Capítulo 3

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O plantão chegou ao fim às sete horas. E o meu nome ganhou a sala, não como um elogio forçado, mas em forma de crítica. Não era o residente a me denunciar, e sim, uma das enfermeiras. Implorar por uma assinatura na minha lista de presença não era do meu feitio. Poderia, simplesmente, manipular a médica preceptora e conseguir quantos carimbos quisesse. Mas não usaria das minhas habilidades assim. A cautela me mantinha a espreita, fora de maiores suspeitas.

Desci a rampa e fiquei tentado a passar pela área dos maqueiros, queria dar mais uma olhada naquele que inspirava a voltar para este hospital. Mas vê-lo com os olhos fundos, inexpressivos, em nada me traria conforto. A culpa seria acentuada. Cada nova possessão era um passo em direção a um estado depressivo terminal. Perdiam a vontade de viver, respondiam com pouca paixão aos estímulos externos. Talvez estivessem tão acostumados a receberem ordens que, inconscientemente, esperavam por elas, dia após dia. Eu já tinha acompanhado o declínio de um antigo amante. Não poderia levar outro aquele estado. Ainda assim, saí tentado pelo saguão do hospital. Quantos homens mais se perderiam diante de mim?

Pego o carro e ganhos as ruas. O trânsito da manhã já me estressa. Qualquer infeliz que se ache digno de apertar a buzina, é merecedor do meu castigo. Quantos encontravam o meio-fio de forma súbita? Um sujeito em sua enorme caminhonete vinha costurando os demais carros. Era a lei do maior veículo, diziam meus colegas. Eu, todo poderoso, me atrevi a impedi-lo de passar. Teria de aguardar junto dos demais carros populares. Não era ele melhor do que os demais. O motorista, então, passou a acelerar em resposta, se aproximando e muito do meu pequeno carro. Pelo retrovisor alcancei seus olhos. Pelo restante do dia, ele dirigiria a menos de trinta quilômetros por hora, recebendo assim, as buzinas dos demais. Sentia-me um justiceiro, minha justiça, no entanto, era frágil e susceptível as minhas alterações de humor.

Chego em casa e encontro uma das moradoras da república sentada na mesa da cozinha. Ela, seu computador, e suas infindáveis videoaulas. Ocupava um cômodo de comum uso. Tanto se preocupava em mostrar eficiência, que deixava de perceber quando sua presença não era requerida. Pisei na sala e subi para o quarto. Travaria uma discussão como uma pessoa normal, ou me levaria pelas facilidades do meu dom? Não ter de aturar um sermão me fez levá-la para fora, em meio a calçada poderia se fazer notar por um maior público. Joguei-me na cama e cerrei os olhos. O cansaço me abatia. Era hora do acerto de contas.

Os sonhos me jogam em meio a promiscuidade de um mundo libertino. Ejacular diariamente afastava o erotismo, tornando-o banal. Talvez fosse hora de transar. Com um vivo, de membro pulsante e brilho nos olhos. Levanto no início da tarde. A casa está vazia, um alívio arremata meu corpo. Poderia caçar em meio a mata. Veados faceiros correm soltos esperando alguém que os abata. Acelero até a curva. A entrada me leva a uma rua paralela, outros carros ali estacionados indicam que a temporada de caça está aberta. Desço do meu e adentro em silêncio o conjunto de árvores. Não há mato sobre os pés, o local é tão movimentando e pisoteado, que a natureza é incapaz de persistir. Ando poucos metros até encontrar a primeira dupla de desajustados. Um dos homens salivava no pênis desconhecido. O receptor me encarou por um instante, questionando se teria feito a melhor escolha. Fujo dos seus olhos, e me embrenho ainda mais. Uma pequena roda de cinco homens estimula o dote alheio. É hora do titereiro iniciar seu show! 

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