Intimidade.

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Dois dias. Foram dois dias sem notícias de Derian desde que ele havia me feito concordar com a ideia perturbadora do falso relacionamento, e quando o desgraçado resolveu me dar o ar da graça, com uma mensagem curta e objetiva, ele disse:
“Hanna, meu pai e nós dois, iremos sair para jantar hoje, buscamos vocês às sete”
Alguém deveria ensinar para o garoto que dar ordens e se comunicar com alguém eram duas coisas bem diferentes.
— Filha, use os sapatos que eu te trouxe da Alemanha — mamãe parecia eufórica indo de um lado para o outro enquanto amarrava as tiras dos seus saltos. Eufórica até demais para quem apenas ia jantar com o genro. Suposto genro.
Ela havia me obrigado a vestir um vestido que eu tinha feito questão de colocá-lo no final do closet, e quando voltasse do jantar era para lá que o vestido voltaria. Ele era branco e colado, ia até um pouco acima dos joelhos e tinha um decote em V no busto bem suntuoso, o qual me impossibilitava de usar um sutiã, mas o tecido era espesso o bastante para que nada ficasse a mostra ou que meus mamilos acenassem, o mesmo era sustentado por duas alças finas que iam até pouco acima da minha lombar, deixando as costas nuas. Me sentia despida por completo.
— Mãe, aqueles são enormes, esse aqui está lindo e bem simples para compensar esse vestido escandaloso — o Valentino tinha uns sete centímetros, era mude, cheio de detalhes delicados e era bem mais confortável do que o sapato que ela havia me presenteado.
— Tudo bem, você está linda assim, mas não quer mesmo prender o cabelo? — insistiu pela quarta vez. Como meu cabelo era comprido e cheio, cobria boa parte das costas e fazia com que eu me sentisse menos desconfortável.
— Estou bem assim — permaneci firme, ainda que desconfiada. Mamãe usava um de seus vestidos favoritos, ele era de um vermelho sangue arrebatador e ia até seus pés em um caimento gracioso, com uma bela e discreta fenda que começava no joelho e seguia o comprimento.
— Certo, irei pegar minha bolsa — entrou no corredor atrás da escada.
A campainha tocou logo que mamãe sumiu e já tínhamos dispensado Francesca, afinal íamos jantar fora, então me encaminhei para a porta.
Derian arregaçava as mangas de sua camisa preta, que combinava com a calça de mesma cor, quando abri a porta e o cheiro forte de perfume e sabonete me inundaram, seu cabelo ainda estava úmido e penteado para trás destacando sua mandíbula e traços marcantes do rosto. Não pude deixar de notar os dois botões abertos perto da gola expondo um pouco do peito. Ele estava lindo.
Derian levantou os olhos para mim, e sem dizer nada, me encarou por segundos demais.
— Uau — deixou escapar. — Quer dizer, uau, isso é bem diferente do que costuma usar — se antecipou em dizer. Não esperava elogios de qualquer forma.
— Entra aí, minha mãe foi pegar a bolsa dela — dando as costas, dei espaço para ele indo até o sofá pegar a minha bolsinha também.
— Holly. Acho que esqueceu metade do seu vestido — disse com seriedade. Tentei não rir, porque era exatamente como eu me sentia.
— Acredite, fui obrigada usá-lo para que você visse meus atributos — o desgosto era explicito na minha voz.
— Bem, conseguiu — me virei pegando o olhar de Derian sobre mim — Por que não bota um casaco? — sugeriu.
— Está frio lá fora? — indaguei confusa. Até onde me lembrava o dia tinha sido bem quente.
— Apenas tem pele demais e tecido de menos —gesticulou nervosamente. — Todos vão ficar encarando você — murmurou.
Derian parecia estranhamente desconcertado e eu estava adorando. Joguei meu cabelo para o lado, penteando-o com os dedos sobre meu decote. Me virei de lado.
— Ah, nem é para tanto, no fim das contas é só um vestido afinal — soei o mais inocente possível. Os olhos de Derian analisaram cada curva do meu corpo antes de voltar para os meus olhos.
— Não, é um terço de um vestido. E você está me provocando — declarou parecendo irritado.
— Parece estar funcionando — Derian cortou o espaço entre nós.
