Part 2

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A mudança...

Desci as escadas, temerosa. Embora fosse uma mulher, ainda respeitava minha mãe o bastante para ter medo de tomar xingo.

Quando cheguei à porta da cozinha, ela estava com a cabeça abaixada, as mãos apoiadas na pia, e os ombros retesados, claramente entristecida.

Aproximei-me da mulher que eu mais amava, e coloquei minha mão em seu ombro esquerdo, ficando ao seu lado.

Devagar ela ergueu seu olhar para o meu rosto, e percebi que chorava. Em um impulso puxei-a para o meu abraço, acalentando-a, sem saber sequer o motivo.

Acreditava que fosse saudade do meu pai, que se foi há tão pouco tempo, que era impossível que ela tivesse se acostumado com sua ausência.

Ouvia o seu lamentar baixo, e sentia seu peito subir e descer, tentando controlar suas emoções. Dizia-lhe que estava tudo bem, que eu estaria sempre ali, ao seu lado. Queria demonstrar que eu entendia a dor que ela sentia, mas que se precisasse de um pouco mais de força, eu lhe daria a minha.

Minha mãe se afastou um pouco, sorrindo discretamente para mim. Seus olhos verdes e cabelos pretos não eram mais tão reluzentes como antes, mas continuava sendo uma mulher linda e elegante, embora a tristeza tenha feito morada em seu olhar.

— Minha princesa linda. Sempre tão doce e forte. Tenho tanto orgulho de você, Mer — mamãe disse, e o tom de despedida com que pronunciou essas palavras que tantas vezes eu ouvi, me intrigavam.

— Dona Elinor, você não me engana. Atrás desses elogios vem sempre um problema. O que é dessa vez?

— Sou tão transparente assim, minha menina? — perguntou, secando as lágrimas que ainda escorriam pelo seu rosto.

— Sim, mamãe. Você é. É alguma coisa com a empresa? Alguma reunião que eu me esqueci?

— Não, não — ela tratou de negar rapidamente, sacudindo a cabeça negativamente. — Estou com medo, filha.

— Medo? De quê?

— Depois do acidente comecei a sentir uma tontura estranha, algo não está normal.

Citar o acidente sempre me deixava constrangida e, no mínimo, irritada. Afastei-me da dona Elinor, circulando a mesa da cozinha, e fingindo estar interessada nas frutas que estavam no centro, em uma vasilha de vidro transparente, contrastando com o forro floral.

Assim que meu pai morreu, entrei em desespero. Saí dirigindo furiosamente, achando que assim encontraria o assassino dele. A única coisa que encontrei foi o carro de minha mãe em um cruzamento, o que lhe causou hematomas que até hoje podiam ser vistos.

Acreditei que finalmente conseguiria deixar esse passado adormecido, guardado com as lembranças tristes de sua perda. No entanto, o destino parecia querer me machucar mais uma vez, e demonstrar que um erro tem sempre consequências. E na maioria das vezes, elas não podem ser esquecidas.

IndomávelWhere stories live. Discover now