primavera;

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O garoto, parado embaixo da cerejeira, sentia a brisa bagunçar seus fios, assim como os galhos da bela árvore. Tudo a sua volta parecia brilhar, esperando calmamente a chegada da nova estação; a calmaria do céu azul e a grama verde-escura misturados com o leve cheiro de terra molhada. Ainda era cedo para a velha cerejeira florescer; talvez em alguns dias. Esperaria junto a ela, pelas flores cor-de-rosa. Se sentia bem ali, perto da sua companheira. Não era a primeira primavera que passaria lá, também não seria a última. Aquele lugar era um tanto especial para o pequeno rapaz de fios claros.

Já estava acostumado com a brisa, o cheiro, as sensações. Tudo ali lhe trazia paz; lhe fazia bem.

O sol estava se pondo, foi quando ouviu os passos calmos partirem alguns galhos perto dali. O barulho parecia distante, mas conseguiu chegar até ele.

Seu coração acelerou.

E os passos se aproximaram, lentamente. Não era comum encontrar alguém por ali; um dos motivos de ser seu local favorito — ele tinha paz.
Em alguns segundos, uma figura se fez presente por entre as diversas folhas. Era um outro garoto. Seus cabelos tinham a mesma cor da terra na qual pisava e os olhos eram tão escuros quanto o céu noturno.

Era bonito.

Observou. O outro parecia perdido em meio as árvores; não apresentava preocupação alguma, porém. Parecia fascinado com a natureza que o cercava. Viu-o fechar levemente os olhos e a brisa soprar seu rosto, arrastando os fios castanhos para trás.

Ele era lindo.




No dia seguinte, o garoto de olhos escuros retornou. Mais uma vez, o loiro se pôs a observa-lo. Seu modo de andar sobre a grama e como seu cabelo era bagunçado pelo vento vez ou outra. O garoto misterioso ficou mais tempo dessa vez. Tentava não fazer barulho, para não ser visto. Queria olhá-lo. Ele era alto e sua pele era iluminada pela luz do sol. O rapaz mirava o céu; até encontrar com os olhos daquele garoto baixinho, sentado sob a cerejeira. Os orbes castanhos do menor se encontraram com aquela imensidão negra, pela primeira vez.

Seu coração acelerou.

O moreno se aproximou; curioso. Notou que era observado meticulosamente pelo rapaz loirinho embaixo da enorme cerejeira; tinha uma das mãos apoiada na árvore e suas bochechas carregavam um tom rosado, como as flores que viriam a desabrochar. Era fofo.

Caminhou até a árvore que abrigava o garoto, ouvindo os galhos serem remexidos pelo vento.

Sorriu.

O de fios claros não disse nada.

O ar pareceu fugir dos seus pulmões, mesmo cercado pela brisa amena que cobria a floresta; silenciosamente encantado em poder observar o outro de perto.

O sorriso dele era lindo.






Ele voltou novamente. Trouxe consigo o sorriso, os olhos negros e uma euforia desconhecida ao andar novamente por aquela floresta. Não ouvia nada, além do tilintar dos galhos e o vento soprando. Andou em passos descompassados; estava ansioso. Avistou a brilhante árvore, se destacando das demais. Ainda não havia florescido, mas logo iria. Ao se aproximar, conseguiu enxergar o mesmo garoto recostado no tronco da árvore. Respirava calmamente, o peito subia e descia, o ar escapando entre seus lábios. Estava dormindo.

O moreno se sentou no pé da árvore, ao lado do adormecido. Olhando como tudo parecia respirar calmamente a sua volta, assim como o garoto deitado sob a cerejeira. As folhas, a terra, as frutas, os galhos. Era visível que logo as flores desabrochariam.

A primavera estava chegando, afinal.

Olhando para o lado, o mais alto mirava o rapaz em seu sono. Alguns fios loiros caíam sobre seus olhinhos fechados. A expressão serena combinava com o clima que os cercava. Seu rosto carregava o mesmo tom rosado da última vez; sua boca entreaberta fazia um barulho mínimo ao liberar o ar dos pulmões. Queria tanto poder vê-lo sorrir.





Naquele dia, o loiro estava bem acordado. Observava o horizonte levar o sol embora; pouco a pouco. Silenciosamente, havia torcido para o rapaz do outro dia aparecer. Mas o sol já estava se pondo, ele não viria. Continuou sentado, sob a árvore, admirando o céu de cores variadas, declarando o pôr-do-sol e sua beleza.

Ouvia passos, ao longe.

Eram apressados; descompassados. Quebravam galhos.

Seu coração acelerou.

O rapaz apareceu, repentinamente. Sua respiração entrecortada e uma das mãos ao peito; seus olhos buscavam freneticamente os fios claros. Será que ele havia ido embora?

Sorriu, porém.

Os olhos se encontraram e ele sorriu, aliviado.

O menor lhe fitou, atônito.

Ele veio.

Comprimiu os olhinhos castanhos e os lábios se afastaram levemente.

O moreno pode enfim ver seu sorriso.





Juntos, sentados sob a cerejeira. O vento soprava suas roupas e desarrumava seus fios já desarrumados. Os dois riam. O lugar estava repleto de cores e vida; sorrisos. Miravam a árvore, agora, coberta por tons de rosa-claro.

Se olhavam.

A primavera finalmente havia chegado.

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