Capítulo 35

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                                  Respostas

                                ~ Melanie ~

    Eu perdi a conta de quantos dias fiquei presa, de quantas noites chorei e de quanto tempo me nego a comer. Tudo que eu queria, era chegar em casa e me afundar no travesseiro. Lembro-me do dia em que ficamos na pousada, de tudo, e logo então percebi que havia muitas perguntas à serem feitas...

     Quem era de fato Jacob? Ele planejava mesmo tudo o que havia dito? Pois se fosse, eu jamais conseguiria voltar pra casa. Eu havia pegado escondido meu celular na gaveta, quando o pedi para ficar sozinha e logo depois me tranquei no banheiro. Ele arrombou a porta do banheiro quando viu que eu não sairia, mas não me machucou. Suas reações agressivas com às coisas em sua volta me assustam, pois à cada dia aumentam. Era visível sua abstinência por álcool. Ele queria beber, mas de certa forma tinha medo do que ocorreria se bebesse, e eu mais ainda.

     Com meu celular em mãos, era tudo um perigo. Eu teria que ligar a localização, pois sabia que tentariam me rastrear. Jacob está em algum outro cômodo, pois nem eu sei onde estou. Tudo é de madeira e rústico. Escuto as cigarras cantando à noite, e posso jurar que elas se calam para me escutar chorar, jurar também que as estrelas entendem o meu sofrimento, vivendo reclusas em uma imensidão de poeira.

     Eu precisava colocar o celular no silencioso, ou tudo iria por água abaixo. Jacob entraria à qualquer momento, para me convencer de que deveria me alimentar, mas a verdade é que eu tinha muitos receios, principalmente sobre ter algum veneno na comida. A gente paga um preço muito caro pelos momentos inesquecíveis, ó saudade, por que me tratas assim? Mãe, minha mãezinha, o que eu não daria para estar com você agora.

     Eu não era de muito afeto, mas eu sei que era uma boa filha. Sei que nesse exato momento, minha mãe pode estar chorando, e se eu soubesse que a última vez que à vi, poderia ter sido mesmo a última, teria dito o quanto à amava. Não ter se despedido é o que mais dói. A falta de um último adeus. Teria eu coragem de tentar fugir? Eu teria que tentar, pela minha mãe, pela minha família, e por mim mesma. Eu sairei daqui, Jacob, sairei!

     ___ No que tanto pensa?___ Jacob entra no quarto sem que eu nem tenha me dado conta. É sempre, péssimo, vê-lo.

___ Na minha mãe Melinda...

___ Charllote? Sabe me dizer dela?___ Nesse momento, me recordo das cenas em que ela apanhou. De como sofreu nas mãos dele. Do quanto ela chorou. Lembro-me do meu irmão e seus quatros infantis, com lados sombrios.

___ Ela está bem agora.___ Me restringir a dizer isso, pois não saberia qual a reação de Jacob se não dissese alguma coisa.

___ Ah sim. Hoje em dia, vejo que ela ter ido embora foi a melhor coisa que fez. Não que eu à despreze, mas sei como mereço ser desprezado. Eu queria a oportunidade de pedir perdão à ela também.

___ Não a sequestrado como fez comigo, quem sabe ela não te perdoe.

___ Também tem seu irmão. Como será que ele está. São tantas perguntas. Ao menos tenho você agora.

___ Contra minha vontade, mas tem.

___ Logo tudo vai se encaixar.___ Ele levanta em rumo à porta. ___Até logo minha menina. Coma algo e não se esqueça de tomar banho.

      Se eu fosse julgar a forma como Jacob fala, e gesticula, poderia dizer que ele é um bom pai, mas como eu estou com os pés acorrentados, presa em um quarto velho e já fui abusada sexualmente por ele, me impede de dizer que ele é bom pai.

     Assim que Jacob bate a porta, meu coração dispara. O celular que depois de dias consegui pegar de volta, toca... Escutei passos, e naquele momento, por mais uma vez dentre tantas, quis morrer.

                              ~  Jacob ~

    
     É desagradável, estar com quem você queria, mas saber que a pessoa não se sente bem. Dói, machuca e fere. Se sou egoísta? Ando trabalhando nisso. Tenho que melhorar, e só ao lado da minha filha poderei. Ela tem que me perdoar, ou nunca serei feliz. Se ela é mesmo minha filha? Não, porém, não vou deixar que saiba.

      Preciso ser um pai, aos poucos, para em fim compreender o que perdi esses anos. Perdi minha família e minha dignidade. Jamais deveria ter cometido os mesmos erros de meu pai, que tanto julgava. Pobre Charllote, que por amor à um lixo como eu, viveu anos ao meu lado, sendo privada até dos seus sonhos. Mais pobre ainda sou eu, de alma e caráter. Melanie, por favor, aceite meu perdão e te soltarei, contra minha vontade. Só assim terei paz.

    Fui arracado dos meus devaneios. Escutando uma música que vinha do quarto onde minha filha estava. Desobediência, ela poderia ter pegado o celular. Não podem nós encontrar! Não podem me tirá-la! Não agora. Me exalto!

___ Melanie! ___ Ela está mais branca do que de costume. ___ Me dá esse celular agora!

___ Eu... Me desculpa.

___ Só me dá o celular! Eu tô gritando por raiva, mas prometi que não lhe machucaria e nem quero.

___ Eu só queria...___ Seus olhos enchem de lágrimas em uma expressão conhecida.

      Em algum lugar no tempo, me perdi e fiquei a deriva sem me encontrar, mas bem ali naquele momento, reconheci um velho eu do passado. Quando mais novo, tentava entender o coração tão duro do meu pai, e era sempre com lágrimas nos olhos que eu andava. Algo em mim, estava se encaixando.

___ ... Voltar pra casa. Jacob? Quando você era mais novo, sentia saudades de casa?

___ Não.

___ Por quê?

___ Porque infelizmente, eu assistia a cenas que até hoje me assombram, só que dessa vez, não é mais meu pai que está no lugar.

     Percebendo que teria falado de mais, tomo o celular de suas mãos e verifico tudo o que há de ser verificado. A localização não estava ligada. Perfeito, porém havia um registro de ligação de onze segundos... O que em teria dito em onze segundos? Esse Heitor, era mesmo um bom cara? Não quero à ver mal. Tanto tempo recluso em meu próprio mundo, tentando fugir do álcool e das drogas, para em fim compreender o quão mal eu fui. E eu me odeio todas as noites quando me deito e escuto novamente o choro daquela menina. Eu me odeio. Essa não é a forma correta de conseguir o seu perdão.

      Volto ao quarto, depois de horas. Precisei de tempo para pensar qual era o meu verdadeiro objetivo, e que precisava mudar às formas de executá-lo para alcança-lo. E se, de acordo com todos os livros que li, eu tenha mesmo todos esses transtornos mentais, preciso aproveitar meu momento de nitidez para fazer o que é certo. Melanie estava acordada, escorada e frustrada. Tão triste quanto uma lápide fria.

___ Eu sinto muito.

___ Pelo que agora? ___ Pergunta chateada.

___ Por ter mentido, ter te usado, ter batido em você na pousada, ter dito que estava morta. Sinto muito por não ter tido coragem de assumir minha culpa. Sinto por não ter princípios morais suficientes para indagar se Heitor será um bom marido... Sinto por Charllote, pelo meu filho, pela minha filha que morreu com leucemia, e por todas as vidas que já destruí.

___ E sabe de um coisa, Jacob? Tenha certeza, que todas essas pessoas, sentiram muito mais.

___ Você vai voltar pra casa, amanhã. ___ E com essas palavras me retirei.

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