Capítulo 38

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Me sento de frente para ele.

Realmente ele não está bem. Porém isso não importa, só quero por um ponto final nisso tudo e amanhã voltar para minha vida.

— Pode falar. —ele me olha por um tempo e antes de começar.

— Quando falei aquilo, não imaginei que você ouviria.

Isso deve ser piada.

— Se tem tanto nojo da minha raça, por que me ofereceu emprego. Por que se aproximou de mim?

— Não tenho nojo Bella, e você sabe que nunca tive nojo de você. Eu achei que tinha, mas nunca de você.

— Tinha não, tem. — ainda me lembro perfeitamente de tudo que ouvi.

— Quando eu era menino e ainda nao sabia bem o porque, eu não conseguia me aproximar de negros. Na escola, eu fui solitário porque sempre tinha um negro ou negra nos grupos.

— Sério que eu tenho que ouvir isso? — Pergunto incrédula.

— Por favor, me permita terminar. Talvez assim você me entenda e até consiga me perdoar. — Acho isso muito difícil. Entretanto, já que estou aqui, resolvo me calar e ouvir.

— Eu já sabia que era adotado, porém somente aos quinze anos minha mãe, orientada por uma psicóloga, me contou minha verdadeira história. A mulher que me pôs no mundo era negra, pobre e viciada em drogas. — Ele para, parece estar tomando coragem. Em seus olhos, dor. Isso me incômoda, mas continuo calada.

Ele respira fundo e continua...

— Essa mulher tentou me vender. Eu tinha apenas cabeça e barriga, porque eu era desnutrido. Como não conseguiu, ela simplesmente me jogou na lata de lixo e se não fosse por Marisa e Richard, eu não teria sobrevivido. — Meu peito dói, seus olhos estão cheios assim como os meus.

— Sinto muito mesmo Nikolas. — Falo com sinceridade.

Com o olhar perdido, ele continua...

— Marisa e Richard, estavam de férias aqui no Brasil. Marisa foi jogar um papel de bala em uma lata de lixo no bairro da Lapa. Eu não me mexia, nem forças para chorar eu tinha. Eles acharam que eu estava morto e sem saber o que fazer, chamaram a polícia que veio acompanhada de um repórter. Repórter esse que tirou várias fotos de mim, encardido e com feridas dentro de um lixo cheio de plásticos de cocaína e seringas. Passei anos fazendo exames e por incrível que pareça, não nasci ou contrai nenhuma doença séria. Eles pagaram o melhor hospital. Ficaram aqui por cinco meses e só foram embora quando conseguiram me adotar. — Minhas lágrimas escorrem.

— Chega. — Peço.

Ele parece não me ouvir e continua...

— Eu tinha apenas três meses de vida. Depois que minha mãe me contou isso, fui me soltando com ajuda dos psicólogos. Consegui fazer amigos negros e me aceitar um pouco. No fundo acho que eu sempre soube que era negro também. Mas não conseguia me aproximar de mulheres negras, isso nunca. Somente consegui isso com você. Os homens todos com dinheiro assim como eu. Acho que a pobreza  também me causava horror — ele olha para mim, e logo desvia o olhar. — Ela foi presa e morreu na cadeia de tanto bater com a cabeça nas grades implorando por drogas. Em momento algum ela chamou ou perguntou por mim. Mesmo sem lembranças dessa época, parecia que eu sabia que fui rejeitado e criei essa barreira.

— Niko, ela era doente e precisava de ajuda. — Ele seca as lágrimas e finalmente me olha.

— Sabe como vi essas fotos e soube o que aconteceu com ela Bella? Pela mídia. Quando ganhei meu primeiro milhão, fizeram a seguinte reportagem  "DO LIXO AO LUXO" junto com todas as aquelas fotos de mim na lata de lixo e dela na cadeia. Graças a Deus não me pareço muito com ela, apenas os olhos. Quem foi o homem que me fez? Ninguém sabe, nem eu.

— Chega Niko. Isso é passado .

— Consegui abafar tudo, mas aquilo me destruiu. Saber é uma coisa, mas ver e outra muito diferente, Eu queria morrer de tanta dor e vergonha. Minha própria mãe não me quis e a partir daí, mais ódio das negras eu tive. Fui no fundo do poço e me entreguei a bebida. Meus pais me colocaram à força em uma clínica de reabilitação.

Deus que dor.

— Você não teve culpa. Nem um ser humano é igual ao outro.

Ele olha novamente para o mar.

— Nunca mais perdi o controle. Continuei a beber, mas apenas socialmente. Contudo, quando li o que seu falecido fez a você e vi que fiz o mesmo ou pior, mais uma vez meu mundo ruiu. Eu só queria esquecer e ficar sozinho de tanto ódio que senti de mim.

Leu aonde?
Ele volta a me olhar e continua...

— Quando falei aquilo e você ouviu, tentei me convencer que era melhor assim. Me mantive longe e só ligava as vezes para Isaque, pois eu precisava ter certeza que você estava bem. Porém, quando te vi com Miguel perdi a cabeça. Eu queria chamar sua atenção e mais uma vez estraguei tudo e acabei ouvindo o que nunca quis, e doe pra caralho. Só ali compreendi que por causa do meu passado eu tinha perdido a minha chance de ser feliz. Sei que deveria me manter distante, mas não consegui. Eu te queria de volta independente da sua cor. — suspira sem tirar os olhos dos meus. — Quando retornei pra cá e li o dossiê; descobri que realmente não te merecia. Você está muito melhor sem mim. Mas eu preciso ao menos do seu perdão. Meu medo de ter filhos não é apenas com você. Não posso correr o risco de ter um filho parecido com ela.

— Mas você disse bebê pretinho.

— Eu sei. Mas isso poderia acontecer até se você fosse branca, tambem não posso ter uma criança que nunca saberá suas origens. Eu odeio aquela mulher Bella e sei que você gostaria de ser mãe algum dia.

— Quem perdeu foi ela, não você.
Você me pede perdão mas é incapaz de perdoá-la. Ela era doente Niko.

Você não. Pensei mas não falei.

— Ela podia ter me abortado, teria sido a melhor opção.

— É isso que você realmente acha? A vida te deu amigos e uma família que te ama. Quantos não tiveram a mesma sorte e trilharam o mesmo caminho de seus pais?

— Isso é verdade. Minha família sempre me amou e hoje percebo que realmente tenho amigos.

— Então? Ao menos tente perdoá-la, para que você possa seguir em paz.

Ele baixa o olhar.

— Então você não vai me perdoar? Você foi a única negra que eu me aproximei. Sem saber o porque, eu me preocupei com você. Eu juro que não queria, no entanto sem me dar conta começei com os flertes, e quando fizemos amor... eu me senti em paz, uma paz que eu nunca havia sentido. Mesmo sem saber, eu já te amava.

— Já te perdoei. Levanta dai e segue a vida.

—  Será  que eu posso ao menos te dar ao um abraço Bella?

— Pode sim Niko — Respondo me levantando assim como ele.

Ele me abraça forte e depois beija meus cabelos. Deus! Como eu amo esse homem! Realmente o passado dele não foi fácil e seu relato me doeu na alma.

Ele se afasta e pela primeira vez desde que cheguei, vejo ele dar um leve sorriso.

A noite chegou e eu nem percebi, me afasto deixado ele lá. Entro na casa e vou até a cozinha ajudar Joe a terminar de fazer o jantar.

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💋beijos da Aline💋💋.

Chorei aqui.

NA ILHA 🔞   Där berättelser lever. Upptäck nu