Yizin's - Tumba, segunda parte

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... Durante a inconsciência da pesquisadora, ela escutou todo tipo de som grotesco, bizarro e sádico, como ossos se quebrando, o som molhado de algo devorando algo e gritos; coisa que ela não sabia se era verdade ou apenas ilusão de uma mente conturbada e em choque. Toda vez que tentava recobrar a consciência, algo a puxava para baixo, como se a sufocasse. Durante essas transições, ela não via nada mais do que um imenso vazio, uma escuridão gosmenta e fétida, inundando completamente seu corpo. E agora, definitivamente, a garota acordou em um grito que pareceu tão real quanto qualquer outra experiência extracorpórea que presenciou em todo o tempo que permaneceu desacordada.

Se levantando num susto, a mulher colocou as mãos em seus cabelos cacheados e escuros, apalpando-os como se checasse se eles estavam realmente ali, os puxando e bagunçando. Era uma sensação horrível, como se seu peito queimasse; o formigamento estava por todo o corpo, ela não conseguia sentir completamente seus membros e a primeira coisa que fez foi tentar apalpar os seus arredores. Embora esteja com os olhos abertos, era como se estivessem fechados; tamanha era a escuridão, absoluta e profunda. Ela não sentiu nada ao seu redor, exceto a superfície lisa e ao mesmo tempo gelada da pedra polida; ela presumiu, de imediato, que estava dentro da pirâmide. Em que parte, exatamente, desconhecia.

Ela começou a se arrastar para trás quando escutou um som molhado e rastejante se aproximando, além de impactos abafados e constantes, como se fossem passos. No entanto, aqueles sons... Não se assemelhavam a nada que sequer havia estudado ou compreendido sobre, coisa que lhe enchia com o mais profundo e primordial medo do desconhecido. Ela freneticamente tentou apalpar algo aos seus arredores, na precária condição de cegueira, em busca de algo para que se esconda atrás, até que suas mãos esbarraram numa grossa estrutura vertical que parecia também ser daquela mesma pedra polida e gelada, extremamente gelada. Com um esforço inumano, ela conseguiu se arrastar para trás daquela estrutura, que realmente não sabia o que era; mas pelo precário sentido do tato, ela imediatamente deduziu que era algum tipo de pilastra, embora sua mente esteja com medo demais para sequer pensar em outra coisa a não ser a auto-preservação.

Era a única coisa que tinha para se esconder, a única coisa que a separava de uma morte tão horrível quanto aquela de sua experiência extracorpórea. Tais cenas inomeáveis, tais monstros e criaturas além da compreensão... Dizem que a mente apaga experiências traumáticas como uma forma de preservar a si mesma, então ela não conseguia se lembrar, em detalhes, da experiência, como num terrível pesadelo. O vão entre a pilastra e o que parecia ser uma parede próxima a ela parecia minúsculo, mas com sorte a garota conseguiu se esgueirar entre as duas superfícies, se encolhendo ao máximo e colocando sua mão esquerda na boca, notando que ela mesma fazia uma careta aterrorizada e, apenas com o sentido do tato, notou que ela estava paralisada; visto que seu rosto também estava formigando. Isso acelerou ainda mais seu coração, sua respiração ficou ofegante e o que quer que esteja a espreita na escuridão estava perto, perigosamente perto. Ela escutou impactos mais fortes e raivosos, além do som característico de algo molhado e gosmento se arrastando. E então, novamente aquela voz, se é que isso pode ser chamado de voz... Um gargarejo, um afogamento sobre circunstâncias inimagináveis. Uma voz, ressoando do oceano, ou das profundezas mais guturais do inferno.

"Ibsw warl wkl! Ibsw warl wkl! Alxwesirual, oeubxuolk! I eurylk, I eurylk!"

Conforme a criatura se afastava para as profundezas da escuridão, novamente com aquele som raivoso e gosmento, se arrastando como cobras, a garota sentiu seu rosto aos poucos se normalizar, embora ainda esteja altamente assustada por conta do gigantesco terror que acabou de sentir. Ela se agarrou na pilastra, e a usou de impulso para se levantar e se manter de pé, tateando-a na escuridão. Somente agora sentiu o peso de seu corpo, e foi nesse momento que sua respiração finalmente começou a se normalizar, embora ainda ofegando, gemendo palavras incompreensíveis e sem fundamento. Ela fechou seus olhos por um momento, engolindo em seco, tentando aos poucos retomar sua consciência diante do que estava acontecendo, como uma cientista dedicada deveria fazer a todo momento. Mas, quando abriu novamente seus olhos, ela conseguia enxergar figuras na escuridão; corpos decrépitos e esqueléticos, mas quando tentava focar em algum deles, eles desapareciam. Soube de imediato que era obra de sua mente, por estar exposta à mais absoluta escuridão. Mas as formas pareciam estranhamente tangíveis, como se possuíssem profundidade, e emitissem sussurros, que atingiam e ensurdeciam os ouvidos da garota. Sua cor parecia impossível de descrever, e inclusive seu formato; como se os corpos de demoníacas cobras estivessem sendo transformados em corpos humanos, finos e alongados, e agora demonstravam seus corpos obscuramente argênteos no meio da escuridão. Aquilo era demais, demais para qualquer mente sã suportar. Ela tentou respirar fundo, fechar seus olhos mais uma vez, para não ver as formas, coisa que se mostrou inútil. Só lhe restava caminhar, caminhar pela escuridão, tateando as paredes e as pilastras, esperando chegar em algum lugar. E assim o fez, escutando seus passos ecoarem pela infinitude.
Ela não escutava sequer ar passando por ali, nenhum som, apenas seus passos, sua respiração e os ensurdecedores sussurros. O que quer que seja aquele lugar, sua extensão em comprimento parecia gigantesca, e a garota andava devagar, tateando sua lateral e sua frente até, então, atingir uma segunda parede, que se estendia para a esquerda. E então seguiu por ela, sempre tateando, roçando seus dedos em pilastras como se sentisse a textura e a temperatura gelada daquela gigantesca estrutura, onde quer que esteja. O pânico já estava tomando conta de si. O medo de se afastar e não conseguir retornar à gelada parede, de encontrar mais um imenso vazio; de cair ou simplesmente desaparecer na escuridão, junto com seus sentidos. O frio em seus dedos, em seus braços, era sua única prova de que ainda estava viva, ou pelo menos consciente. As lágrimas começaram a cair, sua respiração se acelerava, ela se apoiava mais e mais na parede, até chegar ao ponto de estar se arrastando por ela e pelas pilastras. Passaram-se horas, anos, décadas, anéis... Suas pernas já falhavam, seu corpo já doía, e ela se sentia muito cansada. O medo de morrer de hipotermia, no entanto, a deteve de perder a consciência; afinal era isso que motivava todas as criaturas vivas, desde os primórdios: o medo, o primitivo medo, naquele momento tão sufocante, tão avassalador que se sentia como afogar-se no Rio Estige.

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