rápido e intenso que tenho a sensação de que meu coração abrirá um buraco na caixa torácica e sair dançando. A emoção é tamanha, explodindo em transpiração fria e lágrimas quentes, demarcando meu rosto. Meu corpo todo anseia por meu ruivo, mesmo que minha mente relembre seguidamente do motivo de todo o sacrifício que fiz durante a semana.

Eu só quero ir embora, mas isso seria sinônimo de desistência num momento crucial como este, e não posso me dar este luxo. E o alarme que ecoa alto a nossa volta é o lembrete de que ainda tenho contas a acertar. Em meu nome. Em nome de todos aqueles que amei e ainda amo. Em nome de todos aqueles que sofreram e estão sofrendo.

— Você precisa ir embora — digo, afastando Carlo. — Aqui não é um lugar seguro.

— Eu vim te buscar — responde —, só vou embora se você vier comigo.

— Não posso. Eu comecei tudo isso, preciso terminar.

Dayane, alguns passos atrás de Carlo, se aproxima.

— Nós podemos te ajudar, nos diga o que fazer.

Balanço a cabeça.

— Isso não é possível — objeto, afastando-me alguns passos. Meu peito reclama pela distância imposta. Minhas escolhas não devem mais machucar os demais, mesmo que as consequências delas perdurem por anos, senão décadas. — Por favor, vão.

— Eu já disse que não — insiste Carlo, alcançando-me e me segurando pelos braços, chacoalhando-me de leve. — Não me importa o que você fez aqui, sabe que não te julgarei, porque te amo. E sei que é recíproco. Então, não, eu não vou te deixar para trás!

Um estampido característico e bem conhecido invade o ar. Como um flashback, vejo a dor estampada no rosto de Carlo enquanto seu corpo pesa contra o meu. Seguro-o o mais firme que posso, contudo, caímos os dois, mantendo-o em meus braços. Sinto o cheiro de sangue e meus dedos parecem queimar quando os puxo de suas costas, vendo o líquido vermelho tingir minha pele. Por um momento, vejo-me no caminho entre a Base de Estudos do Sul e a dobra espacial, cintilando em diferentes cores. Naquele momento, pouco depois de termos nos entregado um ao outro, eu achei que estava perdendo Carlo.

A lembrança amarga só me faz soluçar, tomado por um desespero crescente e ainda mais desesperador quando ergo o olhar e vejo Dayane dando passos para trás, agora de costas para mim, e, a nossa frente, os olhos ferinos de Josué Tavares nos encaram como se fôssemos a caça de seu jantar. Engulo pedregulhos, a raiva dominando meu ser. Mas minha ira é mal direcionada quando me lembro da coleira em volta do pescoço do ex-major. A víbora descobriu, e tá dando seu bote.

Futuro Conquistado #2 (Ficção LGBT)Onde histórias criam vida. Descubra agora