— Para sua sorte, mesmo estando linda, continua sendo uma vaca irritante — sussurrou. Rolei os olhos.
— Você já me chamou de coisa pior. Esta desaprendendo como me ofender, ou simplesmente não consegue mais? — ergui o queixo enfrentando-o. Sua mão se posicionou na curva da minha mandíbula segurando meu rosto. Derian se curvou.
— Se erguendo desse jeito, faz com que eu enxergue tudo daqui de cima — disse próximo a minha orelha. Imediatamente encarei o decote e me cobri com os braços.
— Pervertido de merda — bufei. Ele riu.
— Você que começou.
Os barulhos de saltos contra o piso indicavam que mamãe se aproximava.
— Veja só se não é a sogra mais linda que um genro poderia ter — se galanteou para minha mãe. Hanna sorriu timidamente para Derian. — Está belíssima, senhora Horn.
— Hanna, só Hanna. Também está bastante atraente, vejo que minha filha tem muito bom gosto.
As formalidades continuaram por alguns minutos até que ambos resolveram que tínhamos que ir, até porque o pai de Derian estava esperando no carro.
— Olá, senhor Stuart — o cumprimentei do banco de trás.
O homem tinha os mesmos traços e cabelo negro de seu filho, com alguns fios grisalhos e rugas, e uma armação de óculos com lentes grossas.
— Esta encantadora, Holly — encarou minha mãe sentada ao seu lado. — E Hanna, sempre surpreendente — o tom de flerte na voz do pai de Derian fez meu queixo cair. Derian me deu uma cotovelada.
— Tente fingir não estar tão em choque — pediu. — Mas acho que meu pai tem alguma queda pela sua mãe.
— Puta merda.
Sentado ao meu lado, Derian se aproximou ainda mais para que não ouvissem nossa conversa no trajeto até o restaurante.
— Ele trocou de roupa três vezes antes de buscarmos vocês.
— Derian, minha mãe nunca daria uma chance a ele. Ela tem aversão a homens — herança de um marido babaca que também não se redimiu como pai.
— Tem certeza? Eles passaram horas no telefone ontem a noite — jogou a notícia como se fosse nada. Dei uma cotovelada discreta em suas costelas.
— Você não me avisa nada por dois dias e agora me diz que nossos pais podem acabar desenvolvendo um possível romance? — respirei fundo.
— Estava ocupado — se limitou a dizer.
— Com o seu harém de mulheres — pelo retrovisor vi que nossos pais vez ou outra espiavam como estávamos no banco de trás. Derian também parecia ter visto pois agarrou minha mão.
— Bom, tente se imaginar sendo alguém como eu e dispensar todas as mulheres com quem estava prestes a me envolver e anunciar para todas elas que estava indisponível — ele levou a mão até o bolso da calça e me estendeu seu celular. Nove chamadas perdidas de números diferentes — E elas continuam me procurando. Temos que expor isso de uma vez ou elas não me deixaram em paz.
— Até parece que isso realmente o incomoda.
— Tem razão, já me acostumei com a maldição de ser perfeito.
— Derian, cala a boca — levei minha outra mão a testa olhando a paisagem pela janela do carro. — Interagir com você me dá dor de cabeça.
— É recíproco.
*****
Havia algum tipo piada subentendida nos jantares românticos e como eles sempre acabavam em culinária japonesa.
— O que vai querer, Holly? — Joseph, o pai de Derian, perguntou. Sentado à minha frente ao lado da minha mãe, ele parecia um bom homem.
— Bem, eu...— como explicar para o suposto sogro que abomina até mesmo o cheiro das coisas cruas?
— Alguém pode servir alguma massa, como macarronada? Ela não gosta desse tipo de comida — olhei para Derian abismada. Poderia facilmente ir jogando dentro da minha bolsa sempre que Joseph olhasse para outra direção.
— Sinto muito, sua mãe comentou que era a comida favorita dela, apenas supus que você também gostasse — se desculpou. Ele sabia até do que ela gostava. Isso estava cada vez pior. Já podia imaginar Derian passeando pela minha casa e obrigando Fran a lhe fazer biscoitos.
— Está tudo bem, só não me dou muito com o estilo da comida.
Derian prendeu a risada ao meu lado.
— Se não se dar bem é preferir morrer do que colocar a comida na boca...— murmurou. Pisei em seu sapato com meu salto. — Filha da...
