CAPÍTULO 1-ANTES DA TEMPESTADE

3.4K 199 27
                                    



Foi acordado pela torneira da pia.

Deveria mandar arrumarem aquilo. O valor das contas de água ultimamente não fechavam com o valor de sua conta bancária.

_Deveria mandar arrumar esta torneira._reclamou o parceiro ao seu lado, como  se tivesse lido os pensamentos do dono do apartamento.

Era lindo ver Otávio acordar. Ele tinha um jeito de gatinho manhoso quando se desenrosca lentamente e pisca os olhos de uma forma deliciosa, como se tentasse se reconectar à realidade.

_Eu vou mandar._sussurrou Pedro baixinho sem querer que o outro  acordasse de todo, mas sem querer que Otávio pensasse que ele não dava valor aos seus conselhos.

Otávio não se virou.

O quarto voltou a ficar em silêncio...apenas o som irritante da torneira da pia.

Teria voltado a dormir?

Deslizou a mão lentamente, feito cobra que se desenrola traiçoeiramente para não assustar a presa.

Otávio levou um pequeno susto.

_Preciso me arrumar. Meu pai vai me pegar perto do museu, daqui a pouco_avisou o rapaz.

Pulou da cama sem pudor, mesmo estando  nu daquele jeito.

"Por que a vida tinha que ser uma merda de um cronômetro?", pensaram os dois ao mesmo tempo, mas não verbalizaram.

Pedro escorou a cabeça com a mão esquerda. Adorava ver o parceiro naquela forma totalmente descompromissada de se deslocar pelo quarto desarrumado...deveria arrumar aquele quarto... pegar suas roupas espalhadas pelo chão...no minuto seguinte, aquilo já não o incomodava mais.

Cueca branca, calça jeans cheia de buracos, surrada. Camisa polo branca com a logo da loja onde Otávio vendia peças para computador.

_Hoje é segunda-feira. Tá todo mundo voltando pra casa. Hora do rush...fica mais um pouco. Seu pai  vai se atrasar. Sempre se atrasa.

Pedro tentava não parecer controlador. Só queria que ele ficasse mais um pouco.

É errado querer parar o tempo quando se está feliz?

_Não hoje. Hoje ele não pode se atrasar. Tenho dentista às seis, lá no Centro._avisou Otávio.

Ajeitou os cabelos no espelho do pequeno banheiro.

Não precisava.

Otávio ficava lindo de qualquer jeito.

Ouviu ele abrindo o armário do banheiro.

_O enxaguante bucal acabou._gritou o rapaz.

_Deu pra você?

O rapaz assentiu. Pedro ficou menos arrependido pela sua distração.

_Então não tem problema. Compro outro quando for por o lixo pra fora. O lixeiro passa amanhã e a farmácia fica logo ali na esquina.

Pra que esclarecer aquilo pra Otávio? O que ele pensaria? Que Pedro se tornara um velho metódico, que seguia programas, regras, horários, uma rotina...talvez até tivesse uma agenda, o terror do pessoal jovem.

Tentou consertar.

_Ou posso comprar amanhã, quando voltar do trabalho.

Otávio estava amarrando os tênis.

Os cabelos caíram no rosto. Bonito assim. Parecendo um jovem roqueiro.

Estendeu a mão quando ele passou e o puxou para um último cheiro.

VOCÊ VEM?-Armando Scoth Lee (Revisado em 2020)Where stories live. Discover now