capítulo 1

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A primeira coisa que senti foi uma fria sensação de voar, o peso do meu próprio corpo pairando no vazio. Então abri os olhos.

Era um mundo embaçado, em tons de azul. Raios de luz iluminavam o tecido verde que flutuava na minha frente. Soltei o ar devagar e vi as bolhas subindo, por entre os raios de luz, até desaparecerem. Por um momento, foi mágico. Até me dar conta que não podia respirar.

Comecei a bater os pés e a empurrar a água para baixo, lutando com todas as forças para alcançar a origem da luz, para não respirar ainda, e continuei tentando mesmo quando engoli um pouco da água gelada. O pulmão ardeu, a pressão esmagou meu peito e a água pareceu criar garras que tentaram me arrastar para as profundezas, até que finalmente alcancei a superfície e consegui respirar um doce fôlego de vida.

Tossi, cuspindo e arfando.

Ainda sentia frio, mas, desta vez, ao abrir os olhos, fui saudada pelo sorriso de uma lua crescente. A alguns metros, depois da lagoa, árvores formavam uma densa parede verde que espetava o entardecer.

Tremendo de frio, nadei com o resto de forças que tinha até cair na margem enlameada. Então respirei fundo.

Respirei. De novo. E de novo.

Ainda não tinha me recuperado completamente, quando escutei uma voz vindo de dentro da floresta:

— Eu acho que ouvi alguém na Lagoa da Vida!

"Sim, por favor, eu tô aqui."

Mas as palavras não chegavam até a boca.

— Já é quase noite — outro alguém respondeu, uma voz velha e torta. — Temos que ir.

"Não!"

— Aqui — consegui empurrar um gemido.

Mas, no instante em que ouvi a minha voz, senti-me estranha. Muito estranha. Era... como se estivesse escutando-a pela primeira vez.

Apoiando as duas mãos no chão, testei forçar o corpo para cima. A tentativa de me levantar não funcionou e eu caí de novo. "Por favor, não vai embora!"

— Eu falei, tem alguém ali. — A mesma voz, só que mais perto.

E então um garoto surgiu de dentro da floresta. Veio correndo na minha direção, segurando uma tocha, o brilho do fogo iluminando as ondas de seu cabelo negro. Parou a um passo de mim, sorriu e abriu os braços.

— Bem-vinda à Terra do Nunca.

Eu apenas pisquei os olhos. Ele me estendeu a mão livre e, com aquele apoio, consegui me levantar. Meu corpo balançou de um lado para o outro, como se não estivesse acostumado a ficar de pé. Engraçado.

— Eu sei, é estranho. — O garoto riu, apoiando meu braço.

— O que... aconteceu?

— Você Despertou.

Balancei a cabeça, olhando ao redor.

— Eu sei que é confuso, mas a gente precisa ir — ele disse. — Não é seguro aqui.

— Como você sabe? — Puxei meu braço de volta.

— Hã... Porque eu moro aqui.

Pelo mesmo caminho de onde o menino viera, a voz torta nos alcançou, aguda e apressada:

— Leviiiii!

O garoto me fitou novamente e, desta vez, pude ver o medo no cinza de seus olhos. Um medo genuíno.

— A gente precisa ir, tá quase de noite e a floresta vai acordar. — Ele tornou a esticar a mão. — Confia em mim, vem.

Olhei para trás. A lagoa escura parecia mortalmente linda, refletindo a luz cada vez menos brilhante do céu. De repente, tive a impressão de ver, lá no outro lado da margem, um vulto se escondendo atrás das árvores. Um arrepio me fez estremecer. Voltei para frente e segurei a mão do garoto.

Andando a passos vacilantes,eu o segui floresta adentro pelo caminho estreito.

Se Pudesse Contar as EstrelasWhere stories live. Discover now