VINTE E SETE

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Atravessamos a imensa porta de madeira a passos arrastados, ainda sem conseguir entender em que momento nossa situação tinha mudado — e como podia ter mudado tão rápido. No escritório, diversos grupos de pessoas sussurravam, nos acompanhando com olhos cheios de curiosidade.

Um peso deixou os meus ombros e a minha cabeça.

De sua mesa, a secretária de Lírio pousou seu telefone no gancho e depois nos ofereceu um sorriso fraco. Por trás dele, seus olhos estavam tão assustados quanto os de todos os outros ali e eu não pude deixar de pensar que o presidente tinha razão. A cidade viraria um pandemônio quando descobrisse sobre Otelo e seu tio.

"Meus parabéns por provarem a sua inocência", a secretária disse. "O Senhor Ildeveluf providenciou uma escolta para vocês." Então, ela apontou para três guarda-costas imensos, que esperavam em silêncio do outro lado do saguão. "Eles vão encaminhá-las para o elevador mais próximo, para que possam voltar às suas casas com conforto." A mulher digitou mais alguma coisa em seu computador e então abriu um sorriso forçado. "Preciso que assinem alguns documentos. Vou providenciar uma cópia pra cada e já volto."

Tam abriu um sorriso fraco.

"Obrigada", disse. E enquanto a secretária se afastava, sussurrou: "Finalmente." Tâmara apertou a ponta dos dedos nas têmporas e depois esfregou os olhos com força. "Vamos achar a Eliana logo e dar o fora, Marcele", completou, pousando uma mão em meu braço.

"Tam. Eu... não sei", eu disse baixinho. Tâmara parou e eu puxei o meu braço delicadamente. "Desde que eu saí daquela sala, parece que algo mudou. O Otelo..." suspirei uma risada irônica. "Como aquele Otelo pode fazer algo assim, Tam? Matar fadas por dinheiro? Fazer contrabando de gente? Que motivo ele teria? E você acha mesmo que duas pessoas podem, sozinhas, fazer algo assim durante tanto tempo? 'Cê não acha nem um pouco estranho?"

Tâmara respondeu como num ato reflexo:

"Não julgue um livro pela capa." Ela parou. Respirou fundo, como se pensasse uma segunda vez. Depois disse: "Marcele..." suspirou. "Ah, Má. A gente 'tá tão perto da liberdade!"

Aquilo... doeu. Foi uma dor pontuda, aguda, comprida. Foi doloroso ouvir aquilo da mulher mais generosa que eu já conheci. Aquiesci.

E como se ela pudesse ler meus pensamentos, Tam disse:

"Estamos livres, Marcele."

Parei por um momento. Dois. Então disse:

"Mas Otelo e Pinheiro estão a um passo do cárcere", murmurei. "Talvez injustamente." Eu poderia continuar investigando, pensei. Se eu tivesse o diário, poderia... "Merda. Esqueci de pegar o diário." Estalei a língua. "Espera aqui, vou lá buscar."

Tam levantou uma sobrancelha.

"O diário é uma prova Marcele. Você não pode simplesmente pegar ele."

Apertei os lábios, meus dedos se torcendo nervosamente uns contra os outros.

"Eu sei, mas... prometi que ia tomar conta do diário, Tam. Pro Tales."

Ela suspirou.

"Isso não faz sentido. Lírio não tem motivo nenhum pra te entregar nada, Marcele."

"Eu penso em alguma coisa. Já volto."

Tâmara se apressou para me alcançar e disse: "Eu vou com você."

Sem esperar, atravessou a porta de madeira de volta para o longo corredor branco. Passamos pelas estátuas e bustos em mármore, pelos muitos retratos de paisagens e pelo imenso quadro de Lírio, desenhado naquele traço infantil e adorável.

Assassinato no Mundo das Fadas (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora