CAPÍTULO • 02 (Degustação)

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CAPÍTULO 02

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CAPÍTULO 02

LARA

A EXPRESSÃO NOS rostos dos monitores quando cruzo os portões do orfanato é a mesma de sempre.

Nenhum funcionário aprova minhas visitas, mas não vou desistir só por causa de algumas caretas. A promessa que fiz foi definitiva: faça chuva ou faça sol, visitarei Iago todos os dias. Não importa que o mundo esteja desabando, ele é a única luz que ainda brilha para iluminar o meu coração.

Enquanto atravesso os corredores coloridos, decorados com balões, desenhos e personagens confeccionados com cartolina e isopor, crianças me cumprimentam ou interceptam o meu caminho para pedir alguma coisa: um brinquedo novo, uma roupa ou alguma refeição diferente no decorrer da semana.

Antes, quando Petrova estava viva, era ela a responsável por selecionar as instituições que precisavam de apoio. Ajudar os menos favorecidos com ações beneficentes é algo que influencia na popularização e boa imagem da empresa. No entanto, minha irmã nunca foi muito de se envolver emocionalmente e averiguar as condições reais dos lugares que recebiam o apoio do nosso projeto.

O projeto de Mikhail, corrijo em pensamentos.

Assumi o compromisso de prosseguir com as doações poucas semanas após o acidente. Realizei um levantamento dos lugares que mereciam nossa atenção e reformulei as políticas de investimento. Este orfanato era muito diferente há dois anos, quando entrou para o catálogo de instituições em busca de ajuda.

Para qualquer outra herdeira, cuidar de um departamento tão pouco influente seria considerado um insulto, mas pareceu uma ocupação aceitável quando minha única vontade era desaparecer e nunca mais precisar colocar os pés dentro daqueles escritórios.

No pátio, avisto Iago antes de qualquer coisa. O grande jardim cultivado abaixo do teto aberto balança atrás dele no ritmo de uma brisa suave e a claridade ilumina o topo da sua cabeça, como se ele todo fosse uma fonte infinita de brilho intenso.

Cento e sete mil, sussurro no lugar mais profundo da minha mente.

Faz dois anos que esta criança me salvou da escuridão total, a única vez em que voltei a acreditar no amor como um sentimento real. Todos os dias a angústia de imaginar que um casal sorridente pode solicitar sua adoção me parte ao meio, como se um machado afiado me acompanhasse onde quer que eu me esconda. Não sei se chega a ser egoísmo desejar que ninguém venha, mas tenho essa esperança de que o futuro me presenteie com a possibilidade de transformar o meu menino em meu filho perante a lei — no meu coração, não existe nomenclatura melhor.

Mas esse sonho só poderá ser concretizado quando eu pagar por todos os pecados que cometi e voltar a ser dona da minha própria vida. Porém, até esse dia chegar, não tenho poder para impedir caso alguma família decida adotar Iago antes de mim. Não tenho esse direito, mesmo que me leve o resto da alma.

Entre Perdas e Ganhos | LIVRO 1 | DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now