Vermelho - Brtzraj'p

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Eu era um simples estudante. Eu sempre tive notas boas e vivia normalmente a minha vida, exceto pela minha grande atração pela solidão. Eu sempre gostei de fazer as coisas sozinho, estudar sozinho, aprender sozinho e até comer sozinho. Mesmo aos dezesseis anos de idade, eu fui pego pela doença da melancolia, dadas as circunstâncias, visto que eu pensava e refletia muito, para coisas além da minha realidade. Cursava o ensino médio em uma das melhores instituições da minha cidade e, mesmo sendo iniciativa privada, consegui adquirir uma bolsa de estudos devido às minhas condições financeiras e, talvez, meu próprio esforço na escola pública. Ficava constantemente perdido em minhas reflexões, e isso se tornou um problema com a brusca mudança de realidade. Mas não escrevo isso como uma autobiografia, visto que a partir de hoje, dia 18 de abril, eu não estarei mais nesse mundo. Escolher acreditar ou menosprezar meus relatos é uma escolha completamente do leitor em questão, quem quer que seja. Era dia 16 de maio, há cinco anos atrás.
Eu me lembro exatamente como as coisas aconteceram. Era como um dia qualquer, minha mente estava navegando pelos infinitos mares do mundo das ideias, mesmo após acordar. Eu preparava o meu café para mais um dia de estudos, eu já estava acostumado com isso; fazer outras coisas alternativamente, enquanto minha mente flutuava. Minhas memórias se tornam nebulosas depois de terminar o preparo do café, mas quando novamente se clareia, eu estou na escola, em uma das primeiras aulas do dia. A sala inteira estava silenciosa, afinal eles tinham noção do quanto aquele professor em específico era rígido com a questão do barulho, interrompendo a aula várias vezes, em anteriores eventos, para esbravejar sobre algum aluno. E, nesse silêncio quase absoluto, apenas com o som do roçar das canetas e o estralo de papéis atingindo meus ouvidos, minha mente novamente flutuou, como em um navio, pelo grande mar do mundo subjetivo, enquanto meu corpo fazia anotações. O mar poderia estar mais agitado que o normal, ou eu poderia estar tão focado em meus pensamentos que meu corpo simplesmente parou suas atividades, ficando a perscrutar a folha esbranquiçada parcialmente suja de tinta da minha escrita apressada e deformada. Eu me senti como se meu corpo não fosse meu; não que fosse a primeira vez que me sentisse assim, mas dessa vez eu consegui me prender a essa sensação. O mundo girou, como se o navio de minha mente estivesse dando voltas e mais voltas em um redemoinho aquático, cuja correnteza levava para o mais profundo abismo do infinito.
Eu me lembro de acordar com um som agudo e oscilante chegando aos meus ouvidos; lentamente eu abri meus olhos e vi que não estava na escola. Senti tamanha fraqueza em meu corpo que mal conseguia me mover; não que eu iria conseguir de qualquer forma, estando ele dormente daquela forma. Eu estava sentado, minha visão atravessava uma espécie de viseira de lente avermelhada, que deixava tudo com um aspecto monocromático e assustadoramente sanguíneo. Enquanto minha visão aos poucos adquiria algum foco, me senti horrorizado com a aparência cadavérica que residia na minha frente, presa a inúmeros cabos que pareciam se prender a várias partes de seu corpo, principalmente em sua cabeça. Por um segundo eu me perguntei se aquela figura na verdade estava morta, até escutar a horrível e seca inspiração por parte daquele ser raquítico. Era como se o ar estivesse passando por inúmeras pequenas aberturas enquanto fazia seu caminho até os pulmões. Eu senti uma angústia, um desespero terrível, coisa que nem ao menos sei descrever, ao acordar e não conseguir se mexer ou sequer respirar adequadamente, como se algo estivesse pressionando meu corpo com imensa força. Eu não sabia dizer ao certo se minha condição era tão parecida quanto ao do ser na minha frente, que se apresentava pior e pior a cada observação. Eu tentei fechar meus olhos, mas algo parecia me impedir, como se eu estivesse com uma assustadora falta de pálpebras. Meu queixo tremia e oscilava na tentativa de emitir sequer um pequeno som. O esqueleto à minha frente se apresentava em uma situação tão deplorável, mesmo com minha visão ainda altamente embaçada, coisa que se gravou na minha mente como escrituras em pedra. Havia uma quantidade muito pequena de cabelos se prendendo à decrépita cabeça da criatura, seus olhos estavam... Esbugalhados para fora, como se quase caíssem para fora de suas respectivas órbitas. Seus dentes estavam terrivelmente tortos e gastos, alguns quebrados; mas não sei identificar se estavam quebrados por mera ação natural ou pela interferência de outro ser vivo. Estava seco e pálido mas seus olhos estavam fixos no mesmo visor avermelhado que eu, e eles estavam cobertos por veias, cuja cor não conseguia discernir por conta da visão monocromática. Meus olhos desciam cada vez mais, mas eles fitaram o peito da criatura. Oh meu Deus, o peito daquele ser... Havia uma espécie de...
É impossível explica-la sem uma devida analogia. Era como um ouriço do mar, mas terrivelmente grande e muito mais pontiagudo e afiado. Os movimentos que os "cristais" agudos faziam era algo que eu não pude determinar como facilidade, mas pareciam girar, espetar e perfurar o cadáver na minha frente, principalmente nos braços. Eles se moviam numa lentidão terrível, e eu pude ver um dos ferrões... Ele entrava pela pele do homem e... Ah, é uma coisa que eu não me atrevo a dizer, visto que o mero relato disso poderia causar as mais sãs mentes a se corromperem e deturparem pela loucura.
Subitamente, minha audição captou pesados impactos se aproximando. Era muito rápido, como o trotar de um cavalo cujo casco era capaz de esmagar pedras. Subitamente a criatura parou na minha frente, se abaixando muito rápido e me olhando com aqueles... Olhos brilhantes e amarelos. Sua fisionomia era... Era indescritivelmente aterrorizante. Possuía quatro pernas piramidais e largas, se estendendo até a base do tronco do que parecia um ser humanoide. Sua pele era cheia de tubos que pareciam ser feitos de metal, que entravam e saíam de dentro da criatura e seus braços eram como as presas de um besouro, largas na base e se afinando quando se aproxima no que deveria ser algum tipo de ferrão, onde seria a mão de um mero ser humano. E seu rosto. AH! SEU ROSTO! ESTÁ EM TODOS OS LUGARES, E ME OBSERVA, ME OBSERVA COM AS SEUS DENTES COMO AGULHAS E SEU ROSTO SEM PELE.
Após a terrível aparição da criatura, ela se aproximou de meu rosto e sussurrou, mas sua boca sequer se mexeu. Sua voz alternava entre tons agudos e mais graves a cada sílaba, e pareciam estar vindo de baixo, do... Peito dela. Eu não ousei olhar para lugar algum a não ser para os terríveis olhos da criatura, que eram como duas esferas de vidro brilhantes e quebradas, como duas lâmpadas luminescentes. Era a única cor que eu conseguia discernir entre o avermelhado sanguíneo. Eu consegui captar, entre as palavras da criatura, um cântico inumano, que nunca esquecerei; nem como se escreve, nem como se pronuncia.

