Dando as costas ao passado

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Safira termina de colocar as últimas peças de roupa na mala e a fecha com um aperto enorme no peito.

Ela não tinha conseguido dormir a noite e as olheiras estampadas no rosto eram a prova disso.

Andando de um lado para o outro dentro do quarto todas as lembranças ruins passeiam em sua cabeça deixando_a ainda mais atordoada.

Como assim ela estava noiva?

Seu pai além de virar as costas para ela, estava a expulsando de casa. Claro, de uma forma bem sutil para não alarmar os seus preciosos eleitores.

Safira se sentia de volta ao século XIX onde os pais ainda arranjavam casamento para os filhos. Durante todo esse tempo ela já havia sido privada de tantas coisas e agora até mesmo a possibilidade de amar estava escapando entre seus dedos.

Seu reflexo no espelho a deixava irritada por que ela sabia que era uma garota bonita, e justamente por ser assim "bonita" ela sofreu todas aquelas crueldades.

Em um ímpeto Safira começa a socar o espelho em sua frente, fazendo com que o sangue começasse a escorrer entre seus dedos.

_Safira!?

_ Entre Olga.

_ O motorista está...Por Deus menina!

Olga era uma das empregadas que Safira mais tinha apreço. Ela quase sempre dava um jeitinho de trazer comida para ela quando o pai a trancafiava no quarto, e assim foi conquistando o carinho da jovem.

_ Deixa eu ver isso aí.

Ela se aproxima e segura a mão ensanguentada de Safira.

_ Você poderia ter se cortado Safira, você sabe que isso não vai levar a dor embora.

Ela enrola uma faixa de forma delicada pela mão de Safira. Era algo natural Safira viver enfaixada ou com curativos espalhados pelo corpo.

_ Você sabe pra onde estão me mandando?

_ Não, sinto muito.

Ela diz com lágrimas nos olhos enquanto se aproxima para abraçar Safira.

_ Ah menina, como eu queria que você pudesse encontrar a felicidade de novo.

_ Não se preocupe Olga, eu irei ficar bem. Sou uma sobrevivente e você sabe o que os sobreviventes fazem não é?

_ Sim, eles sobrevivem.

Olga responde com a voz carregada de pesar e os olhos voltados para o chão.

Essa era uma das frases que sua mãe sempre a dizia. "O tempo nos torna sobreviventes Safira, e sabe o que os sobreviventes fazem? Eles sobrevivem"

_ Obrigada por tudo Olga, eu nunca vou me esquecer de você. Tente cuidar de Lena e não permita que ela tenha ódio de mim.

_ Que nosso senhor a proteja minha menina, irei rezar por você.

_ Vamos Safira, não tenho o dia todo.

A voz do pai parado na porta preenche seus ouvidos fazendo com que um nó se formasse em sua garganta.

Juntando todas as forças que ainda haviam dentro de sí ela passa pelo pai rumo as escadas que a levariam para um futuro longe dali, um futuro ao qual ela não tinha a menor ideia se seria sua salvação ou o início de um novo pesadelo.

Ao chegar na porta da frente Safira para abruptamente ao ouvir a voz de Lena.

_ Sa...

Ela se volta para irmã que descia as escadas correndo e se enche de alívio ao perceber que ela não estava mais com medo dela.

Seu coração se aperta ao ver o pai barrar a irmã com uma expressão furiosa no rosto.

Ela não entendia por quê situações assim envolvendo seu pai ainda a surpreendia. No fundo ela sempre carregava uma chama de esperança de que aquele homem um dia se tornasse uma boa pessoa e um bom pai.

_Vá para seu quarto Madalena.

O rosto da pequena se torna vermelho e seus olhos se enchem de lágrimas.

_ Mas papai...

_Eu disse para ir.

Madalena fita Safira enquanto lágrimas escorrem pelos rostos de ambas.

_ Eu te amo Sa.

_ Eu também te amo pequena, não se preocupe eu vou ficar bem.

Lena sobe as escadas inconformada enquanto o pai se aproxima de Safira com sua mala nas mãos.

_ Cuide de tudo por lá Marcos.

Ele diz entregando a mala para Marcos, um dos seus homens de confiança e entra de volta batendo a porta na cara de Safira.

Com as malas já dentro do carro, Safira observa a casa onde viveu nos últimos anos. Cada canto daquelas paredes guardavam um pouco da dor que ela passou em todo esse tempo e por um segundo ela pensou que talvez ir embora não fosse tão ruim assim.

Tentando segurar as lágrimas que queimavam seus olhos, Safira entra no carro dando as costas para seu passado.

A filha do Presidente
Por: Cremosinha007
Ano: 2019
Todos os direitos.

A Filha Do PresidenteWhere stories live. Discover now