II

53 0 0
                                    


O dedo estava cansado de tanto arrastar rostos desconhecidos e inúteis para o lado esquerdo da tela do aparelho. O movimento já tinha se tornado automático, deve ter passado alguém aproveitável naquela loja humana, mas não o viu, seu olho apenas enxergava, não conseguia distinguir algo.

O clima estava mais frio naquela época do ano, os ventos sopravam mais violentos e um deles fez fechar a janela, a qual permitia que a brisa corresse dentro de casa. Isto a chamou sua atenção, já que fizera um barulho e a tenha tirado da hipnose, com a janela fechada, a casa ficou abafada e tomada pela escuridão, já que não gostava de luz elétrica para o dia, tratou logo de ir abrir a janela. Cuidou que ela não voltasse a se fechar mais, como nos velhos tempos, pós um papel cuidadosamente amassado em suas dobradiças, não queria levantar sempre da sua confortável poltrona preta com bolinhas vermelhas, uma vez que se aconchegasse nela, seria difícil encontrar novamente sua posição mágica.

Quando havia se sentado em seu trono, o celular a surpreendeu, um número não registrado, mas conhecido estava chamando. Hesitou em atender, sabia muito bem o que ia acontecer se ousasse dizer um "alô" para a pessoa do outro lado da linha. O barulho infernal zunindo em seu ouvido lhe convenceu a acabar com a tormenta. Atendeu, por fim.

— Oi.

— Como é bom ouvir sua voz, pensei que não iria atender, minhas esperanças já estavam acabando. Já faz um ano...

— É, eu sei disto. Preciso mudar o ringtone do meu celular, é infernal.

Um riso estridente surgiu do outro lado.

— HAHAHAHAHA... Você continua muito engraçada.

— Hum, tanto faz... O que queres?

— Presumo que já saiba, mas não me custa lembrar-te qu...

— Pera! Se for aquele papo novamente de que você é diferente e me entende, que se eu lhe der mais uma chance e deixe meu bobo medo de lado poderemos, assim, ser felizes, não aguento mais ouvi-lo.

— Mas e-eu...

— Olha, acabou, entendeu?! Preciso desligar, o meu café é mais fervoroso que esse nosso romance.

Não esperou nenhuma resposta e antes que ela fosse dita, desligou o celular. Ele ligaria outras vezes, ela sabia, por isso deixou o aparelho no silencioso e foi tomar seu café da tarde, o eterno companheiro.

Viúva negraWhere stories live. Discover now