"Fitzs f'pvr vtosm'vs"

Eu senti uma pontada terrivelmente dolorosa, que me encheu do mais fundamental e profundo terror inerente na mente do ser humano, tão infinito e obscuro que eu não me atrevo a descrever ou sequer lembrar. A dor subiu pelo meu braço, percorreu meu ombro, subiu pelo meu pescoço e, por fim...
Eu senti meu corpo balançando de um lado para o outro, e uma pessoa praticamente gritando em meu ouvido. Aos poucos abri meus olhos e a olhei. Ao contrário daquela ilusão, daquele sonho, ou quem sabe da mais verdadeira realidade, minha visão rapidamente se adaptou e adquiriu foco, eu vendo meu professor e mais alguns alunos ao meu redor. Eu me levantei e senti sangue escorrer pelo meu nariz. Eu pude sentir o professor suspirar aliviado e me pedindo para sair e limpar todo aquele sangue que saía de meu nariz. A direção do colégio havia me dito que foi simplesmente um sangramento nasal; coisa que eu sabia que se tratava de uma mudança de pressão arterial que causou o rompimento de algumas artéria naquela região ou alguma outra ferida parecida. Mas, no âmago de meu ser, eu sabia a verdade.
A partir daquele dia, eu tive muitos outros ataques como aquele, simplesmente sendo sugado com uma maior facilidade para aquele redemoinho infinito. Eu estava com muito medo de dormir e meu comportamento mudou subitamente para o de uma pessoa altamente paranóica. Após um surto psicótico em casa, onde eu gritei e disse coisas indescritíveis e terríveis, fui obrigado a consultar com um psiquiatra, posteriormente internado nesta clínica infernal. Eu recebia doses e mais doses de pesados medicamentos, encaixando na categoria de esquizofrênico e psicótico.
Já faz quatro anos agora. Eu ainda o vejo, vejo aqueles terríveis ferrões no canto de meus olhos, oriundos não de um mundo completamente imaginário, mas de um mundo totalmente real; pois alguém nunca pode conhecer totalmente o que se reside além da própria mente, ou o que se esconde além da face ilusória da realidade. Eu estou convicto, aquele mundo existiu e, por favor... Que ninguém nunca mais o encontre de novo, que ninguém conheça a verdadeira natureza de sua própria e frágil existência, pois eu tenho certeza de que existem inúmeros outros daqueles lúgubres esqueletos humanos. Nossa realidade é somente uma grande e agradável mentira. É tudo mentira, mentira! Qualquer um pode despertar, e isso é algo que faz um arrepio surgir em meu corpo somente de pensar.
Eu escuto os impactos pesados por todos os lados- os olhos, os olhos!

Pajp'd!

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Tem algo grande vindo, meus humanos; aguardem!

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