{wolves}

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Nick já estava acordado quando, após três batidas fracas na melodia colorida que ocupava a mente da criança, a voz aguda de Luna soou abafada através da porta fechada do quarto dele.

"A mamãe disse para você descer para tomar café".

Ele suspirou e deixou que a gravidade tomasse o universo que compunha a mente dele, fazendo com que os pensamentos-planetas voltassem aos seus caminhos elípticos caóticos.

O olhar demorou-se nos padrões naturais traçados na madeira envernizada em tonalidades [des.] harmoniosas de marrom antes entreabri-la para mirar as mechas tingidas de nanquim perfeitamente desarrumadas de Luna.

"Diga a ela que eu desço daqui a pouco" ele disse e esperou a pequena assentir e desaparecer a passos saltitados na curva do corredor antes de adentrar nos costumes sonolentos de uma terça-feira remotamente similar a outras.

O campo de visão dele foi tomado pela escuridão que orquestrava os silêncios antes das sinfonias do seu coração por meros segundos ao deslizar uma camisa sobre a cabeça. E logo substituído pela cacofonia que formava a imagem desajeitada e sonolenta de si espelho.

O reflexo de Nick tinha o contraste de acordes brancos e pretos das teclas de um piano – com os mesmos cabelos tão [ou mais] negros que a noite que Luna, assim como uma pequena porção do céu noturno escondida sob as íris, e a pele tão pálida quanto à monotonia da neve no inverno.

Ele suspirou permitindo que alguns dos sentimentos que se confundiam nas sinapses e reações químicas do cérebro dele escapassem livres pelo ar solto nos pulmões e desbravou o caminho das curvas do labirinto de corredores conhecidos junto às memórias enlaçadas nos retratos emoldurados nas paredes que o levavam até a cozinha.

O aroma de chá e o colorido artificial do cereal favorito de Luna dançaram pelo sistema dele assim que se apoiou no limiar do cômodo se permitindo observar a atmosfera cálida envolta pelas essências que Nick sempre assimilaria como familiares.

"Bom dia, Nicholas" a mãe desviou os olhos do romance que lia na companhia da xícara de chá de hortelã, lançando lhe um sorriso por cima das lentes dos óculos de leitura que caíam suavemente de onde deveriam estar.

Ela era a única – exceto pelos professores – que o chamava pelo nome completo, ao invés do apelido, apesar dos constantes protestos dele, durante a pré-adolescência, sempre retrucados com a resposta no tom brilhante na pitada de melancolia: "Eu escolhi seu nome e sempre o chamarei por tal".

"Bom dia, mãe" Nick resmungou, perdido em algum dos buracos negros criados nas distrações do balançar das folhas que se desprendiam dos galhos no passado outono.

Ele finalmente sentou-se a mesa ao lado da irmã, pousando um beijo no topo da cabeça da pequena, e serviu-se dos mesmos cereais coloridos afogados no leite em uma tigela, que acabaram dissipando um pouco das suas essências no líquido alvo devido à demora dele em consumi-los.

O deslizar metódico que regia os ponteiros do relógio, logo, anunciou o resvalar das louças a pia e da mochila as costas, o estalar dos beijos e as despedidas rotineiras.

O deslizar metódico que regia os ponteiros do relógio, logo, anunciou o resvalar das louças a pia e da mochila as costas, o estalar dos beijos e as despedidas rotineiras

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