— Já que estamos todos aqui, porque o casal não nos conta como foi o primeiro beijo? — Mamãe soou animada. — Se conhecem a tanto tempo, não consigo imaginar como passaram a se ver de maneira romântica.
Dei uma risadinha forçada encarando meu suposto namorado tentando não aparentar desespero. Derian apertou meu joelho e sibilou com a boca para que eu me acalmasse.
— Ah, bem, quando dois adolescentes ficam sozinhos meio que as coisas simplesmente mudam. Acho que foi assim — tomou a frente.
Minha mãe não se contentaria com isso.
— Parece uma resposta muito simples para um jovem e recente casal. Me diga algo mais romântico.
Derian coçou a nuca e encarou minha mãe bem nos olhos.
— Sua filha é linda, na verdade, ela é a garota mais linda que eu já conheci, foi apenas uma questão de admitir isso para mim mesmo. E então tudo começou a acontecer. — era uma resposta bonita e bem elaborada. Além de super brega.
— Podia ter elogiado a minha inteligência ou a minha risada — cochichei para ele.
— Até mesmo as mentiras tem limites, Holly. Todos sabemos que sua risada está longe de fazer alguém cair de amores — me olhou como se eu fosse louca.
— Então você me acha mesmo atraente ao ponto de fazer alguém se apaixonar? — levantei a sobrancelha para ele.
— Você é bonitinha — sua expressão ao confessar me achar atraente era quase como se eu o estivesse torturando. — Mas isso não quer dizer nada.
— Não disse que significava alguma coisa. Você quem está ficando nervoso atoa — sorri para irritá-lo. — Não vou julgá-lo por se sentir atraído por mim.
Ele continuou a se conter enquanto seu pai fazia o pedido. O atendimento era eficiente e antes mesmo de terminarmos a primeira garrafa de vinho, nossos pratos foram servidos. Recebi uma maravilhosa macarronada com queijo derretido e almôndegas enormes, além de batatas fritas.
— O que é isso, rejeita a especialidade do chef e ganha batatas — Derian falou surpreso metendo a mão no meu prato.
— O que pensa que está fazendo? — fiz careta para ele. Não se tocava no alimento de uma mulher. Por puro deboche, ele o fez de novo e ganhou um tapa na mão. — Não me provoque.
— Por Deus, são só batatas, eu peço mais para você — disse em meio as risadas. Apostava que ele nem as queria tanto assim.
— Formam mesmo um belo casal — Joseph comentou quando agarrei o braço de Derian para afastá-lo do meu prato. Meu primeiro impulso era dizer que o pobre homem estava louco. Mas o que eu fiz foi sorrir e acenar. Um absurdo maior do que nós dois como casal era as pessoas acreditarem nisso.
Derian passou o braço pelos meus ombros.
— Diria que fomos feitos um para o outro — me apertou contra si. Como ninguém captava o sarcasmo na sua voz?
— Porque não tiramos uma foto deles? — como sempre, minha mãe surgindo com tópicos invasivos. — Vocês poderiam dar um beijo? — tirou o celular da bolsa.
Meu corpo gelou. Derian também havia ficado tenso ao meu lado.
— Mãe! Isso é meio constrangedor.
— Que besteira, namorados se beijam o tempo todo, o que custa fazer isso para uma foto. Estou errada, Joseph? — sentia ainda uma espécie de dúvida pairando sobre minha mãe. Ela não acreditava naquela situação ou não confiava em Derian.
Engoli em seco agarrando a gola da camisa social dele o puxando. Derian não protestou quando o beijei suavemente, e mesmo que o beijo não tenha demorado tanto quanto os anteriores, fiquei um pouco zonza ao me afastar.
— A foto ficou linda — Hanna vibrou.
— Deixe-me ver — Derian pediu. Mamãe passou o celular para ele e ambos vimos a foto. — Droga, parecemos mesmo um casal de verdade — falou baixinho.
Na foto, Derian estava de olhos abertos, encarando minha boca enquanto eu o beijava, como se me apreciasse.
Afastei o olho do celular tentando não pensar nisso, no beijo ou no que merda estávamos fazendo. Ivy estava certa. Realmente tinha que tomar cuidado.

Eu te Desafio ( Disponível Na Amazon)Where stories live. Discover now